TECENDOA
INTERDISCIPLINARIDADE
NOCAMPOCTS
WilsonJoséAlvesPedroWandaAparecidaMachadoHoffmann
ValdemirMiotello
[Organizadores]
TECENDOA
INTERDISCIPLINARIDADE
NOCAMPOCTS
Copyright©dosautoresTodos os direitos garantidos.Qualquer parte desta obra pode ser reproduzida,transmitidaouarquivadadesdequelevadosemcontaosdireitosdosautores.Wilson JoséAlvesPedro;WandaAparecidaMachadoHoffmann;ValdemirMiotello[Organizadores]
Tecendo a interdisciplinaridade no campoCTS. SãoCarlos:Pedro&JoãoEditores,2012.270p.ISBN978‐85‐7993‐???‐?
1. Estudos de CTS. 2. Pesquisas deMestrado. 3. Interdisciplinaridade. I.Título.
CDD–410
Capa:MarcosAntonioBessa‐OliveiraEditores:PedroAmarodeMouraBrito&JoãoRodrigodeMouraBritoConselhoCientíficodaPedro&JoãoEditores:
Augusto Ponzio (Bari/Itália); João Wanderley Geraldi(Unicamp/Brasil);RobertoLeiserBaronas(UFSCar/Brasil);NairF.Gurgel do Amaral (UNIR/Brasil); Maria Isabel de Moura(UFSCar/Brasil);DominiqueMaingueneau(UniversidadedeParisXII/França);MariadaPiedadeResendedaCosta(UFSCar/Brasil).
Pedro&JoãoEditoresRuaTadãoKamikado,296
www.pedroejoaoeditores.com.br13568‐878‐SãoCarlos–SP
2012
SUMÁRIO
AProblemáticaAmbientalredefinindooEstatutodeVerdadeCientífica
AllanRogérioVeltroneThalesHaddadNovaesdeAndrade
EnsaiosobrearesponsabilidadeativanocampodaCiência,daTecnologiaedaSociedade
AllanTadeuPuglieseValdemirMiotello
DireitoAutoraletecnologia:apontamentosdenovoscaminhosparaacirculaçãoeacessoaoconhecimento
AlyssaCeciliaBaracatCamilaCarneiroDiasRigolin
Análisebibliométricadaatividadecientíficaemcitricultura:alaranjanoBrasil
CláudiaDanieledeSouzaLeandroInnocentiniLopesdeFaria
Indicadoresdeinovação:análisedametodologiaadotadanaspesquisas
DeniseRodriguesVichiattoRobertoFerrariJunior(Orientador)
Ciência,TecnologiaeSociedadeempretoembranco:Perspectivasdatecnologianosmangás
FelipeMussarelliValdemirMiotello
Umarevisãohistórico‐conceitualsobreaTecnologiaSocialGabrielaG.Mezzacappa
Blogscomoespaçodiscursivo:paraalémdaperspectivatecnológica
GustavoGrandiniBastosLucíliaMariaSousaRomão
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OplanejamentosustentáveldoturismoesuainterfacecomocampoCTS
HeltonGonçalvesReflexõessobreaimportânciadoconhecimentotradicional
paraaciênciaeodesenvolvimentodasociedadeLíviaCoelhodeMello
CamilaCarneiroDiasRigolinAlfabetizaçãocientíficaeaparticipaçãopública
naspolíticasdesaúdeLuizHenriqueChenchi
MariaLúciaTeixeiraMachadoOprocessodeindexaçãocomotécnicadecontrolesocial
MarcoDonizetePaulinodaSilvaACiênciaCívicaeasMudançasClimáticas:
construindoumdiálogoMariaLuísaNozawaRibeiro
ThalesHaddadNovaesdeAndradeLogísticahumanitária:
conhecimentosetécnicasaserviçodacomunidadeMarthaReginaBortolatoCardoso
WandaAparecidaMachadoHoffmannConsideraçõessobredivulgaçãocientífica
paracriançaseadolescentesRaquelJulianaPradoLeitedeSousa
Ostesaurosmultilínguespelasperspectivasdaciência,tecnologiaesociedade:possibilidadesdeconstruçãoeuso
RicardoBiscalchinVeraReginaCasariBoccato
UmpoucosobreofundodocumentaldosociólogobrasileiroFlorestanFernandes
VeraLuciaCósciaLuziaSigoliFernandesCosta
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APRESENTAÇÃO
Cadavezmaisainterdisciplinaridadevemseconsolidandoe
ocupando os debates e discussões no campo acadêmico epolítico.Em2007,aUniversidadeFederaldeSãoCarloscriouoPPGCTS – Programa de Pós‐Graduação Ciência, Tecnologia eSociedade visando a formação de recursos humanos para apesquisa,docência e atuaçãoprofissional emdiversas áreasdoconhecimento. Uma proposta inovadora de um grupo dedocentesdaUniversidade,dediversosdepartamentoseCentros,bem como de outras instituições parceira de ensino superior;com diferentes formações e que defendem ainterdisciplinaridade“comoumaredequesetececoletivamente”apartirdodiálogoentreasciênciashumanasesociais,asexatase tecnológicas,as ciênciasbiológicaseda saúdeea lingüística,letraseartes.
OrganizadoemtrêsLinhasdePesquisas,interdependentesecomplementares –Dimensões Sociais daCiência e Tecnologia,Gestão Tecnológica e Sociedade Sustentável; Linguagens,Comunicação eCiência, a cada ano, no contexto da disciplinaCiência, Tecnologia e Sociedade, um grupo de docentes doPrograma tem trabalhado no sentido de “contribuir com aformação básica do estudante de pós‐graduação através daapresentação e discussão de temas relacionados à perspectivaCTS”, tendo como ponto de partida as diferentes visões e
análisespropiciadaspelastrêsLinhasdePesquisadoProgramaeconsequentementeasinteraçõeseinterfaces.
Essa nova visão e maturidade expressadas pela pesquisamultidisciplinarsãoimportantesparaconsolidarearticularumasabedorianacionalsobreaspossibilidades futurasemCiênciaeTecnologia,paracolocá‐lasàdisposiçãodasociedade.
Um exercíciodialógico e reflexivo, que tem transcendido asaladeaulaepropiciadoaosdocentes,discentesecomunidadeacadêmica algumas produções de caráter introdutório aocomplexocampoCTS.
Assim, mantém‐se aceso o debate sobre as políticasadequadas para sustentar o avanço da ciência e osdesenvolvimentos tecnológicos e, continuar a estimular aapropriação do conhecimento gerado nesse processo pelasociedadebrasileira.Ofatodehaverum lugarparaessedebatena pauta acadêmica e principalmente esse debate vem sealastrandonosmeiosdecomunicaçãodemonstramsinaisdequemaissegmentosdasociedadeestãoganhandoconsciênciadequea produção e a difusão do conhecimento representam umacionador para o desenvolvimento social e sustentável. Épossívelencontrarexemploscomoessenoexamedaexperiênciainternacional,masaparticipaçãoeaconstruçãodasconquistasnos estudos multidisciplinares por pesquisadores nacionaisdestacamorastrodaqualidadedessaspesquisasnaproduçãodeconhecimentoenaformaçãodepessoascapazesdecriá‐loeusá‐lo se tornando essencial à movimentação da fronteira doconhecimento.
No ano de 2011, três docentes do PPGCTS, com visões,trajetóriaseproduçõesacadêmicasbastantedistintasselançarammaisumavezaodesafiodeoportunizaraogrupodediscentesingressantesainserçãoaocampoCTS.
Através de leituras, discussões, palestras e estratégiasinovadoras de ensino e aprendizagem, os trabalhos foram
realizados,objetivandotambéminstigaremobilizarosdiscentes,com seus respectivos orientadores na produção de textosacadêmicos que retratassem este movimento coletivo. Adisciplina tornou‐se um observatório importantíssimo dasproposiçõesdestegrupode ingressanteno campoCTS quenospermitiu a presente sistematização e disponibilizamos nestemomentoàcomunidadeacadêmicaparaleituraediálogosobreosdesafios e a importânciada construçãoda interdisciplinaridade,emparticularnoâmbitodosestudosCTS.
A prospecção, a eleição de certos focos sem prejuízo dapesquisamotivadapelacuriosidadedoaluno,ofuturocientista,reconhecidamentetão importante,buscaaanáliseconstantedasoportunidadesedosdesafiosaserematacadosnacompreensãodas complexidades impostas pelo futuro incerto e asresponsabilidadesdeproverestudosparaminimizarousuperarosdesafios.
Adiversidadedetemaségrande:aproblemáticaambiental,a responsabilidade ativa, o direito autoral e a tecnologia,citricultura, indicadoresde inovação,mangás, tecnologiasocial,blogs,turismo,conhecimentotradicional,alfabetizaçãocientífica,políticas de saúde, controle social, mudanças climáticas,logística, divulgação científica, tesauros multilíngües, fundodocumental, dentro outros temas que chamarão a atenção doleitor, pois retratam algumas das diversas possibilidades deestudosepesquisasrealizadasnoPPGCTS.
A junçãodeatividadesacadêmicas, tecnológicas,culturaisede mercado resulta de um processo de amadurecimento dasconexõesentreasáreasdeconhecimento,destacandoaatuaçãohumanaatravésdasuacriatividade,surgindocomoumrecursorenovável na sociedade. Sendo multiplicada através dosprocessosdemudançasqueasociedadevemsofrendo,aolongoda sua história, na busca de conciliar seus desejos presentes efuturos.
Este livro é para nós “obra aberta” em um campo emconstrução, donde se justifica o tema escolhido pelosorganizadores para o presente trabalho: TECENDO AINTERDISCIPLINARIEDADE NO CAMPO CTSRecomendamosa todosboa leituraeconvidamosumavezmaisaodiálogointerdisciplinar.
WilsonJoséAlvesPedroWandaAparecidaMachadoHoffmann
ValdemirMiotello
ProfessoresdaUFSCar,tambémnoProgramaCTSMaiode2012
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AProblemáticaAmbientalredefinindooEstatutodeVerdadeCientífica
AllanRogérioVeltrone
ThalesHaddadNovaesdeAndrade
Introdução
Nas ultimas décadas as questões ambientais superaram aetapadereivindicaçõesdedeterminadosgrupos,epassaramaseconfigurar como um projetode sociedade, entremeando‐se emdiversos setores e abordagens. Isso devido a mudançasparadigmáticas ocorridas nos debates em torno da questão, apartirdadécadade1980,comoreconhecimentodanecessidadede se incorporar as demandas sociais (INOUE, 2006).Mesmoantes desse período, na verdade, pois desde aConferência deEstocolmo (1972), estabeleceu‐se um quase consenso de que avariável ambiental não poderia ser pensada em separado davariável social, e mesmo o desenvolvimento econômico nãopoderia ser pensado demaneira independente da preservaçãoambiental.(KECKeSIKKINK,1998:p.125,apudINOUE,2006).
Odiscursocontestadorvementãocedendoespaçoparaumdiscurso de colaboraçãomultidisciplinar e esforçosmúltiplos,com o envolvimento de setores sociais heterogêneos, dado oreconhecimento da universalidade da questão ambiental(FERREIRA,1999).
Opresenteartigopretendeanalisarasvariáveisculturaisdosatoresemjogo,argumentandoqueaciênciaéuminstrumentodeconstrução de conhecimento da natureza. Sendo assim, estáinserida em uma determinada cultura, que é socialmenteconstruída. A aplicação dos conceitos abstratos científicos(LATOUR,2000;2001),resultanatécnica,aqual,porsuavez,vem
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sendoquestionadaquantoosseus limiteseasuacapacidadedepromover bem estar social (VELHO, 2009), por parte do quedenominaremosnesteartigodepensamentoambientalista.
Existemdiversascorrentesemovimentossociaisquepodemserdesignadaspor ambientalistas.O tipo ideal (WEBER, 1985)dopensamentoambientalistacomoqualtrabalharemosaquiseconstróipeloconceitodeculturacriticaamodernidade,naqualopensamentocientíficoseinsere(FERREIRA,1999).
Procuraremos relativizar o conceito de verdade cientificademonstrandosuasorigenshistóricasemrelaçãoàconcepçãodenatureza,efaremosumadesconstruçãocriticadeseusmétodos,demodoailustrarcomoaciênciaéumaconstrução.
Argumentaremos também que decisões embasadas empareceres técnicos freqüentemente atendem a interesses degrupos específicos, e,mesmo em situações onde se busca umacordo, como na proteção do patrimônio intelectual decomunidades tradicionais, os acordos operam dentro dagramáticadeumadeterminadacultura.
Ciênciacomovisãodemundo
Faremos agora, uma desconstrução critica da ciência
moderna.Paraestefim,faremosumbreveesboçodahistoriadopensamento ocidental em relação à natureza, e uma críticaantropológicadasociedademoderna.
KeithThomas(1996)tratadasatitudesdoshomensparacomosanimaiseanaturezaduranteosséculosXVI,XVIIeXVIII.Oautorexpõeospressupostosque fundamentaramaspercepçõesdosinglesesnoiníciodaépocamodernafrenteànatureza.
Osanimaiseramclassificadospeloszoólogos,noiníciodesseperíodo, conforme suaestruturaanatômicae seushábitos. Noentanto,eramtambémclassificadosdeacordocomsuautilidadeparaohomem.Aexistênciadeuma linhadivisórianítidaentre
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homenseanimaisserviriadejustificativaparaqueoshomensosutilizassem conforme lhes convinha. Essa divisão teveconseqüências importantes,e legitimavaosmaus‐tratosàqueleshomens que viviam em uma condição tida como animal(“selvagens”, negros, pobres, mulheres, etc.). Os intelectuais,poetas e pensadores contribuíram para que os animais fossemincluídos dentro da doutrina da piedade cristã, e, no final doséculoXVIII,essaspreocupaçõeseramevidentesentreasclassesmédiasinglesas(THOMAS,1996).
No inicio do período moderno, os cientistas naturaispropuseramclassificações taxonômicasmenosantropocêntricas,oquecontribuiuparaumamudançadeatitudeem relaçãoaosanimais.O saber científico, entretanto, fora separado do saberpopular(THOMAS,1996).
Turner(1990)defendea idéiadequeaexpansãoeuropéiaéantesdetudouma“aventuradoespírito”.Masumespíritoquepossui um corpo, que necessita interagir com a natureza.Necessidadespsíquicasmoldando anatureza, tanto econômicaquantosimbolicamente.
Emtodasasculturas,osmitosteriamafunçãopedagógicadeconectar o individuo com o mundo onde vive (CAMPBELL,1992).AcolhidaporRomaemumperíododecriseepessimismo,a seita do cristianismo teria sido apropriada e moldada peloEstado.(TURNER,1990).Ocristianismopassaentãoaassumirumcaráterhistóricoemoposiçãoaotempocíclicodomito.Tornou‐se,no contexto,uma religiãodenegaçãodanatureza,uma vez quepropunha a repressão dos instintos, o desprezo pelo corpo emdetrimento da alma e uma concepção de vida terrenairremediavelmente imperfeita e insatisfatória. A Igreja tambémhavia delegado a construção do conhecimento somente ao clero(especialistas),demonizando apossibilidadede revelaçãomísticaaosfiéis,característicadediversasoutrascosmologias,inclusivedocristianismonostemposiniciaisdepequenaseita(TURNER,1990).
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Tal mitologia geraria uma sociedade constantementeinsatisfeita (FREUD, 1996), sendo lançados os alicerces para aconstruçãodeumaHistoriaquesebaseiananoçãodeprogressotecnológico cumulativo, pela via de transformação da natureza.(TURNER,1990).Embora todososmitossejamuma tentativadeconfortodiantedodesconhecido,e,portantocontroledanatureza(materialesimbólico),noocidenteteriaocorridoumahipertrofiadesseimpulso(MUNFORD,1963apudTURNER,1990).
ApartirdaíoocidenteselançaentãoparaaAmérica,ÁsiaeÁfrica.Eomesmo impulsodesujeiçãodanaturezaencontrariaaquiumnovovigor,umavezqueosnativoseramvistoscomoselvagens1,portanto,maispróximosdanatureza.
Weber, ao longo de suas obras, nos fala da noção dedesencantamentodomundo,ummovimentodesecularizaçãodaontologiaocidentalpromovidopelaciênciaepelocristianismo,na sua faceta protestante (WEBER, 1985). No entanto, será aontologiaocidentaldefatoobjetivaemrelaçãoànatureza?
Poder‐se‐ia objetar que o expansionismo europeu foimotivadoporcausaspuramenteeconômicas,enãoculturais.Noentanto,nãosepodedizerqueouroepratasejamnecessidadespuramenteeconômicas.(TURNER,1990)
Sahlins (2003) discorre sobre o totemismo2 na sociedadecapitalista. O autor procura mostrar como a valorização dedeterminadas carnes e cortes não segue somente critérios de
1Apercepçãodeindígenascomomaispróximosdanaturezaaindapermanece,emboraessacaracterísticatenhaadotadoumaconotaçãopositiva(GORDON,2000).No entanto, ainda é uma representação simplificadora, pois, comodemonstra a etnologia, as concepções ameríndias de natureza podem serbastante complexas, não operando em uma interface direta entrenecessidadesorgânicasemeioambiente.(BRIGHTMAN,1993;CADOGAN,1959;DESCOLA,1987;VIVEIROSDECASTRO,2002)
2 Trata‐se de organizar a vida social fazendo‐se analogias com a natureza.Sahlins procura demonstrar que o totemismo também está presente emsociedadescomplexas,comoacapitalista.
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ordem econômica. Haveria uma escala de humanização dosanimais, onde os mais próximos, com os quais se desenvolverelaçõesafetivas(comocãesegatos),nãopoderiamsercomidos.Omesmovaleriaparaosselvagens,quesãoosmaisdistantesdohomem.Oconsumodestesanimaistambémnãoseriavalorizado.Restam os animais intermediários, como os bois, estes simpodendo ser consumidos. Entretanto, ocorreria umadesvalorizaçãodecertaspartesmesmonessesanimais:partesquelembramórgãoshumanos,comorinsefígado.Tomandodeumaanálise da linguagem para a compreensão do problema, Leach(1983) afirma que a nomeação e a classificação da naturezaobedecemaumanecessidadedopensamentodeorganizaçãodocaos.Ostabusseriamassubstânciasinomináveis,inclassificáveis,ou,emsuasprópriaspalavras,seriam“nãocoisas”.
Leach (1983) também observa, como posteriormente fazDescola (1998), que se confere um tratomais “humano” comanimaisquesãoconsideradosnossospróximos.
Mas o pensamento científico, também é uma cultura, umalinguagem.Aexemplodosmitos,aciênciatambémvisaordenaromundo.Seumecanismodeinteligibilidadeeoperacionalizaçãoconsisteemdesconstruirosobjetos(anatureza)etransformá‐losem conceitos abstratos, se tornando operacionalizáveis apartirdaí(LEVI‐STRAUSS,2009).
Atravésdeuma sériede rupturas e etapasdemediação, oobjeto vai sendo transformado em uma inscrição literária(LATOUR,2000;2001).
Latour (2000; 2001) cita como exemplo um caso onde umgrupodecientistassereúneparadecidirseemumdeterminadolocal com características hibridas dos biomas cerrado eAmazônia,ocerradoestariainvadindoaflorestaouocontrario.
Inicialmente, tiram fotos aéreas, e confeccionam ummapa.Dividem então a floresta em quadrantes segundo coordenadas
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cartesianas (conceito abstrato), quadrantes estes que serãoreferidosnomapa.
Emcadaumdosquadrantes,sãoretiradasamostrasdosolo.Os torrões do solo, por sua vez, são peneirados, de modo aficarem livres de insetos, pedras, folhas etc., situação esta quenãopodeserencontradanoobjetoempírico.Umavezlimpos,ostorrõesdesolosãoclassificadosenomeadosdeacordocomumaescalacromática.
Enfim, chega‐seaumveredicto:a florestaestá invadindoocerrado.Tal conclusão, é claro,nãopossui legitimidade senãofor transformadaemum relatóriodepesquisa.Enfim,oobjeto,reduzido a sua essência ‐conforme a visão cientifica‐ pode sertransformadoemuma inscrição literária–abstração‐ (LATOUR,2000; 2001; LORENZI, 2010). E a partir daí, decisões políticaspossivelmenteserãotomadas.
Processoscomoeste,sendorepetidos,dãoorigemateorias.Eassim se elabora a linguagem cientifica. Por construção, mastambémporconvenção.Qualquerumquedesejeconheceresteobjeto chegará a mesma conclusão.Mas desde que refaça ospassos dos cientistas.Mesmo longe dos seus laboratórios, oscientistas transformamoobjetoem laboratório (LATOUR,2000;2001). Só assim podem interagir com a natureza empírica,atravésdalinguagemedacultura.Nãosetrata,portantodeumconhecimentodiretoeobjetivodoobjeto.
QuestõesambientaiseasDimensõespolíticasdaciência
Os pareceres técnicos em relação a questões sócio‐políticas
emitidos por especialistas assumem legitimidade devido aopressuposto de que foram realizados de acordo com osprocedimentosdeneutralidadecientífica.Parecerescompetentesisentos de interesses, que pretendem solucionar conflitos(LATOUR,2004;VELHO,2010)
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Leite (2007) e Santos (2007), ao discorrer sobre anormatizaçãodousoedaspesquisasem tornodosorganismosgeneticamente modificados ilustram um desacordo entrecientistaseambientalistasquando falamdedefesadeposições.Os atores que adotam uma postura anti‐transgênicos sãorepresentados por membros do Greenpeace, procuradores darepública e representantesdoMinistériodoMeioAmbiente.Oêxito em barrar a liberação dos plantios de transgênicos éatingido através da manipulação da opinião pública, comprevisões apocalípticas e mal fundamentadas e expondo osintestinos da CTNBio. (Comissão Técnica Nacional deBiossegurança)
A CTNBio adota uma postura de pesquisadescontextualizada, que assume que a técnica independe dequestõeshistóricas,sociaiseambientais.Atítulodeexemplodecomo essaposiçãopode serproblemática,Leiteafirmaque emum manual da CTNBio destinado a agricultores que iriamrealizarumplantiodesojatransgênica,erarecomendadoqueasmáquinas utilizadas na colheita deveriam passar por umprocedimentodedescontaminaçãoantesdeseremutilizadasnomanuseio de soja não‐transgênica. Um procedimentotecnicamenteeficaz.Noentanto,nãoexistenenhummecanismoparaque a instituição se certifiquedeque o agricultorde fatofaráisso.(LEITE,2007)
Aqueles atores que defendem a liberação dos transgênicosignorariam esse tipo de questão. Lutam para que o processodecisório seja encabeçado unicamente por técnicos eespecialistas, que não levarão em conta as variáveis sócio‐ambientais.(LEITE,2007).Santos(2007)afirmaaindaquenãosóaos tecnólogos interessa que as coisas se dêem destamaneira,mas também as transnacionais. E, além disso, os tecnólogosestariam recebendo financiamento de setores ligados ao
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agronegócio, que não tem interesse em adiar a implantaçãodestasnovastecnologiasparaquenovaspesquisassejamfeitas.
Oqueasduasposições fundamentalistas têmemcomum,équeutilizammétodosquenãoincentivamapesquisa.Ossetoresambientalistas, também não admitem um diálogo e umadiscussão acerca dos instrumentos regulatórios.No entanto, aopinião pública espera que comunidade científica seja areguladoradessetipodequestão.(LEITE,2007).
VandanaShiva (2001),discorrendosobreosmecanismosdeproteçãodopatrimôniointelectualdecomunidadestradicionais,afirma que tratados como o Acordo Geral sobre Tarifas eComercio(quelegislasobreosreferidosdireitosdepropriedadeintelectual) substituem as antigas bulas papais quedavam aoseuropeusodireitodegerirasterraseosnativosconquistados.Ocritério de validação do conhecimento pela comunidadecientifica é a impessoalidade, o que não ocorre com ascomunidades tradicionais. Sendo assim, o conhecimentotradicional só teria validade quando fosse despersonalizado.(ALMEIDA,2008).Noentanto,aautoraafirmaqueoscientistasnão tiram suas premissas de simples observação, masdirecionam suaspesquisasdemodo a atenderos interessesdedeterminadas comunidades epistêmicas. Sendo assim, oconhecimento tradicional teria a mesma validade, segundo aautora. E, além disso, as patentes cessariam os mecanismoscriativos das populações, e substituiria o valor intrínseco doconhecimentoporseuvalorinstrumental.(SHIVA,2001)
Omesmo afirma Boaventura Santos, que concorda com aidéia de colonização do real (SHIVA, 2001) onde existiriamdiferentes realidades provenientes de diversas comunidadesepistêmicas,mascomumaseimpondosobreasdemais(INOUE,2006;SANTOS,2007).
Osmovimentos ambientalistas pretendem estenderdireitospolíticosanatureza,queestá foradapolítica,oqueaprincipio
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seriaumacontradição,umavezqueapolíticaédefinidacomosendocompostasporarranjossociais,aocontráriodanatureza,que seria concebida como sendo regulada por leis isentas desubjetividade(LATOUR,2004).
Os ambientalistas e os cientistas naturais pretendem “falarpelanatureza”.Em outraspalavras, seriam osporta‐vozesdas“coisasquefalamporsi”.Noentanto,esteprocessonãoéassimtãoobjetivo,umavezqueasconclusõescientíficaspassamantespor uma discussão, mesmo jogos de poder “no interior doslaboratórios”,comovistonoexemplodaspesquisasenvolvendoorganismosgeneticamentemodificados.MasLatourafirmaqueoambientalismo(queeledenominaecologiapolítica),estariaemumaposiçãomaisconfortáveldoqueadoscientistas,umavezquenãochegaaacreditartotalmentenosmétodosimpessoaisdaciência, mesmo na separação entre sociedade e natureza,podendo se beneficiar com uma reestruturação radical.Reestruturaçãoestaque jáestaria sendo feita,umavezqueemacordos como o Protocolo de Kyoto, participam na mesmacâmara,tantotecnólogoscomopolicymakers.(LATOUR,2004)
Conclusão
Aproblemáticaambientalaparece comoumaoportunidade
de reestruturaçãode saberes,umdos rumosquepodem tomarosestudosemCiência,TecnologiaeSociedade.
A correlação entre técnica e demandas sociais vem sendocontemplada por esse campo. No sentido de aprofundar adiscussão,oartigopretendeumostrarqueaciênciaoperadentrodeumalinguagemeumacultura,queporsuavezinteragecomoutrasculturas.
Nosso foco foi a construção de conhecimento sobre anatureza. Embora com pretensões de conhecimento real sobreesteobjeto(emoposiçãoarepresentaçãocultural),aciênciaofaz
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dentro de uma dada linguagem. O projeto de construção daciênciaseinseredentrodoprojetodamodernidade.Esteprojeto,noentanto,esbarracomoslimitesnaturaisdoplaneta.
Sendo assim, a crítica ambientalista pode conduzir a umanovaracionalidadedeproduçãodeconhecimentoeaplicaçãodatécnica.Masparaqueissoocorra,énecessárioumaciênciaauto‐consciente. Consciente de seu estatuto de linguagem deconstruçãodeconhecimento,masumalinguagementreoutras.
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WEBER,M.1985.AÉticaProtestanteeoEspíritodoCapitalismo.SãoPaulo:LivrariaPioneira.4aed.
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EnsaiosobrearesponsabilidadeativanocampodaCiência,daTecnologiaedaSociedade
AllanTadeuPugliese
ValdemirMiotello
IntroduçãoQualseriaopapeldoscientistas,dasindústrias,dogovernoe
dasociedadenodesenvolvimentodeumpaísedomundo?Enodesenvolvimento das pequenas comunidades? Com essasquestões que já estão dentro do senso comum, começamos apensar e repensar a responsabilidade ativa de alguns dessespapeisecomoocampodoCTSpodeedeveposicionar‐separaajudaraconstruirciênciavoltadaparaasociedadeeprepararasociedadeparaaciência.Vamoscomeçaresseestudocomumarápida introdução aos campos do CTS, relacionando com opensamentoBakhtiniano,quetambémpermeiatodaadiscussãosobre a responsabilidade ativa. Trazendo algumas discussõesainda sobre tecnologia, gestão, políticas públicas entre outrospensamentosdessecampotãoabrangente.
Por último levantaremos novas questões e hipóteses queficaramduranteesseestudo,quepermeiama responsabilidadeativa e os campos da Ciência, Tecnologia e Sociedade,principalmentesuasteorias.
UmpoucosobreosestudosdoCTSPara começar nossa discussão sobre o Campo CTS, vale
pensar na concepção positivista da ciência, um pensamentomuitofrequenteemdiversosespaçosacadêmicosenosmeiodedivulgação (BAZZO, 2003:120) e que ainda permeia opensamentoescolaremdiversosníveis.
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Aconcepçãoclássicadasrelaçõesentreaciênciaeatecnologiacomasociedade é uma concepção essencialista e triunfalista, que poderesumir‐se em uma simples equação “modelo linear dedesenvolvimento”:+ciência=+tecnologia=+riqueza=+bem‐estar.(BAZZO,2003:120)
Nessemodolineardepensar,parecemuitofácilatingirobem
estarsocial,deformaindividualista.Emmomentoalgumvemosnessa “equação” uma preocupação com outros países ou comoutrassociedades.Écomoseapenasospaísesousociedadesquetem dinheiro para investir em ciência, vão conseguir termaistecnologia,maisriquezasemaisbemestar;aumentandoassimadiscrepânciaeadesigualdadeentreaspessoasnomundo.
Nestavisãoclássicaaciênciasópodecontribuirparaomaisbem‐estarsocial esquecendo‐se da sociedade, para dedicar‐se a buscarexclusivamente a verdade. A ciência, então, só pode avançarperseguindo o fim que lhe é próprio, a descoberta de verdades einteresses sobre a natureza, se semantiver livreda interferênciadevaloressociaismesmoqueestessejambenéficos.Analogamente,sóépossível que a tecnologia possa atuar como cadeia transmissora namelhoria social sea suaautonomia for inteiramente respeitada, seasociedadeforpreteridaparaoatendimentodeumcritério internodeeficácia técnica.Ciência e tecnologia são apresentadas como formasautônomas da cultura, como atividades valorativamente neutras,como uma aliança heróica de conquista cognitiva e material danatureza.(BAZZO,2003:120)
Os interesses da ciência cada vez mais se distanciam dos
interesses sociais e culturais, com a premissa de que a ciênciadeve serneutra ebuscar averdade.Masqueverdade?Vamospensarumpoucosobreaspalavrasrussasparaosdoistiposdeverdade.
Na Tradução do livro Para a filosofia do ato responsável(BAKHTIN,2010)temosamarcaçãodeduaspalavrasemrusso‐PRAVDA e INSTINA‐que, emnosso idioma são representadaspelamesmapalavra:Verdade
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Aproveitando o textodoGrupode estudosdos gênerosdodiscurso, presente no livro Palavras e contra palavras II:conversando sobre os trabalhos de Bakhtin (NAGAI,MIOTELLO,2010)oqualexemplificaessarelaçãoentreaspalavras.
AInstina,umaverdadedura,imutável,universalefeitademomentosgerais,herançadoracionalismoqueconsideraoatosuperficialmente,sem contar os fatores emotivo‐volitivos ativo. Já a Pravda enunciatodososmovimentosdoatoemquestão, transformando‐oemúnico,uma verdade possível para aquelemomento, para aquela situação,para aquele outrem a partir do meu lugar único. (NAGAI,MIOTELLO,2010:57)
Naciênciapositivista,vemosumabuscapelaverdadeúnicae
universal(Instina),comoseapenasumaverdadeexistisseequeaquelepontodevista“correto”deveriaservirpara tudoeparatodos.Jánaconstruçãodeumaciênciaetecnologiavoltadaparaa sociedade, procuramos cada vez mais verdades adequadaspara cada valoração cultural, para cada pedaço de mundo(Pravda). Com essa verdade que leva em conta a sociedadepoderíamosmelhortrabalharembuscadobem‐estar.
Mas qual é esse bem estar que procuramos? Ele pode ficardelimitado apenas para nosso círculo social? Em sua fala depossecomopresidentedaAAAS(TheAmericanAssociationfortheAdvancement of Science) John P. Holdren (HOLDREN, 2009)elenca diversas atividades e problemas para conseguirmosatingirum bem‐estar social,para todosnoplaneta.Umavisãoque almeja um mundo onde todos tenham o mesmo nívelconforto e bem estar, demaneira sustentável, consumindo osrecursos do planeta de forma consciente. Apesar de parecermuitodifícilatingiresse ideal,elepareceserumbomcaminhoparapensarmosqualbemestarqueremosparaomundo.
ParaHoldren,desenvolver consisteemmelhorara condiçãodo ser humano em todos os aspectos, não só econômica,mastambémsócio‐políticoeambientalmente,eessedesenvolvimento
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sustentável significa fazê‐lo em pontos consistentes com amanutenção e melhoria indefinidamente e um bem estarsustentável é alcançar o desenvolvimento onde ele ainda nãoexiste ou transformar nos lugares que ele existe, mas éinsustentável. Para isso ele propõe cinco desafios a seremquebrados: pensar nas necessidades básicas dos pobres; umagestão de concorrência para a terra, água e biotas (biomas+ecossistemas) do planeta, a manutenção e integridade dosOceanos; dominar o dilema Energia – Economia ‐ Meioambiente; e mover‐se em direção de um mundo sem armasnucleares.(HOLDREN,2009).
Ele ainda marca as deficiências na Busca por umdesenvolvimento sustentável: A pobreza, a prevenção dedoenças,adegradaçãodoambiente,adisseminaçãodaviolência,a opressão dos direitos Humanos, o desperdício de potencialhumano,onãouso,usoineficaz,desviodousoouusoindevidointencionaldaciênciaetecnologia(comonodesenvolvimentoeimplantação de armas de destruição de massa) ou acidental(comosemanifestanosefeitoscolateraisdousodeherbicidaseantibióticos); amá distribuição de recursos e investimentos; aincompetência,má gestão e corrupção; o crescimento contínuoda população e a ignorância, apatia e negação, por falta deexposição à informação ou exposição sem convicção oucompreensão.(HOLDREN,2009).
Eleaindapropõequeaciênciaea tecnologiapodemajudar,melhorando a compreensão sobre os perigos e possibilidadessobre os avanços na tecnologia; pensando nos avanços natecnologia ajudando as necessidades humanas básicas e ocrescimentoeconômicoeaciênciaeatecnologiaoferecendobasepara ajudar os decisores públicos em suas avaliações.(HOLDREN,2009).
As idéias de Holdren nos levam a pensar em nossa realfunção como estudiosos, que além de buscar as “verdades” é
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ajudar o nossomundo a serum lugarmelhor.Talvezumdosprincipaisproblemasda ciênciaéque,durantemuito tempo (eainda hoje), ela tem um caminho comum sobre seudesenvolvimento, é primeiramente financiada para pesquisasparaaguerra.
NorastrodahistóriaéprecisomencionarqueoexemplodosEstadosUnidosseráseguidopelorestodospaísesindustrializadosocidentaisduranteaguerrafria,queseenvolveramativamentenofinanciamentodaciênciaparaaproduçãodearmamentosparaasguerrasdaCoréiaedoVietnã...Enfatizando a necessidadede financiamentopúblicodapesquisa básica, poderíamos dizer, seguindo a Steve Fuller (1999,p.177eSS.),que sematavamdoispássaros comum só tiro:porumladopromoviaaautonomiadainstituiçãocientíficafrenteaocontrolepolítico ou ao escrutínio público, deixando nasmãos dos próprioscientistasa localizaçãodosrecursosprópriosdosistemade incentivodo conhecimento e, por outro, favorecia‐se uma projeção de longoprazo de pesquisa que, segundo a experiência de guerra, haviademonstradosernecessáriaparasatisfazerasdemandasmilitaresnoâmbito da inovação tecnológica. Somente deste modo podia‐seavançar até esta fronteira sem fim, até a verdade como metainalcançável,tomandoatítulodoescritodeBush.(BAZZO,2003:122)
Assim, contrapondo a idéia deHoldren, que caminha para
ummundo sem armasnucleares, vemos que a tendência seriacadavezmais termosarmas (nuclearesounão).Apesardequemuitaspesquisasqueaprincípioeramparaguerra,edepoissevoltaramparaasociedadecomoprodutosdebensdeconsumo,vemosqueémuitomaisfácilosgovernosfinanciaremaguerradoqueobemestarhumano.
Seguindo a idéiadeHoldren, temosum exemplo citado notrabalho de DAGNINO, BRANDÃO e NOVAES, sobreMohandasKaramchandGandhi(1869—1948)eseutrabalhonaÍndia,aproveitando‐sedeumatecnologiaque jáestavaobsoleta(aformadeTearatravésdoCharkha)paramudarasociedadedecastasdaíndia,ondeadesigualdadesocialsóaumentava.
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Entre1924e1927,Gandhidedicou‐seaconstruirprogramas,visandoà popularização da fiação manual realizada em uma roca de fiarreconhecida como o primeiro equipamento tecnologicamenteapropriado,aCharkha,comoformadelutarcontraainjustiçasocialeo sistema de castas que a perpetuava na Índia. Isso despertou aconsciênciapolíticademilhõesdehabitantesdasvilasdaquelepaíssobreanecessidadedaautodeterminaçãodopovoedarenovaçãodaindústrianativahindu,oquepodeseravaliadopelasignificativafraseporelecunhada:“Produçãopelasmassas,nãoproduçãoemmassa”.(DAGNINO;BRANDÃO;NOVAES,2004:5)
Assim,podemospensar que, alémde trabalhar em grandes
avanços para a tecnologia, também cabe aos cientistas pensarcomopequenasmudançaspodemedevemmelhoraravidaemcomunidadespobres,porexemplo.
Essa perspectiva de trabalho já existe, mas ainda parece,principalmenteaquinoBrasil,algomuitodistantedarealidade.
Durante as décadas de 1970 e 1980, houve grande proliferação degrupos de pesquisadores partidários da idéia da TA nos paísesavançadose significativaproduçãodeartefatos tecnológicosbaseadosnessaperspectiva.Emboraoobjetivocentraldamaioriadessesgruposfosse minimizar a pobreza nos países do Terceiro Mundo, apreocupaçãocomasquestõesambientaisecomasfontesalternativasdeenergia,deformagenéricae,também,referidaaospaísesavançados,erarelativamentefreqüente.(DAGNINO;BRANDÃO;NOVAES,2004:7)
Cabendoassima cadaumdenós, tantoatoresdaacademia
quanto da sociedade, pensar em nossa responsabilidade nasingularidade de cada ato. Levando a discussão para nossaresponsabilidadejuntocomatecnologiaeasmudançassociais.
AresponsabilidadeativadosatoresdaCiência,daTecnologiaedaSociedadeQuandopropostoumestudogeralsobreaciência,tecnologia
e a sociedade, sempre entramos no embate que a sociedade
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precisaparticipardasdecisõesdosgestorespúblico, juntamentecomos cientistas,paraconstruiruma tecnologiaque realmentesaia da academia e atinja todos os níveis sociais, pensandotecnologias mais viáveis para resolver problemas (sociais eambientais) mais urgentes, tanto em macro sistemas (comopaíses inteiros) quando em micro sistemas (como umacomunidade pobre). Porém quando vemosmais de perto essainteração, acontece que pessoas despreparadas e quedesconhecemaciênciapodemlevaradecisõeserrôneas.
Apercepçãopúblicada ciênciaeda tecnologiaé,alémde tudo,umpouco ambígua. A proliferação de mensagens do tipo otimista oucatastrófica em torno do papel desses saberes, nas sociedadescontemporâneas, tem levadoaquemuitaspessoasnão tenhamumaidéiamuitoclaradoqueéaciênciaequalseupapelnasociedade.Aistosesomaumestilodepolíticapúblicasobreaciência incapazdemotivarumaparticipaçãoquecontribuaparaodebateabertoacercadessesassuntose,emgeral,parafavorecersuaapropriaçãoporpartedascomunidades(BAZZO,2003:13)
Mas também temos exemplos de como essa relação
transformaatecnologia.Mesmoque indiretamente,asociedadeimpõe mudanças – que no nosso sistema capitalista atualpoderíamos chamardemudançasmercadológicas ‐paranovosusos da tecnologia. Dentro do estudo do CTS existe umacorrente, a do construtivismo tecnológico, que propõe essamudança impulsionada pela sociedade. Um bom exemploseriamasmudançasqueocorreramcomabicicletaaolongodosanos.
Os fundadores do construtivismo – Bijker e Pinch – ilustram esseargumento com a história de um conhecido artefato tecnológico: abicicleta. Trata‐se de um objeto que, como tantos outros, seria hojevisualizadocomouma“caixa‐preta”.Defato,começousuaexistênciacomformas.
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Sobreomarcoanalítico‐conceitualdatecnologiasocialmuitodistintas,que iamdesdeum equipamento esportivo atéumveículode carga.Suarodadianteiramaisalta,necessárianaquele tempoparaalcançarmaiorvelocidade(aforçadetraçãoeraexercidadiretamentenarodadianteira)numabicicletausadacomoequipamentoesportivo,causavainstabilidade,numabicicletaempregadacomoveículode transporte,oudesconfortoparaasmulherescomlongosvestidos(PincheBijker,1990).Em sua forma final, observa‐se que rodas de igual tamanho foramsendopaulatinamente adotadasvisando à segurança emdetrimentodavelocidade.Nãoobstante,durantecertoperíodo,osdoisprojetosqueatendiamanecessidadesdiferentesconviveramladoalado.Essatemporáriaambigüidadedoartefatotecnológicobicicletafoichamadade “flexibilidade interpretativa”.Tal conceito aponta para o fatodeque significados radicalmente distintos de um artefato podem seridentificadospelosdiferentesgrupossociaisrelevantes,queoutorgamsentidos diversos ao objeto de cuja construção participam. Isso nãosignifica que eles não compartilhem um significado especial doartefato: aquele que é utilizado para referenciar as trajetóriasparticulares do desenvolvimento que ele percorre. (DAGNINO;BRANDÃO;NOVAES,2004:25)
Semprequepensamosnisso,entramosemumefeito“bola‐de‐
neve” onde a sociedade precisaria participarmais ativamente,porémprecisariaestarmaisbem informadaequererparticipardesseencontrociência,tecnologiaesociedade.
Masoqueéparticiparativamente?Vamosusaragoraalgunsexemplos do trabalho de Mikhail Bakhtin, em um de seusprimeiros escritos (1924) publicado no Brasil em 2010 com onome de Para uma filosofia do ato responsável. Logo no começodessaedição,AugustoPonzio,notextodeaberturajádemonstraque, responder ativamente em seu singular, sabendo sim quevivemos em uma comunidade (plural),mas sem buscar álibispara nossas decisões (ou até mesmo a falta delas) é buscarmelhorqualidadedevida.
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Trata‐setambémdeumaquestãoquetocadiretamenteavidadecadaumequeproduzumprofundoimpactosobreela,deumaquestãoemqueentraemjogoaqualidadedevida,oreconhecimentodadiferençasingulardecadaum,pelofatodequeaorganizaçãosocialmesma,amodelagem cultural mesma da vida, funciona sobre a base declassificações, de fechamentos, de atribuições de pertencimento,recorre ao gênero, ao universal como condição da identificação, dadiferenciação,daindividuação.(PONZIOinBAKHTIN,2010:17)
Bakhtin,duranteseutexto,lutacontraoqueelechamade“a
crisedoséculoXX”queseriaafaltadecomprometimentosobreosatos.Algoqueparecemuitocomumaosdiasdehoje,ondeemtodos os atos, procuramos álibis para nos ausentarmos daresponsabilidade.Amídiaémuitoboaemconstruiressesálibis.Peguequalquerfatocatastróficoquetenhaocorrido.Empoucashoras já vemos diversos profissionais especulando quedeterminado ato ocorreu por um problema social, genético ouatémesmodivino.Nuncaescutamosalguémativamenteassumira culpa e dizer, mesmo pelos fatores sociais, culturais egenéticos,eucometiumerro,eudecidiedecidiequivocadamente.
Não é o contexto da cultura que uma afirmação emotivo‐volitivaadquireseutom;tidaaculturanasuatotalidadevemintegradaaumcontexto unitário e singular da vida do qual participo. Vem sendointegrados, seja cultura no seu conjunto, seja cada pensamentosingular,cadaproduto individualdoatovivonocontextounitárioesingular do pensamento como evento real.O tom emotivo‐volitivointerrompeoisolamentoeaautossuficiênciadoconteúdopossíveldopensamento,incorpora‐oexistir‐eventounitárioesingular.Cadavalorque apresentevalidade geral se torna realmente válido somente emumcontextosingular.(BAKHTIN,2010:90)
Bakhtin ainda diz que sempre que nos abstraímos da
responsabilidade, não estamos isentos da parcela da culpa.Quandomeabstraioeudecidoquedecidampormim, logoeutambémdevoassinaraqueladecisãodooutrocomominha.
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Somentedo interiordeminhaparticipaçãopodesercompreendidaafunçãodecadaparticipante.Nolugardooutro,comoseestivesseemmeu próprio lugar, encontro‐me na mesma condição de falta desentido. Compreender um objeto significa compreendermeu deveremrelaçãoaele (aorientaçãoqueprecisoassumiremrelaçãoaele),compreendê‐loemrelaçãoamimnasingularidadedoexistirevento:oque pressupõe a minha participação responsável, e não minhaabstração.(BAKHTIN,2010:66)
É percebido, cada vezmais, tanto na sociedade quanto na
academia um comodismo a “não decisão”, como se a posiçãoescolhida fossemuitopequenaenão tivesseefeito. Isso seriaanão decisão, e depois a procura de álibis para dizer, tal coisaaconteceu,maseunãotenhonadaavercomisso.Aresponsabilidadecomoagentessociaisdentroeforadaacademiaedefiscalizareexigir ativamente do governo e da academia novas políticas etecnologiasqueresolvamgrandesepequenosproblemas,globaiseúnicosdaquelepequenogruposocial.
Apesar do otimismo proclamado pelo promissor modelo linear, omundo foi testemunha de uma sucessão de desastres relacionadoscom a ciência e com tecnologia, especialmente desde os finais dadécada de 1950. Vestígios de resíduos contaminantes, acidentesnuclearesemreatorescivisde transportesmilitares,envenenamentosfarmacêuticos,derramamentosdepetróleo,etc.Tudoissonosajudaaconfirmaranecessidadederevisarapolíticacientífico‐tecnológicadilaissez‐faireedocheque‐em‐brancoe,comela,aconcepçãomesmadaciência‐tecnologiaemrelaçãoasociedade.(BAZZO,2003:123)
Bakhtin ainda “apela” para a posição de cada um no seu
singular,equeesse singular construao comunitário.Que cadaum coloqueumpontodevistaeassine responsivamente sobreele.Cadaum temseuprópriomomentoeseupróprioato,quenãopodeser feitoporoutrapessoa.Seassim fosse,seriaoutroatoeoutrarelação,nãoaquelaquevocê tinhaemdeterminadomomento.
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Quantomaisasingularidadeindividualsemantémlongedaunidadeteórica, tantomais se torna concreta e plena: a unicidadedo existireventoqueseexecutarealmenteemtodaasuavariedadeindividual,decujo limiteextremoseaproximaoatonasuaresponsabilidade.Ainclusão responsável na singularidade única reconhecida do ser‐eventoéoqueconstituiaverdade[pravda]da situação.Omomentodoqueéabsolutamentenovo,quenuncaexistiuantesequenãopodeserrepetido,estáaquiemprimeiroplano,econstituíumacontinuaçãoresponsávelno espíritoda totalidade,que foiumavez reconhecida.(BAKHTIN,2010:95)
EngelmeierécitadoporBazzo,comoumautorquejápensou
a funçãodos tecnólogoseengenheiroscomoatoresdeatitudesmaisresponsáveisdentrodasociedade.Desenvolvendoprojetossociais e filosóficos que realmente pensasse o caminho que atecnologiaemrelaçãocomasociedadeeossereshumanos,nãoapenas sendoúteis,mas sendo elaboradosdeuma formamaiscomplexa.
SegundoEngelmeier,ostecnólogoseosengenheirospensamquesuameta é elaborar produtos tecnológicos úteis. No entanto, esta ésomente uma parte da tarefa profissional, visto que tecnólogos eengenheiros formampartedospostosmaisaltosdadentrodostatussocial,transformando‐seinclusiveemhomensdepoder.Estaextensãodasfunçõesedainfluênciadosengenheirosetécnicosdavidasocial,conforme Engelmeier, não só pode considerar‐se positiva, mastambém uma consciência do enorme crescimento econômico dasociedademodernaeéumbomsinalparao futurodassociedades...EmsumaEngelmeiersepropôscomoobjetivodefenderanecessidadede desenvolver um programa filosófico que abordasse a tarefa dedefinir o conceito de tecnologia, os princípios da tecnologiacontemporânea,noqualseanalisasseatecnologiacomoumfenômenobiológico e antropológico. Esse programa filosófico estava tambémpreocupadoemanalisaropapeldatecnologianahistóriadacultura,as relações entre a tecnologia e a cultura, a tecnologia e a ética, e atecnologiafrenteaoutrosfatoressociais.(BAZZO,2003:51‐52)
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Outros autores como Lenk, Moser, Rapp e Ropohl jápensaramemaproximarasociedadeeapolíticadotrabalhodosengenheiros. Criando a filosofia da tecnologia. Inclusive, semtalvez ter uma relação com Bakhtin, eles já tendiam a umpensamentoativo/responsivode todososatores da sociedade,rompendoasbarreirasdaacademiae trazendoavançosparaobemestaremtodososníveisdasociedade.
Graças aodebate estimuladopelaVDI,Lenk,Moser,Rapp,Ropohl,dentreoutros,desenvolveramumnovoenfoquedentrodafilosofiadatecnologia.Para estes autores, a tarefada filosofiada tecnologia eradesenvolverumaanalisesistemáticadasatividades tecnológicas,quetornassepossívelaaproximaçãodospolíticosedopúblicoaotrabalhodos engenheiros através da explicação desses tipos de atividade.AfilosofiadaTecnologiadeviapropor tambémmedidas éticaspara aevolução da própria tecnologia. Finalmente, como assinala I.Hronzsky, a filosofia da tecnologia devia conduzir a umaalfabetização tecnológica do público, e a um impulso da dimensãoética da tecnologia para promover certa consciência ética acerca dodesenvolvimento tecnológico (Hronzsky, 1998, p101). Em sua obraParauma filosofiada tecnologia interdisciplinarepragmática:aTecnologiacomocentrodeumareflexãointerdisciplinareumainvestigaçãosistemática,HansLenkeGunterRopohl(1979)sustentavamqueosproblemasdomundotecnológicodadoseucarátermultidimensional,sópodemserabordadoscomalmapossibilidadedeêxitopartindodopressupostodeumaparticipaçãoativadosgeneralistasdasciências sociaisedosuniversalistasda filosofia; e resolvidosde formaadequada, contandocomacontribuiçãodosespecialistasem*ngenharia.Paraessesautoressefaznecessáriaumacooperaçãoefetivaentreengenheirosefilósofosque se estenda pelos obsoletos departamentos e rompa com asfronteirasacadêmicas.(BAZZO,2003:62)
Retomandooproblemacitadoacima,sobrecomoasociedade
podeedeveatuar,eofatordafaltadeinformaçãocriaropiniõeserrôneas sobre os caminhos que devemos tomar, podemospensar que uma das funções do estudo em CTS seria comoeducadora em todos os níveis de ensino (escolar, técnico e
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acadêmico) para criar um olhar Ativo/responsivo de CTS emtodas as pessoas, organizações e empresas. Levantando assimnossa responsabilidade como pessoas, independente do nívelqueestamos,debuscarummundomelhor.
Somente sendo eumesmo,único, em todoo existir; todososoutroseus (teóricos)não sãoeuparamim;por suavez,estemeuúnicoeu(não teórico) participa do existir singularidade: eu sou nele.(BAKHTIN,2010:98)Oato responsáveléprecisamente,oatobaseadono reconhecimentodestaobrigatóriasingularidade.Éessaafirmaçãodomeunão‐álibinoexistirqueconstituiabasedaexistênciasendotantodadacomosendotambém real e forçosamente projetada como algo ainda por seralcançado.(BAKHTIN,2010:99)
Oconhecimentoeoavançodatecnologiatambémsãocitados
como um fator libertador da sociedade, expandindo nossoshorizontes. Sendo extremamente necessários para a construçãode ummundo como o almejado porHOLDREN, (2009), ondetodosteriamomesmoníveldeconfortoebemestaremtodososcantosdomundo,consumindoosrecursosdoplanetadeformaconsciente.
Mitchamdescrevea sociedadeque caracteriza comoacometidapeloque chama <<desassossego romântico>>,manifestando uma atitudeambíguaparacoma tecnologia.Nelaavontadede tecnologiaéumaformadacriatividade,quepormanifestar‐secomotecnologia,tendeaocupar‐se menos de outros aspectos. Esta ambigüidade de repetedesde o ponto de vista da ação pessoal, posto que esta sociedadeacredita que a tecnologia engendra liberdade,mas separa da forçanecessária para exercitá‐la; pensa‐se que socialmente enfraquece oslaços de afeto pessoais. Com respeito ao conhecimento, são maisimportantes a imaginação e a visão que o conhecimento técnico.Finalmente,julga‐sequeosartefatosexpandemosprocessosdavidaerevelamosublime.(BAZZO,2003:100‐101)
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Porém vale ressaltar que, quando pensamos em novastecnologias,tambémestamoscriandoodesempregotecnológico,no qualpessoas que trabalhavam fazendodeterminada função(muitas vezes desumanas) são substituídas pormáquinas queapresentamumcustomaisbaixoeumaeconomiaalongoprazo.
Nelesnãotendiaaocorreromecanismovirtuosoobservadonospaísescentrais, onde a introdução de tecnologias demaior produtividadecriava, dada a então relativamente baixa taxa de substituiçãotecnológica, oportunidades de emprego, de remuneraçãofreqüentemente superior, em novos ramos industriais.Não seria no“setormoderno”queocombateaodesempregopoderiaser travado.O “vazamento” das atividades mais intensivas em tecnologia, demaiorvaloradicionadoeremuneraçãoparaoexterior–característicada situação de dependência –, e a escassa probabilidade de que os“desempregadostecnológicos”deinadequadaqualificaçãopudessemserretreinadosereincorporadosàproduçãoeramvisualizadoscomoumsérioobstáculo.Odesempregodemandavaumtratamentoglobalque ia, na realidade, no sentido contrário ao que propunha o“neoiudismo” imputado por seus críticos ao movimento da TA.Tratava‐sedeproporcionartecnologiasaosquenãotinhamacessoaosfluxosusuaispelosquaiselassedifundem.(DAGNINO;BRANDÃO;NOVAES,2004:10)
Sendo assim, uma discussão que também deve permear o
trabalho dos profissionais em CTS, a responsabilidade derealocar essas pessoas no mercado de trabalho, em novasfunções,commelhorremuneraçãoequalidadedevida.ConsideraçõesfinaisNesse artigo, existe uma abertura para discussão de vários
pontos.Oprimeiroquegostaríamosderessaltarécomooestudoem CTS é pensado por um lado mais objetivista, como odeterminismo tecnológico e outro, no construtivismo socialtecnológico,umladomaispsicossocial.
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Nodeterminismo tecnológico é como sepensássemosque aresponsabilidadedasmudançassociaisécausadapelatecnologia(objetivismo), como se não tivéssemos responsabilidadenenhuma sobre essas mudanças sociais. É quase como se atecnologia,depoisde criadapelohomem se impusesseno tipode vida que levamos, como se ela tivesse uma consciênciaprópria,umaforçaeumavontademaiordoquerealmentetem.
Jánoque tange ao construtivismo social tecnológico, são asformasque a sociedadeutilizaas tecnologiasque encaminhamparaasmudançasda tecnologia,comonoexemplodabicicleta(DAGNINO;BRANDÃO;NOVAES,2004:25)e suasmudanças.De fato ainda é preciso avançar mais nas leituras em váriosautores,parapoderconceituardeformaclaraessepensamento,assimpretendemosapenasdemarcaressahipótesequeserámaisaprofundadaemoutrosestudos.
Outros dois pensamentos que merecem destaque são opluralismo e a teoriadaparticipaçãodireta, essasduas frentestentando juntar a sociedade nas escolhas políticas científicas,cadaumaasuavisão.
Existemduas grandes teoriasdademocracia com relação ao temadaparticipação pública na gestão da política científico‐tecnológica: opluralismoeateoriadaparticipaçãodireta,quesãofundamentaisparadefinir quem participará. O pluralismo é uma teoria da democraciabaseada nas ações dos grupos de interesse organizadosvoluntariamente. Os cidadãos assumem unir‐se para apoiar estesgrupos a fim de fomentar seus interesses, demodo que o governodemocráticoévisto como funcionamento livreebem sucedidodestesgruposatravésda interaçãodeunscomosoutrosecomogoverno.Aparticipação direta, em troca, fundamenta‐se na noção de quegovernabilidade democrática implica a intervenção dos indivíduoscomotaisnoestabelecimentodasdiversaspolíticas.(BAZZO,2003:136)
Aideiadejuntaressasduasvisõesexiste,pois,elastêmmuito
em comum, as duas fazem com que os cidadãos assumam de
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forma responsável o ato dessa participação, ou como diriaBakhtin(2010)nãoapenasajudaraformularoscaminhosqueaciênciadevetomar,masassinarqueaqueladecisãofazpartedospensamentosdetodos.
A comparação das diferenças e das semelhanças nos proporcionaumavisãomaioremaisampliadoquesignificadefenderquealgumaforma de participação é democrática. Ambas teorias compartilhamuma série de pressupostos comuns. Por exemplo, exigem que oscidadãos intervenhamna formaçãodaspolíticasdemaneiraquevãomaisalémdomeroatodedepositarumvotoemumaurnaedeixarorestoparaelitedepolíticoseoestadoadministrativo,paraquesedêum adequado funcionamento a democracia.Ainda que a forma daparticipação difira, ambas teorias rechaçam aquela definição dademocracia segundo a qual esta não é nadamais que um processoparaelegerumgovernonoqualaselitescompetempara conseguioapoiodasmassas.Asduas teorias requeremqueaparticipaçãosejasignificativaemdois sentidos:quecapacitemelhoroscidadãosparacompreender seus interesses e como estespodem afetar asdecisõesquetenhamimpactosobreseusinteresses,porumlado,equeprepareoscidadãosparaquetenhamalgumaclassedeinfluênciasubstantivasobreoresultadodapolíticaatual,poroutro.(BAZZO,2003:136)
Assim criando cidadãos ativos responsivamente que
interagemde formaconstrutivaparaelaboraçãoepensamentossobre os caminhos que a ciência deve tomar, mesmo que aparticipação de todos da sociedade seja uma ideia um tantoquanto utópica, uma solução poderia ser como citado porDagnino; Brandão e Novaes, 2004 sobre o trabalho de doisautores, Callon e Latour, a criação de um o ator‐rede, querepresentaopapeldaciência,datecnologiaedasociedadecomoumtodonoscaminhosquedevemtomar.
Aabordagemdoator‐rede,extrapolandooconceitoconvencionaldeator, cunha tal expressão para abarcar um conjunto heterogêneodeelementos – animados e inanimados, naturais ou sociais – que serelacionam de modo diverso, durante um período de tempo
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suficientemente longo, e que são responsáveis pela transformação –incorporaçãodenovoselementos,exclusãoouredefiniçãodeoutros,reorientação das relações – ou consolidação da rede por elesconformada (CALLON, 1987). Esse conjunto de elementos estaria,então, formado não apenas pelos inventores, pesquisadores eengenheiros,mas tambémpelosgerentes, trabalhadores,agênciasdegoverno, consumidores, usuários envolvidos com a tecnologia e,mesmo, os objetos materiais (LATOUR, 1992). (DAGNINO;BRANDÃO;NOVAES,2004:23)
Talvez, podemos também usar o nosso modo econômico,
capitalista,anossofavor,vivemosagoraamodadosustentável,em que todas as empresas buscam sermais responsivas.Quetodasasmodasetodososmeiosdapublicidadefossemassim–porém tomando os devidos cuidados para saber se essesdiscursossãoverdadeirosounão.
Adiscussãopública,ointercâmbiodialógicoeaconfrontaçãodedados, informações,argumentoseprospectivasquecadaequipedeestudantes poderia reparar na situação escolhida serviriam paraencenarumapossívelavaliaçãoconstrutivadeumdesenvolvimentotecnológico.(BAZZO,2003:71)
Que amoda para ciência agora fosse pesquisar e financiar
pesquisas que não foquem apenas em grandes coisas (como ogenoma e as células troncos), mas também as pequenasmudançassociais,comoumatecnologiaoutécnicaquemelhoraavidaeoconfortodeumapequenaaldeianaáfrica,etc..equeaciênciasemprepensassenocusto–benefício,mascolocandonoscustos os elementos dos riscos para a natureza e para asociedade.
Fechamosesseartigocomopensamentomuitotrabalhadonocampo CTS e que também terá nossa atenção nos próximosestudos:ocaminhoadequadoparaconseguirmosconstruirumasociedade que saiba se relacionar bem com os avançostecnológicos com as necessidadesMacro eMicro sociais será
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através da educação em CTS, em todos os níveis de estudo(infantil,escolar,técnico,graduaçãoepós‐graduação)formandonãoapenasparaoconteúdo,masqueelessaibamcomoconstruiroconhecimento juntos,de formaresponsáveleativa,nãocomomerosespectadores,mascomopessoasatuantesparaocaminhodobemestarsocial.
As unidades curriculares CTS – ora integradas em programas jáestabelecidosemciência,tecnologiaeengenharia,ciênciassociais,oraem cursos de artes e línguas, ora estruturadas como cursoindependentes‐contemplam,geralmente,cincofases:1)formaçãodeatitudes de responsabilidade pessoal em relação com o ambientenatural e com a qualidade de vida; 2) tomada de consciência empesquisas de temas CTS específicos, enfocados tanto no conteúdocientífico‐tecnológico como nos efeitos das distintas opçõestecnológicas sobreobem‐estardos indivíduos edobem comum; 3)tomada de decisões com relações a estas opções, levando emconsideração fatores científicos, técnicos, éticos, econômicos epolíticos; 4) ação individual e social responsável, orientada a levarparaapráticaoprocessodeestudosetomadasdedecisão,geralmenteemcolaboraçãocomgruposcomunitários (porexemplo,“oficinasdeciência”gruposecologistas,etc.);5)generalizaçãoaconsideraçãomaisamplas de teorias e princípio, incluindo a natureza “sistêmica” datecnologiaeseus impactosambientais,a formulaçãodepolíticasnasdemocraciastecnológicasmodernas,eosprincípioséticosquepossamguiaroestilodevidaeasdecisõespolíticasdobreodesenvolvimentotecnológico.Poroutrolado,podemoschamaressasfasesprogressivasde“cicloderesponsabilidade”(WAKS,1990,inBAZZO,2003:145)
ReferênciasBAKHTIN,M.Para uma filosofia do ato responsável. SãoCarlos: Pedro& Joãoeditores,2010.
BAZZO, W. et AL [Eds.] Introdução aos estudos CTS (ciência, tecnologia esociedade),Madrid:OEI,2003
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DAGNINO, R.; BRANDÃO, F.C. e NOVAES, H.T. Sobre o marco analíticoconceitualdatecnologiasocial.In:LASSANCEJr,A.etal.TecnologiaSocial–umaestratégiaparaodesenvolvimento.Riode Janeiro,FundaçãoBancodoBrasil,2004,p.15a64.
HOLDREN J.P.Science andTechnology forSustainableWell‐Being inSCIENCEVOL 319 25 JANUARY 2008 ‐ Downloaded fromwww.sciencemag.orgonMarch4,2009
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DireitoAutoraletecnologia:apontamentosdenovoscaminhosparaacirculaçãoeacessoaoconhecimento
AlyssaCeciliaBaracat
CamilaCarneiroDiasRigolinIntrodução
Direito Autoral é um tema central em debates acerca daprodução,difusãoeapropriaçãodoconhecimentoedacultura,sendo a forma jurídica um instrumento de proteção paracriadores de obras artísticas e literárias.Desde o princípio dodesenvolvimentodasregrasenormasqueregulamaproteçãodapropriedade artística e literária, existiam dois discursos que“constituíramumatensãoentreopontodevistadasidéiascomopropriedade e a noção de cultura e conhecimento comonaturalmentecomunitários”(GANDELMAN,2004,p.72).
Emboraoargumentodaexclusividadedapropriedadetenhasido adotado e estabelecido como a base para o direito dapropriedade intelectual, o debate relativo à forma ideal deproteçãoeacessodosbensimateriaisaindaseencontralongedeestabilizaçãoeémaisintensificadopelasnovaspossibilidadesdecirculação trazidas pelas tecnologias da informação ecomunicação(TICs).
Entende‐se que a circulação de tais bens é facilitada pelasTICs(entreelasainterneteasmídiasdigitais)equeaproduçãoartística e literárianão está limitada às fronteirasdeumúnicoEstado. Isto leva a discussões multilaterais em organizaçõesinternacionais como a Organização Mundial da PropriedadeIntelectual (OMPI), a UNESCO e a Organização Mundial doComércio(OMC).
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Portanto, no plano internacional as normas referentes aosistemade regulaçãodoDireitoAutoral refletemodiscursodevalorizaçãodapropriedade artística e literária,uma vez que obemmais valorizado nadinâmica econômica da SociedadedoConhecimento é o bem imaterial produzido pelo esforçointelectual.Por“SociedadedoConhecimento”entende‐seatrocade informação potencializada pelas TICs que conferem novaspossibilidadesdeprodução,circulaçãoeacessoaoconhecimentoemnívelglobal.SegundoCASTELLS(2005,p.69)existe:
[...]uma ralaçãomuitopróxima entreosprocessos sociaisdecriaçãoemanipulaçãodesímbolos(aculturadasociedade)eacapacidadedeproduziredistribuirbense serviços (as forçasprodutivas).Pelaprimeiraveznahistória,amentehumanaéaforçadiretadeprodução,nãoapenasumelementodecisivonosistemaprodutivo.
Istoposto,estetrabalhotemafinalidadede,primeiramente,
apresentarohistóricodeconstruçãodosistemadeproteçãodosdireitos autorais abordando os aspectos de valorização daproteção de conhecimento que culminou no monopólio deempregodapropriedade intelectualpara finsdecompetiçãonaeconomiaglobalditaliberal.
Posteriormente, é realizada uma análise que relaciona asnormas que regulam os sistemas nacionais de proteção doDireito Autoral com as novas tecnologias de informação ecomunicação, na tentativa de providenciar respostas para asseguintes questões: Será que estas normas ainda atendem, deforma satisfatória,àsdemandasdaspráticas sociais?Quais sãoas mudanças provocadas pelas TICs que incorrem nainadequação de tais normas e princípios à Sociedade doConhecimento? Por fim, quais são as conseqüências destasmudançasnoprocessodeproduçãoedifusãodoconhecimento?
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Para responder estas questões, será considerado o contextointernacional de proteção da propriedade artística e literária,além de documentos normativos que são a base para aslegislaçõesnacionais sobre amatéria.São estesdocumentos: a)ConvençãodeBernaparaaPropriedadeArtísticaeLiterária,de1886, documento que sofreu várias alterações e revisões nodecorrerdosanos,aúltimaem1979,eéadministradopelaOMPIe; b) o Tratado TRIPs (Acordo Relativo aos Aspectos daPropriedade Intelectual Relacionados com o Comércio) criadoem1994eadministradopelaOMC.
Brevehistóricododesenvolvimentodo sistema internacionaldeproteçãodoDireitoAutoral
O sistema internacional de proteção da propriedade
intelectual consolida‐se a partir do final do século XIX e éformadocombaseemprincípiosenormas jáestabelecidosnossistemasdomésticosqueforamamplamenteaceitosportodososEstados que participaram da realização dos tratados econvençõesinternacionaisnestetema(GANDELMAN,2004).
Estes princípios e regras foram permeados pelos valoresatribuídos à teoria da propriedade privada, com o afundamentaçãonoDireitoNatural enopensamento liberaldoséculoXVIII.Odireitoàpropriedadeeraconsideradonaturaldohomem a partir dos esforços de seu trabalho e os esforçosintelectuais tambémeramconsideradososmais legítimos:“nãohápropriedademaisparticular,mais legítimadohomemqueaproduzidapelotrabalhodeseucérebro”1.
Antes da criação do direito autoral existia um regime deconcessões no qual as autoridades públicas concediamprivilégiosdeimpressãoaoseditores.Foianoçãoemergentede1PreâmbulodoCopyrightLawdoEstadodeMassachussetsde17demarçode1783
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justiçanatural,nosséculosXVIIIeXIX,que inspiroua idéiadequeeramoscriadoresmerecedoresdaproteçãoe,desta forma,os privilégios de impressão foram substituídos pelo direitoexclusivo atribuído ao criador do trabalho intelectual(HUGENHOLTZ,2000).Oautor,portanto,éoúltimoelementoasersocialmentereconhecidonosistemadeproduçãodeculturaeconhecimento,comocolocaMartins(1957,p.442‐443):
Socialmente o autor é o último elemento que aparece nahistóriado livro.Quando issoocorre jáasgrandesbibliotecastinham inscrito sua existência no enorme tombo dahumanidade; os manuscritos se haviam transformado emimpressos;ostipógrafoscélebrestinhamconduzidoasuaarteaumpontoextraordináriodeperfeição.Éestranhoqueapenasum personagem esteja faltando nessa verdadeira “commediadell’arte” – o personagem sem o qual ela não poderia terexistido. Com efeito, pode‐se dizer que até o século XVIII asociedade não reconhece o autor como uma identidadedefinida:individualmenteconsideradoecelebrizado,conformeograudeseusucesso,oautornãotemexistênciasocial,nãoéumadasrodinhasdaengrenagem.
Dessaforma,foramreproduzidasnocenáriointernacionalas
normasdeproteçãodapropriedadeartísticaeliteráriacentradasnapessoadoautorumavezqueosparticularessederamcontada “repercussão internacional dos seus direitos e dacontinuidade da sua personalidade jurídica, e começaram aapresentar propostas com conferência internacional sobre amatéria” (BASSO, 2000, p.87). Depois de alguns anos denegociaçãoaConvençãodaUniãodeBernafoiestabelecida,em1886, como uma convenção‐modelo que substituiria pouco apoucoostratadosexistentes(BASSO,op.cit.),alémdeestabeleceros padrões mínimos para a proteção doméstica das obras
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artísticase literárias,comoobjetivodeharmonizarossistemaslegislativosdetodososEstadoscontratantes.
Após a Segunda Guerra Mundial a ordem internacionalsofreu intensas transformações e o sistema tradicional deproteçãodapropriedade intelectualcedeu lugarparaosistemareguladoapartirdeorganizaçõesinternacionais.
Em 1967, atravésdaConvençãodeEstocolmo, foi criada aOMPI com a finalidade de responder às novas necessidadesgeradasapartirdopós‐guerra,taiscomoosurgimentodenovosEstadosnacionaisapartirdosprocessosde independênciadospaísesdaÁfrica edaÁsia, o crescimentoda interdependênciaeconômica entre os Estados e a intensificação do processo deglobalização.
Noentanto,aOMPInãodispunhademecanismosdesançãoaos infratoresdasregrasdeproteçãoenemumsistemaefetivode aplicação das normas estabelecidas pelos acordos depropriedade intelectual. A partir deste momento, passou aocentrodadiscussãoanecessidadede criarumnovo regimedeproteçãoparaosbensimateriais.
Aeradaproteçãocomercialdapropriedadeintelectual
O reconhecimento da vinculação entre proteção da
propriedade intelectual – que abarca tanto a propriedadeindustrial quanto a propriedade artística e literária protegidapelo Direito Autoral – e aumento do comércio mundialconsolidou‐se a partir das décadas de 70 e 80, quando “ficamevidentes os benefícios da proteção à propriedade intelectualcomo fator fundamental de desenvolvimento tecnológico eaumentodos investimentosdiretosdo exterior” (BASSO, 2000,p.160).
No início da década de 90, foi criada a OMC, agênciainternacionaldo sistemaONU que substituiria o antigoGATT
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(AcordoGeraldeTarifas eComércio) estabelecido em 1947.AOMC passaria a administrar o TRIPS (1994) que realocou osistemadeproteçãodapropriedade internacionalnoâmbitodocomércio.Nesta época estima‐se que 77% das exportaçõesdosEstados Unidos continham produtos protegidos pelapropriedade intelectual em contraposição a 10% estimados nofinaldadécadade40(COTTIER,2007),sendoestepaísomaiorinteressadonaproteçãocomercialdosbensimateriais.
Este rápido crescimento na importância da propriedadeintelectualparaocomérciointernacionalérefletidonamudançaderegime,comforteinfluêncianorte‐americana,quepassavadaOMPI para o âmbito da OMC, organização que detinhamecanismos de sanção caso houvesse o descumprimento denormas dos acordos por parte dos Estados‐membros. Apropriedade intelectual, portanto, tornou‐se uma espécie demonopólio,mesmoemmeioàeconomialiberal.
Asdiscussõesacercadodesequilíbrioentreproteçãoeacessoaos bens imateriais não foram sanadas durante amudança deregime. Também ficaram mais evidentes neste processo osconflitosdeinteressesentreospaísesindustrializadoseospaísesem desenvolvimento devido às assimetrias socioeconômicas.Restringindoaproteçãodapropriedadeintelectualemtermosdecompetição no comércio internacional, o debate sobre odesenvolvimento econômico e social possibilitado pelos bensimateriaisnãoeratãoevidentenoâmbitodaOMC.
Enquanto isso, as práticas sociais tratavam de estabeleceroutrasnormasmediadaspelasnovastecnologiasquesetornvamcadavezmaisacessíveis.
Oquadrodescrito culminounuma contradição amplificadadas questões de Direito Autoral que ultrapassava demandasmeramentejurídicas:
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[...]paraalémdasrelações jurídicasentreosautores,editores,produtores, sociedade e Estado, existem inúmeras relaçõessociaisque transcendem,emmuito,o ʹpuroʹdiscurso jurídicoestatalenoplano internacionalessas relações tornam‐semaiscomplexas e geram outras normatividades envolvendo essesmesmospersonagens(STAUT,2006,p.28‐29)
Anecessidadedeacomodarearticularosatoreseasnormas
aplicadasnosdiferentesníveislevouaumanecessidadedereverosprincípiosdoDireitoAutoral.
Revendo as normas de proteção a partir das TICs: um novocaminhoparaaproduçãoecirculaçãodoconhecimento
ParacompreenderainfluênciaexercidapelasTICsnarevisão
das normas de proteção da propriedade artística e literária énecessário considerar alguns princípios e valores quefundamentamoatual regimedeproteçãodeDireitoAutoral:oprincípiodapropriedadeeoobjetivocomercialdaproteção.
O conceito jurídico de propriedade já sofreu alteraçõesocasionadas por inovações tecnológicas. Esta relação entredesenvolvimentotecnológicoepropriedadeéimportantefocodevários autores do Direito da Propriedade Intelectual. LESSIG(2001) descreve que o conceito de propriedade nos EstadosUnidosatéadécadade40abrangianãoapenasasuperfíciedaterra,mas tudo abaixo dela até o infinito do céu.No entanto,coma invençãodoavião,oespaçoaéreopassouaserutilizadosem a “permissão” dos proprietários de terras.Diante de umprocesso, a SupremaCorteNorte‐Americanadeclaroupúblicasasviasaérease,dessaforma,alterouoconceitodepropriedade.Enoambientedigitalestaquestãoganhanovaperspectiva:
ThroughoutthetimeIʹvebeengropingaroundcyberspace,animmense, unsolved conundrum has remained at the root of
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nearlyeverylegal,ethical,governmental,andsocialvexationtobe found in the Virtual World. I refer to the problem ofdigitizedproperty.Theenigma is this: Ifourpropertycanbeinfinitely reproducedand instantaneouslydistributedalloverthe planetwithout cost,without our knowledge,without itseven leaving our possession, how can we protect it?(BARLOW,1993)2
Em relação ao objetivo comercial de proteção dos bens
imateriais,verifica‐sequeexistemoutrasfunçõesessenciaisparaeles:
Depois da revolução industrial – que patrimonializou asrelações jurídicasatépelomenosaprimeirametadedoséculoXX – vivemos hoje uma revolução tecnológica que tem deconviver comdeterminados fatos e acomodá‐losnumadifícilequação: ao mesmo tempo em que a riqueza sedesmaterializou,ouseja,osbensnãomateriais,intangíveis,sãomais valiosos do que os bens físicos, o direito exige afuncionalização dos institutos, o que significa que apropriedade de tais bens não pode ser exercidaarbitrariamente,devendoatendersuafunçãosocial.(BRANCO,2007)
Istosignificaqueapropriedadeintelectualdevecumprirsua
função social, uma vez que o acesso ao conhecimento éfundamental para o desenvolvimento de um indivíduo. Estafunçãoestáprevistanodireitoeprecisasercolocadaemprática.
2Aolongodotempoemqueeufuitateandoociberespaço,umgrandedilema,sem solução semantevena raizdequase todososabusos jurídicos,éticos,governamentais e sociais encontrados no mundo virtual. Refiro‐me aoproblemadosbensdigitalizados.O enigma é este:Seanossapropriedadepodeserinfinitamentereproduzidaeinstantaneamentedistribuídaemtodooplaneta,semcusto,semnossoconhecimento,semquemesmodeixandoanossaposse,comopodemosprotegê‐lo?(traduçãolivre)
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As TICs, e mais especificamente a internet, representaminstrumentosfacilitadoresqueatendemestanecessidade.
A OMPI, ao realizar as revisões da Convenção de Berna,incluíaastecnologiascomoobjetodeproteção.Ouseja,quandoumanovatecnologiaeracriadacomo,porexemplo,afotografia,esta seria incluída no escopo de conteúdo protegido pelosdireitos autorais.Omesmo aconteceu com o cinema e com ossoftwares,estesúltimosdegrande importânciaparaosEstadosUnidosapartirdadécadade80.
No entanto, os próprios objetos protegidos pelos direitosautorais, como os banco de dados e os softwares, estãoimprimindo um novo significado nos processos sociais deprodução, circulação e proteção dos bens imateriais. Osprocessos coletivos de construção de conhecimento, como asbasesdedados abertas,os softwares livres e o creative commons,são exemplos que desafiam a noção demonopólio atribuída àpropriedade intelectual e que permitem a sociedade formarnormasalternativasàsvigentesnoatualregimedeproteçãodapropriedadeintelectual.
Para os campos de produção de conhecimento científico eartístico, a prática que Bourdieu denomina “interesse pelodesinteresse” adapta‐se às novas possibilidades de circulaçãodosbensimateriais.Aocontráriodoqueseobservanaeconomiacapitalista, os campos de produção científicos e artísticosrepresentam uma economia antieconômica onde impera ointeresse no desinteresse como forma de competir naconcorrênciaregulada(BOURDIEU,2004).
Estescamposencontramcertaautonomiaatravésdasnovaspossibilidades de divulgação do conhecimento e da produçãocientífica facilitadas, principalmente, através da internet.Destaforma,apráticadaeconomiaantieconômicaintensifica‐senestesespaços,ondeacirculaçãodosbenssimbólicoséolucrodesejadopor seus produtores. Por essa razão “certamente a internet
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rapidamentesetornouomeiodominantedecomunicaçãoentreoscientistas”(HUGENHOLTZ,2000).Consideraçõesfinais
Osúltimos50anostestemunharammudançasdramáticasno
desenvolvimentododireitointernacionalemváriosaspectostaiscomo nosdireitos humanos e na cooperação internacional.Noentanto, o maior destaque é atribuído a uma variável dasrelações internacionais considerada amais influente: ciência etecnologia(COTTIER,2007).
As relações entreo conhecimentoproduzido eopoder sãopercebidas de forma clara quando se observa as normas deregulaçãodapropriedadeartísticaeliteráriaquetendemparaaproteçãoemformademonopólio.
As TICs auxiliam na desconstrução de alguns valoressubjacentes aos princípios de proteção dos bens imateriais, noentanto,nãoserãoastecnologiasquedeterminarãooprocessodereconstruçãodestesvalores.Cabeàsrelaçõessociaisopapeldareconstruçãodestesprincípiosenormas.
Oconhecimentoemformadepropriedadeedestinadoparaacompetição na economia global perde força quando existemalternativas que permitem a produção, circulação e acesso aosbens intelectuais para fins de socialização. Existem outroscaminhosparaaproteçãodapropriedadeartísticaeliterária,queestão sendo desenhados, os quais não deixarão de protegerefetivamenteseusautores.
Estas novas alternativas que visam o desenvolvimentosocioeconômico estão sendo discutidas nos fórunsinternacionais, como é o caso da Agenda para oDesenvolvimento criada em 2004, naOMPI, por iniciativas doBrasiledaArgentina,umavezqueastentativasdediscuti‐lasno
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âmbito da OMC encontraram barreiras em decorrência dasassimetriasentrepaísesindustrializadoseemdesenvolvimento.
As questões de pesquisa que norteiam o campo deinvestigaçãodaregulaçãointernacionalsobreosdireitosautoraisseguem a tendência de relacionar Direito Autoral, acesso aoconhecimento e desenvolvimento socioeconômico local,tendênciaestavinculadaàsdiscussõessobreaspolíticaspúblicasdeacessoàsTICs.
Os diversos cenários e perspectivas sociais, culturais,políticas e econômicas, sobrepõe‐se, apontando para anecessidadedeenfoques interdisciplinaresparaasquestõesquepermeiam as discussões acerca doDireitoAutoral.O enfoqueapresentado nos estudos em Ciência, Tecnologia e Sociedadepermite esta articulação e colabora para a formulação derespostas às questões de proteção e acesso ao conhecimento,principalmenteaqueleproduzidonocampocientífico.ReferênciasBRANCO, Sergio.A lei autoral brasileira como elemento de restrição à eficácia dodireitohumanoàeducação.Sur,Rev. int.direitoshuman.,SãoPaulo,v.4,n.6,2007 . Disponível: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1806‐64452007000100007&lng=en&nrm=iso>. Acesso: 30 Jun. 2011. doi:10.1590/S1806‐64452007000100007
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STAUTJRJUNIOR,SérgioSaid.Direitosautorais:entreasrelaçõessociaiseasrelaçõesjurídicas.Curitiba:MoinhodoVerbo,2006.
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Análisebibliométricadaatividadecientíficaemcitricultura:alaranjanoBrasil
CláudiaDanieledeSouzaLeandroInnocentiniLopesdeFaria
Introdução
A Citricultura se refere ao cultivo ou plantação de frutascítricas.OscitroscompreendemumgrandegrupodeplantasdogêneroCitrusrepresentado,namaioria,porlaranjas,tangerinas,limões, limasácidascomooTahitieoGalego,edocescomoalimadaPérsia,pomelo,cidra,laranja‐azedaetoranjas(MATTOSJR.,2005).
NoBrasil,aCitriculturaapresentanúmerosexpressivosquetraduzem a grande importância econômica e social que aatividade temparaaeconomiadoPaís.OBrasildetém50%daprodução mundial de suco de laranja, exporta 98% do queproduz e consegue 85% de participação nomercadomundial(NEVES, 2010). O cultivo de citros está presente em váriosEstadosdopaís, sendoqueoEstadodeSãoPaulo se constituicomopólodinamizadordo setor (Figura 1) representandoporvoltade80%daproduçãoeocultivodafruta(NEVES,2010).
Osetorcitrícolanacional,mesmofazendopartedeumsetorprimário onde teoricamente a pesquisa de ponta não seriaprimordial, é uma das áreas mais atuantes em pesquisas etecnologia.Abrange estudos de clima, solo, genética, botânica,sanidade das plantas, propagação dematerial, portas‐enxerto,manejosde fitotecnia (água,espaçamentos),nutrição, fisiologia,economia e administração (CASER, 2004). Investe também nageraçãode tecnologiade logísticade transporte, conservação e
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movimentaçãodeproduto congelado e transporte agranel emnaviosespecialmentedesenvolvidos ‐oúnicopaísdomundoadispordenavios‐tanque,controledequalidadee rastreamento.(GARCIA,2011).
Figura1:RegiõesprodutorasdecitrosnoBrasil.(Fonte:Sentelhas,2011)O presente estudo pretende, através da elaboração de
indicadoresbibliométricos,terumavisãodecomoseconstituiaatividadecientíficanoqueserefereespecificamenteàlaranjanoBrasil. Pretende‐se verificar como se dá a evolução destaatividade ano a ano no país, detectar quais são as instituiçõesbrasileiras quepesquisam epublicam sobre a laranja, quais ostítulosdosperiódicosemqueesse temaémais fequentee,porfim, verificar quais são os principais assuntos tecnológicosrelacionadosàspublicaçõessobrealaranjanoBrasil.
Seráumagrandecontribuiçãoparaocampoemconsolidaçãodenominado CTS – Ciência, Tecnologia e Sociedade (VON
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LINSINGEN, 2007), visto que os resultados desta pesquisademonstrarão um conjunto de informações que poderãosubsidiar avaliações institucionais, auxiliar estudos sobre aatividade científica e tecnológica na Citricultura brasileira etambém desenvolver políticas públicas específicas para asCiênciasAgrárias.
Arealizaçãodesteestudoémotivadapelarestritaexistênciadeinformaçõesnaliteraturarelativasàtodosessestópicosepelapercepção dos autores do grande interesse da sociedade emgeral.
Esta pesquisa pode ser enquadrada na área de estudosexploratóriossobreaatividadecientífica.Constitui‐sedegrandevalia, visto que os indicadores de atividades científicasencontram‐se no centro de diversos debates, tanto sob aperspectiva das relações entre o avanço da ciência e datecnologia quanto sobre o progresso econômico e social(MACIAS‐CHAPULA,1998).
ImportânciaeconômicadalaranjanoBrasil
Deorigemasiática,asplantascítricasforamintroduzidasno
Brasil por uma das primeiras expedições colonizadoras,provavelmentenaBahia.Commelhorescondiçõesparavegetareproduzir do que nas próprias regiões de origem, os citros seexpandiramparatodoopaísrapidamente.Apartirdosanos30do século passado, a Citricultura começou a ser implantadacomercialmente nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro eBahia, tendo apresentadomaiores índices de crescimento nosEstadosdoSudesteeSul(EMBRAPA,2011).
Emmeadosdadécadade60,a indústriadesucode laranjafoiimplantadanoBrasilemconsequênciadeumagrandegeadana Flórida, nos Estados Unidos, e alcançou rapidamente umníveltecnológicoequivalenteouatésuperioraodospaísesmais
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adiantados do setor. Na década de 80, a união de umaCitricultura extremamente desenvolvida e de uma indústriacompetitiva, fezcomqueoBrasilse tornasseomaiorprodutormundialde laranjas,ultrapassando a regiãodaFlórida,não sóemproduçãocomotambémemtecnologiadecitros(CITRUSBR,2011).
Atualmente,ospomaresmaisprodutivos,resultantesdeumaCitricultura estruturada, estão distribuídos no mundo, nasregiõesde clima tropical e sub‐tropical,destacando‐seoBrasil,Estados Unidos, Espanha, países do Mediterrâneo, México,China e África do Sul. A Citricultura brasileira, que detém aliderançamundial,têmsedestacadoamplamentepelapromoçãodo crescimento sócio‐econômico, contribuindo com a balançacomercial nacional e principalmente, como geradora direta eindiretadeaproximadamente500milempregos.Opaísproduzametadedosucode laranjadoplaneta,cujasexportaçõestrazemde US$ 1,5 bilhões a US$ 2,5 bilhões por ano ao país. Empraticamente 50 anos, a cadeia produtiva de citros trouxe,diretamentedo consumidormundialde sucode laranja,quaseUS$ 60 bilhões ao Brasil a preços de hoje (NEVES, 2010).Portanto, fica claro que a Citricultura brasileira apresentanúmeros expressivos que traduzem a grande importânciaeconômica e social que a atividade tem tanto no territóriopaulista,noBrasiletambémnomundo.
Aculturadoscitrosétambém,umadasáreasmaisatuantesempesquisaetecnologianoBrasil.ConformedescreveZambolin(2006) apesar da liderança brasileira nesta atividade, váriosfatores interferemnocrescimentodaCitricultura,passandoporproblemas climáticos, de mercado e fitossanitários. Assim, apesquisa neste setor é importante no sentido de desenvolvernovas tecnologias capazes de aumentar a produtividade dospomares e também na descoberta e no controle das inúmeraspragas e doenças que ameaçam a atividade, sendo esta uma
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questão prioritária para a garantia da competitividade donegócio(FIGUEIREDO,2008).
Figueiredo ainda cita que a maior parte dos recursos einvestimentos no setor está direcionada à aspectosfitossanitários,umavezque,apesardaliderançabrasileiranestaatividade,existemdiversosproblemasclimáticos,demercadoeprincipalmente fitossanitários – cerca de 300 pragas e doençasqueafetamospomares–queinterferemnoseucrescimento.Emestudodesenvolvidop*rneveseLopes(2005),estimativascomgastos e prejuízos provocados pelas doenças são alarmantes,tendo o setor gasto em 2003,US$ 141milhões comdefensivosagrícolas,aosquaisserianecessárioagregarprejuízosavaliadosemcercadeUS$150milhõesporano,provocadospelaquedadeproduçãoeporperdasdeplantas.
Conforme Amaro (2005) a transferência dos resultados depesquisa na Citricultura representa um elo fundamental nacadeiadegeraçãodeconhecimentos.Énessatransferênciaqueapesquisa expressa seu retorno socioeconômico. Assim, aquantificaçãodaatividadecientíficanessesetorsefaznecessárioe é extremamente relevante no contexto atual. Dominando afruticultura internacional, a Citricultura movimenta grandesvalores financeiros no Brasil e é uma das maiores áreasresponsáveis pela pesquisa, desenvolvimento e inovaçãotecnológicanosetoragronômicopaulista.
Bibliometriaeindicadores
Nasociedadedoconhecimento,aquantidadedeinformação
mais do que duplica anualmente, e essa ‘superoferta deinformação’ obriga indivíduos e organizações a utilizaremtécnicas específicas para extrair dessa enorme massa deconhecimentos disponíveis, a informação necessária (FARIA;QUONIAM,2002).
60
Abibliometriaestudaaorganizaçãodossetorescientíficosetecnológicos a partir de fontes bibliográficas e patentes paraidentificar autores, suas relações e tendências.Tratadasváriasformasdemedira literaturadosdocumentoseoutrosmeiosdecomunicaçãoeé importante,poispermite identificartendênciase crescimento, usuários e autores, verificar a cobertura dasrevistas,mediradisseminaçãodainformação,formularpolíticas,etc.(SPINAK,1998).
Os indicadores de produção científica são construídos apartir da bibliometria, ou seja, pela contagem do número depublicaçõespor tipodedocumento (livros,artigos,publicaçõescientíficas,relatórios,etc.),porinstituição,áreadoconhecimento,país, etc.O indicador básico é o número de publicações, queprocura refletir características da produção ou do esforçoempreendido, mas não mede a qualidade das publicações(SANTOSetal.,2007).
ExistemváriostiposdeindicadoreseosprincipaisdeacordocomFaria(2001)são:
• Indicadoresdeatividades:tambémchamadosdeindicadoresde produção, analisam os dados bibliográficos daspublicações científicas, como o ano, autor, instituição epaís,indicadosemtabelasdefrequência;
• Indicadores de impacto: são os indicadores quemedem osdados de citações de uma publicação, calculando suafrequência por ano, país, instituição, etc. O Fator deImpacto (FI) é uma medida de avaliação que surge dadivisão do número de citações pelo número de artigoscontidosemumarevista;
• Indicadores de ligação: ocorre quando dois dadosbibliográficos das publicações são relacionados. Osprincipais indicadores desta natureza são os de co‐ocorrênciasdeautoria,citações(co‐citações)epalavras(co‐word). São muito utilizados para medir as colaborações
61
científicas e as redes de relacionamento entre países,instituiçõesepesquisadores.
Cada tipode indicadorbibliométricoapresentavantagenselimitações.Adefiniçãopréviado focoeorecortegeográficodoestudo são importantes para a escolha apropriada doinstrumentalbibliométrico.Assim,faz‐senecessárioplanejarsuaconstrução e aplicação de forma criteriosa e contextualizada afim de não considerá‐los como índices absolutos, pois sãocomplementares e devem ser usados de forma articulada, emfunção dos objetivos de investigação e/ou de avaliaçãopretendidos.ConcordamoscomOliveira(1984,p.59),quandooautor afirmaque ʺessemétodonãodeve seroúnico indicadorparaatomadadedecisãoʺ.
Metodologia
Quanto à característica desta pesquisa, considera‐se como
quantitativa,poiselaenumeraemedeetambémqualitativa,poiscompreende e explica um determinado fenômeno(KLEINUBING,2010).
Para fins de melhor desdobramento, foram estabelecidasalgumasetapas,asaber:
• Revisãobibliográfica–RevisãodeliteraturasobreCitriculturae a laranja noBrasil e tambémAnálise bibliométrica, com oobjetivodefundamentarteoricamenteapesquisa;
• IdentificaçãodaBasedeDados–AnálisedaspossibilidadesdecoberturaqueaWebofScience‐WoSofereceemtermosdeáreaeperíodo;
ParaSantosetal.(2007,p.03)“aproduçãodeindicadoresdaciência, por métodos bibliométricos, requer um conjunto dedadospadronizados,sistematizadoseconsistentes,emprincípioencontráveis nas bases de dados bibliográficos.”Optamos porrecuperaressesdadosnabaseWoSquefoiproduzidapeloISI–
62
Institute for Scientific Information e atualmente é do grupoempresarialThomsonReuters.Elaestádisponíveldesde1997,têmabrangência internacionalecontém informaçõesbibliográficasecitaçõesde aproximadamente 40milhõesde artigos científicos,publicados a partir de 1945 emmais de 230 disciplinas.Alémdisso, a WoS oferece registros bibliográficos padronizados,dando a possibilidade de trabalhar com o softwareVantagePoint1.
• Elaboraçãodaexpressãodebusca–Observou‐senaliteraturaonome científico da laranja, suas sinonímias e tambémnomes comuns em português, inglês e espanhol. Com ointuito de delimitar a pesquisa, elaborou‐se a seguinteexpressãodebusca:
Topic2=(ʺcitrus sinensisʺ OR ʺCitrus sinensis (L.)Osbeckʺ OR ʺsweet orangeʺ OR naranja OR laranja)Refinedby:Countries/Territories=(BRAZIL)
• Coleta de dados – Busca e recuperação dos registrosbibliográficos daWoS em formato .txt que é reconhecidopelo softwarede tratamento bibliométricoutilizado;maiscomumente, os estudos bibliométricos tendem a analisarapenas os artigos científicos contidos nos periódicosindexados,assumindoqueestestêmmaiorqualidadeesãomais representativos da atividade científica do que osartigos de revisão, cartas e outros. Entretanto, damesmaforma que Lima e Velho (2008), decidiu‐se aqui incluirtodos os tipos de publicação, uma vez que, o objetivo éanalisaraatividadedepesquisa(enãosomenteaproduçãocientífica) e essa está refletida não apenas na publicação
1 Software que auxilia na contagem, padronização e organização de texto epalavras.
2Pesquisanoscampostítulo,resumoepalavras‐chave.
63
dosresultadosemartigos,mastambémnasdemaisformasdecomunicaçãocientífica.
• Organização e tratamento bibliométrico – Importação dosregistrosbibliográficosparaoVantagePointepadronizaçãode termos relativos à nomes de instituições e títulos deperiódicos.Criaçãodelistasparavisualizaçãodosdados.
• Representaçõesgráficas–ExportaçõesdaslistasparaoExceleelaboração de gráficos para apresentação e análise dosresultados.
Resultadoseanálises
Inicialmente, com o objetivo de mensurar o número de
publicações científicas geradas sobre a laranja a cada ano,verificou‐sequenaWoS surgempublicações sobre esse tema apartir de 1980 (Gráfico 1). Entretanto, a quantidade começa acrescereserrelevantesomentenofinaldadécadade1990.
Gráfico1:Evoluçãodaproduçãocientífica,de1981a2010emperíodosdecincoemcincoanos.
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Estefatopodeserjustificado,vistoquenestaépocasurgiramdiversas doenças importantes nos pomares citrícolas, fazendocom que as pesquisas neste setor se aprimorassem cada vezmais,afimdequefossem*ncontradassoluçõesparaacuradasplantas cítricas.Vale citar como exemplo, apesquisa realizadapor 192 cientistas brasileiros, considerada um dos maioresmarcos da história da ciência nacional: o seqüenciamentogenéticodabactériaXylellafastidiosapublicadonarevistaNaturenoano2000.
DeacordocomNeves(2010)estima‐sequemaisde60%doscustosdeproduçãoda laranjanoBrasilestejamrelacionadosaocontrolefitossanitário3.OGráfico2confirmaestedado, jáqueoassunto plantas e animais estápresente em quasemetade (44%)daspublicaçõescientíficasbrasileirasrelativasàlaranja.
Gráfico2:Principaisassuntostecnológicosrelacionadosalaranja
3Aplicaçãopráticademedidasdecombateàspragasecontroledasdoençasemplantas.
65
Outroassuntodedestaqueéabiologiamolecularegenética(3�lugar). Nos últimos anos, diversas agências de fomentobrasileiras e internacionais têm percebido a importância efinanciadotrabalhosdemelhoramentogenético,vendo‐oscomoestratégia abrangente e duradoura de controle das diversasdoençasexistentesnalaranja.
AsprincipaisinstituiçõesquepesquisamepublicamsobrealaranjanoBrasilestão representadasnoGráfico3.Nota‐sequetodasestão localizadasnas regiõesSuleSudestedopaís.Podeserumaestratégiadelocalização,pois,conformeNeves(2010)édocinturãocitrícola‐SãoPauloeTriânguloMineiro–quesaemmaisde80%daslaranjasproduzidasnopaís.
Gráfico3:Principaisinstituiçõesbrasileirasquepublicamsobrealaranja
A Universidade de São Paulo (USP) possuiaproximadamente 30% de toda a publicação sobre o tema nabaseWoS.AUSPéamaioruniversidadepúblicabrasileiraetempapel de destaque na criação de infra‐estrutura científica etecnológica e na formação da elite intelectual do país.Assim,percebe‐se que no setor citrícola, não faz diferente, sendobastanterepresentativa.
66
Dentre os 10 periódicos que se destacam em publicaçõessobrea laranjaequeestão indexadosnaWoS,(Gráfico4)oquepossui a maior quantidade (60) é o Pesquisa AgropecuáriaBrasileira, editado pela Empresa Brasileira de PesquisaAgropecuária–Embrapa.
Gráfico4:Principaisperiódicoscientíficos
É importanteressaltarquePlantDiseaseePhytopathologysão
dois periódicos muito bem prestigiados e reconhecidosinternacionalmentenaáreaeestãonorankingem5ºe9º lugar,respectivamente.Talfatodemonstraoaltoníveldecompetênciados pesquisadores brasileiros, em pesquisar e divulgar oconhecimentogeradonopaísparaomundo.
Consideraçõesfinais
Odesenvolvimentodoconhecimentoeoprogressocientífico
sãocaracterísticasmarcantesnaúltimadécadanosetorcitrícola.
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Noentanto,agrandequantidadedeinformaçãogeradanecessitade um controle, que permita aos usuários a sua obtenção,disseminaçãoeuso.Parasanaressademanda,ousodaanálisebibliométricaedos indicadoresdaatividadecientíficapassamasercadavezmaisfrequentes(ARAÚJO,2006).
O presente capítulo tratou sobre análise bibliométrica daatividade científica indexada na base de dados WoSespecificamente sobre o tema a laranja no Brasil. Foramelaboradosquatroindicadoresrelevantes:evoluçãodaatividadecientífica desse tema ao longo da história, principais assuntostecnológicos relacionados às publicações de laranja, as 10instituições brasileiras que mais pesquisam e publicam nessetemaeporfim,osperiódicoscientíficosquesedestacam.
Em suma,o estudopermitiu teceruma abordagem sobre aatividadecientíficanosetorcitrícola.Emboraserestrinjaapenasàs publicações indexados naWoS pôde‐se te uma visão geraldessa atividade, o que não esgota outras reflexões epesquisasbibliométricas.Porfim,demonstraaimportânciaeconômicaqueo setor tem tantono territóriopaulista,noBrasil e tambémnomundo.
AsconsideraçõeslevantadasdurantetodooestudoreforçamqueaanálisebibliométricatemmuitoacontribuirparaocampoCTS, podendo subsidiar avaliações institucionais, auxiliarestudos sobre a atividade científica e tecnológica e tambémcontribuirdesenvolverpolíticaspúblicasespecíficas.
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68
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71
Indicadoresdeinovação:análisedametodologiaadotadanaspesquisas
DeniseRodriguesVichiatto1
RobertoFerrariJunior(Orientador)2
1. Introdução.
A Inovação Tecnológica promove o desenvolvimentoeconômico e é vista como estratégica para empresas, para odesenvolvimentoderegiõesedepaíses.OsIndicadoresdeinovaçãotecnológica podem ser utilizados para justificar a formulação depolíticasdeincentivoainovaçãoeorientarosempreendedoressobreestratégias,áreadeatuaçãoe investimentos.Algumasdasmétricasde inovação mais utilizadas nas pesquisas são as atividades emPesquisaeDesenvolvimento–P&D,lançamentodenovosprodutos,criaçãodenovosprocessos,epatentes.
Estes indicadores são elaborados para verificar o esforçoinovador e a taxa de inovação nas indústrias de produtos eserviços de países, estados ou regiões. As pesquisas sãoconduzidas de diferentes formas, incluindo análise de bases dedados epesquisas conduzidaspor entrevistas com aplicaçãodequestionários.
Os Indicadores de Inovação tecnológica existentes sãoabrangentes, considerando inovação de forma ampla, não serestringindo a apenas produtos e processos, mas envolvendonovas formas de gestão, novos mercados, novos insumos deprodução, entre outros. A amplitude destes estudos é em suamaioriadirecionadaparagrandesregiões,comooEstadodeSãoPaulo,ouparapaíses,comooBrasil.
EsteartigotemoobjetivodeanalisarametodologiautilizadanaspesquisasenvolvendoindicadoresdeinovaçãonoBrasileno
72
exterior‐métricasdeinovaçãoutilizadas,fontesdedados,formade coleta dos dados, tipos de empresas observadas, local eabrangênciadaspesquisas.
2.MetodologiadeSeleçãodeLiteratura
A busca da literatura aconteceu nas bases Scielo, Google
acadêmico, banco de teses e dissertações daUSP e ISIWeb ofScience.
A expressão de busca por palavra‐chave (subject index)utilizada na base de dados Scielo (Scientific Electronic LibraryOnline) foi: inovação ou inovação tecnológica ou indicadores deinovação.Foramrecuperadososregistroscontendoestaexpressãodebuscanotítulo,abstractounaspalavras‐chave.
A fim de recuperar documentos referentes a pesquisasrealizadasnoBrasil também foramutilizadosobancode tesesedissertaçõesdaUSP e oGoogleAcadêmico.Nestes,o termodebusca utilizado foi indicadores de inovação* recuperandodocumentosquecontinhamestaspalavrasnotítulo,noabstractenaspalavras‐chave.
PararecuperardocumentosreferentesàpesquisaspublicadaseminglêsaexpressãodebuscautilizadanaISIWebofSciencefoi:innovation*outechnological innovation*ou innovation indicators*.Ouso das referências bibliográficas dos documentos recuperadosnasbasesdedadostambémfoiutilizadocomorecursodebusca.
3. Resultados e Discussão: Metodologias Adotadas naspesquisassobreIndicadoresdeInovação.
3.1IndicadoresdeInovaçãoAdotados
Indicadores são ferramentas que medem o processo de
inovaçãodeumaorganizaçãooudeumgrupodeorganizações.
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Estes fornecem dados objetivos sobre os tipos de inovaçãopraticadospelas empresas.Por exemplo, o quanto investem emP&D, se compram conhecimento e tecnologia, se depositampedidosdepatentes,ouselançamnovosprodutos.
Os dados observados nas pesquisas para elaboração dosindicadores no Brasil podem ser vistos na Tabela 1. Os dadosobservadosnaspesquisasestrangeiraspodemservistosnaTabela2.
As pesquisas sobre indicadores de inovação envolvemestudos que avaliam qual têm sido o esforço inovador dasempresas por meio dos índices de investimentos em P&D,aquisição de novas tecnologias, recursos humanos, escolaridadedepessoalalocadoematividades inovadorasenovas formasdegestão.Estaspesquisastambémverificamapropensãoporinovardas empresas segundo sua localização geográfica, produçãocientífica, captação de recursos governamentais, interação ecooperaçãocomoutrosagentescomo,porexemplo,universidadesecentrosdepesquisaedesenvolvimento.
Os indicadores de inovação avaliam os índices de novosprodutos e novos processos lançados e implementados pelaempresa em um determinado período de tempo assim como onúmero de patentes depositadas. Alguns estudos buscaramavaliar a relação entre inovar e obter resultado empresarial nasindústrias nacionais, sendo os indicadores de resultados ofaturamento, lucro, participação de mercado, aumento nasexportaçõesentreoutros.
Tabela1:MetodologiautilizadanosestudosdesenvolvidosnoBrasil
Autor
MétricadeInovação FontedeDados
Localabrangência
Tipodeempresas
Figueiredo,PauloN.
Capacidadesem*ngenhariadeSoftware
Questionário,observaçãodiretaeanálisede
InstitutosdeP&Ddasregiões
EmpresasdeTecnologiadaInformação
74
2001 CapacidadeemGestãodeprojetos
CapacidadeemProdutoseSoluções
CapacidadeemFerramentaseProcessos
documentação Sul,Sudeste,NorteeNordestedoBrasil
Rocha,Dufloth2003
ValordespendidoemP&Demrelaçãoàreceitalíquidadevendas
Implementaçãodeinovaçãodeprodutoouprocesso
Patentes Suporte
Governamental
PesquisaIndustrialInovaçãoTecnológica(PINTEC)
RegiõesBrasileirasC.Oeste,Sul,Sudeste,NordesteeNorte
Empresasindustriais
RochaeFerreira1998
Percentualdofaturamentoaplicadoeminovação
Númerodepessoalqualificadoenvolvidocomatividadesinovativas
NúmerodePatentesconcedidas/depositadas
AssociaçãoNacionaldePesquisaeDesenvolvimentodasempresasIndustriais(ANPEI)
Brasil GrupodeEmpresasPrivatizadaseumgrupogeraldeempresas
FilhoeMoutinho2002
P&Dinterno Aquisição
tecnologia Lançamentode
novosprodutoseprocessos
Questionário Brasil‐Paraíba
PequenaseMicroempresas
Cabral Númerode Questionário Brasil Indústria
75
2004 inovaçõesdeprodutoeprocesso
BrasileiradeAlimentos
GomeseKruglianskas2006
Númerodeinovaçõesdeprodutoeprocesso
Questionário Brasil EmpresasindustriaisedetransformaçãoligadasaANPEIedoPGTdaUSPedaFundaçãoInstitutodeAdministração
Suzigan,Wilsonetal2002
PessoalqualificadoematividadedeP&D
Marcasepatentes
ProduçãoCientífica
PesquisadeInovaçãotecnológicaPINTEC–INPI,USPTO–BasededadosRAIS
EstadodeSãoPaulo
EmpresasdoestadodeSãoPauloligadasasbasesdedadosanalisadas
Britoetal.2000
NúmerodeInovaçõesdeprodutoeprocesso
PINTEC Brasil IndústriaQuímica
Rieg&AlvesFilho2000‐2002
MontantederecursosinvestidosemP&Deemcapacitaçãotecnológica
Inovaçõesdeprodutoeprocesso
Parceladofaturamentoprovenientedasinovaçõesintroduzidasnomercado
Questionário SãoCarlos SetorMédicoHospitalardeSãoCarlos
QueirozeCarvalho2000
AtividadesdeP&D
PINTECePAEP Brasil IndústriasMultinacionais
76
Hayahietal2006
Patentes InstitutoNacionaldePropriedadeIntelectualINPI
SãoCarlos Empresas,UniversidadesdeSãoCarlos
ArbixeDeNegri(2005)
Inovaçãodeprodutoeprocesso
IPEA‐InstitutodePesquisaEconômicaAplicada
Brasil Indústriasdiversas
Tabela2:MetodologiautilizadanosestudosdesenvolvidosnoExterior
Autor Métrica Fonte(Coletade
Dados)País Tipode
empresasMotohashi1998
GastoscomP&D
Patentes Empregados
devotadosàinovação
InstalaçõesdeP&D
Receitacomlicenciamento
S&T‐PesquisadaNationalBureaudeEstatística(NBS)daChinaQuestionários
China Indústriamanufatura
Tidd2001
GastoscomP&D
Patentes Inovaçõesde
produto Empregados
devotadosàinovação
Indicadoresdedomíniopúblico
USA Indústriamanufatura
Li,Atuahene‐GimaeLuca2001
GastoscomP&D
Empregadosdevotadosàinovação
IntroduçãoNovosprodutos
Questionários Shenzen‐China
Indústriamanufatura
KlompL,Roelandt,2004
GastoscomP&D
AtividadesdeP&D
ResultadosP&D
EuropeanInnovationScoreboard2003
Holanda Indústriamanufatura
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KoschatzkyK,BrossU,StanovnikP1994‐1996
Gastoscominovaçãoouatividadesinovadoras
Percentualdareceitaobtidacomnovosprodutos
Cooperaçõesenetworkingexterno
Questionários Eslovênia Indústriamanufatura
Damampour;Avellaneda2005
Performancedoserviço
Satisfaçãodocliente
AuditCommission(2002)eQuestionários
Inglaterra Indústriadeserviços
EvangelistaeArchibugi1997
Investimentosemnovasmáquinas
InvestimentoemP&D
Questionários Itália Indústriamanufatura
Patel,PPavittK1997
Patentes USPTO
USA Indústriamanufatura
3.2LocaleAmplitudedasPesquisas
Nos estudos realizados no Brasil (Tabela 1) é possívelverificar que apenas dois estudos foram feitos com amplitudelocalrealizados(HAYASHIetal2006,eRIEGeALVES2002).Asdemaispesquisas estão concentradas nasmacrorregiõesdopaís(ROCHAeDUFLOTH2003)enoestadodeSãoPaulo(SUZIGANet al 2002). Estudos estrangeiros sobre inovação (reportados naTabela 2) ocorreram nos Estados Unidos, Inglaterra, China,EslovêniaeHolanda.
Os estudos realizados na Inglaterra (DAMANPOUR;WALKER, AVELLANEDA 2002) e Estados Unidos (PATEL, PPAVITTK 1997),China (Li,ATUAHENE‐GIMA e LUCA 2001)Holanda (KLOMP; ROELANDT, 2004), Eslovênia
78
(KOSCHATZKY, BROSS, STANOVNIK 1996), e Itália(EVANGELISTA, PERANI, RAPITI, ARCHIBUGI 1997)compreenderamopaísporcompleto.Foiidentificadoumestudocom amplitude local na província de Shenzen, China por (Li,ATUAHENE‐GIMAeLUCA2001).
3.3TiposdeEmpresasEstudadas
Osestudossobre InovaçãonoBrasilsãodiversoseestudaram
empresas locais, regionais e nacionais de produtos e serviços, deforma abrangente (independente do porte).Outros pesquisadoresfocaramemsegmentoselocaisespecíficoscomoosdetecnologiadeinformação (FIGUEIREDO 2001), médico hospitalar de empresaslocalizadasemSãoCarlos(RIEG;ALVESFILHO2002),daindústriaquímica(BRITOetal2000),edealimentosnoBrasil(CABRAL2004).
As indústrias multinacionais foram alvo do estudo sobreindicadoresdeinovaçãoporQUEIROZECARVALHO(2000),asempresas privatizadas por ROCHA e FERREIRA (1998), e aspequenasemicroempresasporFILHOEMOUTINHO(2002).
Como mostrado na Tabela 2, as pesquisas realizadas emoutros países abrangeram o setor industrial (independente doporte). Foi encontrada uma pesquisa com foco nas grandesempresas(PATELeP.PAVITT1997),eumapesquisafocadaemempresade serviço (DAMANPOUR;WALKER,AVELLANEDA2002).PesquisarealizadanaItáliacomparoua inovatividadedasempresasnasindústriasaeroespacial,rádio,TVecomunicação,emaquináriodeescritório(EVANGELISTAetal.1997).
3.4 Fontes de dados para as pesquisas sobre Indicadores deInovação
Asfontesdedadosmaisutilizadaspelaspesquisasrealizadas
no Brasil para coleta de informações foram os da Pesquisa
79
Industrial Inovação Tecnológica (PINTEC) realizados peloInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), InstitutoNacionaldaPropriedade Industrial (INPI),AssociaçãoNacionalde Pesquisa e Desenvolvimento das empresas Industriais(ANPEI), Pesquisa de atividade econômica Paulista (PAEP),Relação Anual de informações Sociais, (RAIS), Indicadores deCiênciaTecnologia&Inovação(CT&I)doMinistériodaCiênciaeTecnologia (MCT), Fundo de Apoio a Pesquisa de São Paulo(FAPESP), ConselhoNacional de Desenvolvimento Científico eTecnológico (CNPQ) e Coordenação de Aperfeiçoamento dePessoal de Nível Superior (CAPES), Instituto de PesquisaEconômicaAplicada(IPEA).
Como pode ser observado na Tabela 2, as pesquisasrealizadasemoutrospaísesutilizaram informaçõesdoEuropeanInnovation Scoreboard 2003, US Patent Office (USPTO), S&TPesquisapelaNacionalBureaudeEstatística(NBS)daRepúblicaPopular da China (PRC), IstitutoNazionale di Statistica ISTAT1995,Community Innovation Survey (CIS), Fraunhofer Institutefor Systems and InnovationResearch (ISI), SlovenianOffice forStatistics (SURS), OCDE (Organização para CooperaçãoEconômica e Desenvolvimento) e Audit Commission (2002).Indicadores também foram elaborados através de questionáriostantonoBrasilcomonosoutrospaíses.
4.Conclusão
As pesquisas adotaram como indicadores de inovação a
propriedade intelectual(patentes,marcas),osnovosprodutosouprocessos introduzidosnomercado,os investimentos realizados(em P&D, em capacitação, em equipamentos), as atividades deP&Drealizadasinternamenteouexternamente,opessoalalocadoemP&Desuascapacitações,eresultantesdainovaçãotaiscomoa
80
parcela do faturamento proveniente da introdução de novosprodutos/inovaçõesnomercado.
Para coletar dados referentes à inovação das empresas, aspesquisas utilizaram, principalmente, duas estratégias: (a)questionários respondidos diretamente pelas empresas, e (b)buscadeinformaçõesembasesdedadosouemmacro‐pesquisasrealizadasporórgãosgovernamentaisouassociações.NoBrasil,aspesquisasutilizaram como fontededados aPINTEC,PAEP,IPEA,ANPEI,RAIS,INPIeUSPTO.
Aspesquisasobservaramainovaçãorealizadanasempresas.Ainovaçãodesenvolvidanaacademianãofoiobservadademododireto.Resultadoseconclusõesforamdivulgadosnocontextodetodoumconjuntodeempresas,enãonocontextodeumaúnicaempresa.
As principais contribuições das pesquisas são identificar opatamar inovador das empresas em determinadas regiões,identificar sistemas locais de inovação, conferir o desempenhoempresarial inovador, e prover subsídios para a elaboração depolíticaspúblicas.
NOTAS:1.BacharelemEngenhariadeProduçãopelasFaculdadesIntegradasdeSãoCarlos–FADISC–MestrandaemCiência,TecnologiaeSociedadepela Universidade Federal de São Carlos. Contato:[emailprotected]
2.Bacharel eMestre emCiênciadaComputação (UFSCar 1988, 1992),doutor em Física Computacional (USP, 1996). Professor e chefe doDepartamento de Computação na UFSCar. Linha de pesquisa:EmpreendedorismoTecnológico
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Ciência,TecnologiaeSociedadeempretoembranco:Perspectivasdatecnologianosmangás
FelipeMussarelli
ValdemirMiotello
“[...] quadrinhos são a poesia escrita de nosso tempo.Elesrecuperamfragmentações,sugestõesesilênciosquedificilmente teriamvidanaprosa.”– trechodo textocontido na orelha da edição nacional domangáGourmet.
Os quadrinhos têm ganhado cada vez mais espaço nas
produçõesediscussõesacadêmicas.Antes relacionadosaobrasdebaixaqualidade literáriadestinadasaopúblico infantil,hojecaminham entre os grandes clássicos e são considerados obrascult.Autores comoWillEisner,AllanMoore,FrankMiller, JoeSacco,MiloManara,OsamuTesukaeHayaoMiyazaki figuramentreosgrandesquadrinistascujasobrassãocultuadasmundoafora.
São várias as estéticas e temáticas apresentadas nosquadrinhos,cadaumacomsuaspeculiaridades,sejamelastraçospitorescosoutemáticasjornalístico‐biográficas.
Uma vertente dos quadrinhos que vem chamando atenção,devidoasuagrandeaceitaçãopelospúblicosdetodasasidades,é omangá.Mangá é o nome dado aos quadrinhos de origemjaponesa, mas isso não significa dizer apenas que sãoreproduçõesdashistórias emquadrinhos tradicionais feitasnoJapão. Os mangás possuem características próprias, sendoconsideradospormuitosumestiloúnicodesefazerquadrinhos,umsubgênerodasHQs.
Paraentendermosaidéiadegênerosdiscursivos,Bakhtin,emEstética da Criação Verbal (1997), reporta o funcionamento da
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língua em práticas comunicativas reais e consolidadas,estabelecidasporsujeitosque interagemnocampodasrelaçõeshumanasenacomunicação.Énointeriordasrelaçõeshumanasque se organizam os gêneros discursivos, que suprem asnecessidades sócio‐intelocutivas dos sujeitos que se inter‐relacionam.
Cada gênero possui normas e regras específicas de acordocom a esfera social emque se encontra.A fala comporta‐sedemaneira descompromissada em uma reunião de amigos, aopassoqueemumaapresentaçãoacadêmicaháregrasepadrõesquedevemserseguidos.
Há toda uma gama dos gêneros mais difundidos na vidacotidianaqueapresentaformastãopadronizadasqueoquerer‐dizerindividualdolocutorquasequesópodemanifestar‐senaescolhadogênero,cujaexpressividadedeentonaçãonãodeixade influir na escolha. É o caso, por exemplo, dos diversosgêneros fáticos, das felicitações, dos votos, das trocas denovidades— sobre a saúde, os negócios, etc.A diversidadedesses gênerosdeve‐se ao fatode eles variarem conforme ascircunstâncias,aposiçãosocialeorelacionamentopessoaldosparceiros: há o estilo elevado, estritamente oficial, deferente,como há o estilo familiar que comporta vários graus defamiliaridadeedeintimidade.(BAKHTIN,1997,p.302).
Os gêneros discursivos, para Bakhtin, distinguem em dois
agrupamentos, primários e secundários, sendo os primeirosaqueles construídos em situações discursivas em esferasprivadas, ligadas a experiências cotidianas e íntimas, e ossecundários, por sua vez, construídos em situações públicas,relativamentemaisformais.
Cada gênero pertence a um domínio discursivo; assim, nodomínio de textos religiosos, por exemplo, temos vários
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gêneros: oração, sermão homilia, cartas, etc.; nos textosliterários,podem ser citadosos seguintesgêneros: romance,conto,novela,poemaetc.;nos textosmidiáticos jornalísticos,notícia,editorial,artigoopinativo,históriasemquadrinhoetc.(MESSIAS,2006,p.39).
Todavia, as propriedades dos gêneros discursivos não são
estáticas e, assim como o signo, evoluem junto à língua e aosujeitofalante.
Dentre as diversas temáticas retratadas nosmangás, tem‐seuma em especial que, pode‐se assim dizer, dialoga com asdiscussões propostas pelos estudos em Ciência, Tecnologia eSociedade (CTS). Os enredos baseados em temas de cunhoescatológico, que relatam o futuro, a vida após amorte, “[...]promovem debates cuja ideologia é fortemente impregnada com aperspectivaCTS”.(LINSINGEN,2007,p.03).
OsestudosemCTSestãofortementeligadosaosdebatescomrelaçãoaohomemeoavançotecnológicoeseusefeitosa longoprazonanaturezaenasociedade.
Omovimento CTS teve suas origens nos acontecimentos de1960e1970,osquaiscausaramprofundasmudançasnocenáriodospaíseseuropeusedaAméricadoNorte,vindomaistardearefletir‐se no mundo de forma geral. Esses movimentospautaram‐se em questionamentos em torno da ciência e datecnologia, com relação às armas nucleares e químicas,agravamento dos problemas ambientais e seus impactos navida das pessoas. A partir desses questionamentos,organizações começaram a tomar corpo em prol de umaeducação científica e tecnológica. (PINHEIRO; MATOS;BAZZO,2007,p.05).
Este trabalho tem comobaseoartigoMangás e suautilização
pedagógicano ensinode ciências sob aperspectiva cts (2007)escrito
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porLuanaVonLinsingen,e temporobjetivodarcontinuidadeàsdiscussõesacercadosquadrinhos,emespecialosmangás,noquetangeosestudosrelacionadosàCTS.
CabeaquiumarápidacontextualizaçãodomangánoquedizrespeitoasuaorigemechegadaaoBrasil.Origemdomangáesuaexpansãoparaomercadoexterior.Omangásurgiuemmeadosdadécadade50,nopós‐guerra.
Os recursos injetados pelos EUA no território japonêspermitiram ao Japão criarum fabulosomercado interno e comisso,umaidentidademercadológicaprópria.
As histórias em quadrinhos japonesas são “[...] facilmentereconhecíveisporseutraçopeculiar,utilizaçãodacor,formadecabelo,temas e públicos distintos” (PATATI & BRAGA, 2006, p. 25) epode‐sedizerqueaprimeiraapariçãodeumestilosemelhanteaesse foientreosanosde1814e1849,quandooartista japonêsKatsush*ta Hokusai, conhecido por suas xilogravuras (umprocesso de gravação em relevo que utiliza a madeira comomatriz),retratoucenasdocotidianocompessoasemsituaçõesetraçospitorescos.EstacoleçãodecaricaturasrecebeunaépocaonomedeHokusaiManga.
Contudo,foiem1946queesteestilodedesenhoenarrativaseconsagrou. A publicação do mangá A Nova Ilha Do Tesouro,produzidopeloartistaOsamuTezuka (1928‐1989),acentuoudeumavezportodasaestéticaqueficariaconhecidacomomangá.
Como sucessoda exibiçãodos animês (desenhos animadosdeorigemjaponesa),algumaseditorasiniciaramapublicaçãodemangásnoBrasil
[...] a partir de 2000 [...] quando aConrad Editora trouxe aoBrasil os títulosDragon Ball eCavaleiros doZodiáco, os fãsficaram exultantes: a leitura era feitano sentido oriental e as
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onomatopéiaserammantidasemjaponês,poisfaziampartedodesenho,dandoinícioaumanovaeranomercadonacionaldequadrinhos.(GUSMANapudFARIA,2007,p.20).
Com a crescente popularização dos mangás, algumaseditoras, segundo Vergueiro (2003), praticamente seespecializaramemsuapublicação,oquepossibilitouexploraromercadodeformamaisampla,lançandotítulosinéditosnopaísem seu formato original (impressão japonesa), ou seja, de trásparafrenteedadireitaparaaesquerda.
HojeasvendasdequadrinhosjaponesesnoBrasilsuperamasvendas das tradicionais histórias em quadrinhos norteamericanaseoquadrinhonacionaldemaiorsucessonopaíséogibi Turma daMonica Jovem (ou Turma daMonicaMangá,devido ao fato de sua arte e narrativa basearem‐se nosquadrinhosjaponeses),criadoporMauríciodeSouza.
Nas próximas páginas faremos um apanhado de imagensencontradas nomangás que fazem referencia a tecnologia, oraretratadasde forma fantástica (combase em tecnologias reais),ora representando tecnologias, de fato reais, desenvolvidas eaplicadaspelohomem.
Tecnologiafantásticanosmangás
As narrativas escatológicas, paraLINSINGEN (2007), fazemgrande referênciaaousodaciênciae tecnologia,emcomoestainfluenciaodesenvolvimentodofuturodahumanidadee,dessemodo,ofuturodanatureza.Odestinodeamboséamplamentetrabalhadoemdiversosmangáseanimêsetem,namaioriadasvezes, oHomem e sua ganância como a causade suaprópriadestruição.
Énessetipodenarrativaqueencontramosamaiorpartedasreferências a tecnologia.NomangáX‐1999,dogrupoCLAMP,
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publicadonoBrasilpelaeditoraJBC,narra‐seumabatalhaentrepessoas destinadas a decidir o futuro da humanidade, de umladoàquelesquequeremsalvaroplanetaapagandoaexistênciahumana, e do outro àqueles que ainda acreditam que ahumanidade tomara novos rumos visando a correçãode errospassados.
A temática relacionada a CTS no mangá citado foiamplamente discutida no artigo de LINSINGEN (2007),portanto, nos limitaremos aqui a exemplificar um pouco datecnologia fantástica que permeia as páginas dos quadrinhosjaponeses.
As imagens (figuras 01 e 02) abaixo mostram umapersonagemcapazdeseconectarfisicamenteaumcomputadorde potência inimaginável, que funciona como uma entidadepensante. Essa conexão permite a personagem ter acesso econtrole ilimitado a inúmeras tecnologias computadorizadas eusá‐lasasuavontade.
Figura01‐X‐1999,CLAMP,Vol.02,pág.77
Figura02‐X‐1999,CLAMP,Vol.02,pág.79
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Em1999 talveznãohouvesseumcomputadorcom tamanhopoderde conexão,mashoje, 12 anosdepois, sabemos queumaparelhodesseportenãosóépossívelcomotambémécomum.Devido aos avanços da informática, sistemas monitoram econtrolam praticamente sozinhos inúmeras outras redes decomputadorese,conectar‐sefisicamenteaocomputadortambémjáéalgopossível.
Também discutido por LINSINGEN (2007), o mangáMetrópolis de 1949, criado por Osamu Tesuka, publicado noBrasilpelaeditoraConrad,tratadetemasrelacionadosaofuturo(o futuro imaginado pelo autor em 1949), onde autômatos (nocasodomangá,robôshumanóides),construídospara facilitarotrabalho dos seres humanos, acabam substituindo ostrabalhadores em fábricas, realizando funções em ambientesnocivosasaúdehumana (figura03),aumentandodrasticamenteos níveis de desemprego na sociedade, causando revoltaspopulares1.
Figura03‐Metrópolis,OsamuTesuka,p.74
1O desemprego e revoltasmotivados pela automação das fábricas na obrapodem ser vistos também como uma alusão ao Ludismo, movimentocontrárioàmecanizaçãodotrabalhotrazidopelaRevoluçãoIndustrial.
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Posteriormente a isso, os próprios robôs, dotados desentimentos,acabamserevoltandocontraseuscriadoresdevidoaosmaus tratosnoambientede trabalho (figura04).PanoramasemelhanteémostradonomangáAstroBoy,de1952(figura05),domesmoautor.Nele,um cientista criaumprotótipode robôcapazdetersentimentos.
Figura04‐Metrópolis,OsamuTesuka,p.138
Figura05‐AstroBoy,OsamuTesuka
Odesempregocausadopeloavançotecnológico,podenãoter
sido causado por autômatos humanóides como imaginou oautor,mas de fato ocorreu uma substituição damão de obrahumanapela automatizada em fábricas, que tambémpassou aser utilizada em rotinas de trabalhos desgastantes aos sereshumanoseemambientesnocivosasaúdedosmesmos.Emboraaindanãosetenhacriadorobôscapazesdepossuirsentimentoshumanos, suas especializações e formas estão cada vez maispróximas da humana, realizando atividades cada vez maiscomplexas.
Vimos acima alguns exemplos de como a tecnologiafantástica, mas com base na realidade, é mostrada nosquadrinhos japoneses. Diversos outrosmangás que tratam de
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temasfantásticos, ligadosatecnologia,apresentamsemelhançasnoquedizrespeitoaapresentaçãodetecnologias.
Emseguidaveremosalgunsaspectosdetecnologiasreais,ouseja,fabricadaseaplicadaspelohomem,mostradasnocotidianodoscidadãosouexemplificadasemsituaçõesfictícias.AspectosdetecnologiasreaisnosquadrinhosjaponesesNa obra Gourmet, de Jiro Taniguchi e Masayuki Qusumi,
publicadarecentementenoBrasilpelaeditoraConrad,chamaaatenção por seu roteiro peculiar. O que seria colocado emsegundo plano em outro mangá, aqui recebe destaque deprimeiro plano narrativo... a culinária!Gourmet é uma viagemgastronômicapeloJapão.Acadacapítuloumarefeiçãodiferente,eaofim,umbanquetedeconhecimentoculinário.
Na figura abaixo (figura 06) podemos ver o protagonistacomprando um item conhecido como Jetbox. Alguns mangásmantêmseus termosde línguamaternanão traduzidos,apenasromanizados(Romaji)2,aumentandoaimersãodoleitor.Devidoaesse fato,éoferecidoao finalde cadavolumedemangá,emsuamaioria,umglossáriocomtraduçõesedefiniçõesdostermosnãotraduzidos.
Alémdepequenas tecnologiasutilizadasnocotidianosocial,o mangá também nos permite entender a funcionalidade dealgunsaparatosdetecnologiaavançada.
OmangáHighSchoolOfTheDead,deDaisukeSatoeShoujiSato,publicadonoBrasilpelaeditoraPanini,contaodramadeumgrupodeestudantesque sevêemmeioauma invasãodemortos‐vivos.Emumdeterminadomomentodatrama,ospaísescomgrande arsenalbélicodisparam, emum atodedesespero,
2 O romaji é empregado na transcrição fonética da língua japonesa para oalfabetolatino(ouromano).Éatransliteraçãodalínguajaponesa.
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mísseis (figura 07) contendo ogivas nucleares nos países deconflito.
Figura06‐Gourmet,deJiroTaniguchieMasayukiQusumi,pág.63
*N.T.: JETEBOX éum recipiente comdispositivo aquecedorusadoparaesquentarmarmitas.Sobo fundodo recipientehácalvirgemeuma bolsad’água.Quando sepuxa o barbante que ficado ladodefora,abolsad’águaestoura,colocandoacalemcontatocomaáguaedesencadeando uma reação que libera calor (trecho retirado doglossário apresentado no própriomangá. Trata‐se, portanto, de umcuriosoartefatotecnológicodeusoculinário,nestecaso,utilizadoparaesquentaracomida).
Afrotadedefesanavaljaponesaconseguedestruirosmísseis
antesdeatingiremaatmosfera,comexceçãodeum,queacabasendo interceptado tardiamente na atmosfera (figura 08)causando um efeito eletromagnético conhecido como P.E.M.(PulsoEletromagético)ouEMP,doinglês,electromagneticpulse.
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Figura07–HighSchoolOfTheDead,deDaisukeeShoujiSato,Vol.04,p.66
Figura08–HighSchoolOfTheDead,deDaisukeeShoujiSato,Vol.04,p.69
Algumas personagens, conhecedoras de termos técnicos
militares explicam aos companheiros, e consequentemente aoleitor,osignificadodetaistermos(figura09).
Figura09–HighSchoolOfTheDead,deDaisukeeShoujiSato,Vol.04,p.85Na sequênciade imagens surgemos termosH.A.N.E,Raios
Gama,EfeitoCompton,EstratosferaeP.E.M.Comapresençado
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glossárioaofimdovolumedomangá,encontramosasseguintesdefiniçõesparacadatermo.
H.A.N.E. – sigla de “High‐Altitude Nuclear Explosion”, do ingles,“Explosão Nuclear em Grande Altitude”, relativo a explosõesnuclearesocorridasemgrandealtitudeequegeramefeitoP.E.M.(vertermonesseglossário)emlargaescala.Amaioraltitudefoide400kmnadetonaçãodaogivanuclearnorte‐americana“Starfish‐Prime”,em9dejulhode1962.OP.E.M.geradofoitãointenso,quemuitossatélitesforamdanificados,alémdecausardanoselétricosem todosos tiposdecomponenteseletrônicosnaregiãodoHavaí.Nostestessoviéticosda“OperaçãoK”,de1962detonaçõesa300kmacimadoníveldomargeraram um P.E.M. que conseguiu fritar 570 km de cabeamentotelefônico e 1000 km de cabos de alta voltagem que estavamenterrados.Raios Gama – refere‐se à radiação ionizante por radiaçãoeletromagnética.EfeitoCompton –diminuiçãode energia (aumentode comprimentodeonda)deumfótonderaios‐Xouderaiogama,quandoeleinteragecomamatéria,ouseja, fótonscarregadosdeenergiaeletromagnéticapodem golpear elétrons e expulsá‐los de átomos com númerosatômicosbaixos.Nocasodeumabombanuclear,osfótonsdeintensaradiaçãogamaproduzidapelaexplosãopodemarrancarumagrandequantidadedeelétronsdosátomosdeoxigênioenitrogênioexistentesnaatmosfera.Essefluxodeelétronsinteragecomocampomagnéticoda Terra, criando uma corrente elétrica alternada, que por sua vezinduz um potente campo magnético. Finalmente, o pulsoeletromagnético resultante induz intensas correntes elétricas emmateriais condutores espalhados por uma extensa área, queimandocircuitosecausandoumblackoutgeneralizado.Estratosfera–camadadaatmosferaentre21e50kmdealtitude.P.E.M. – sigla de “Pulso Eletromagnético” (ou “EMP”, em inglês,“electromagneticpulse”).Um campoeletromagnéticopodedanificarcomponenteseletrônicospresentesnaárea.OsP.E.M.podemtertrêscausas: fatores naturais (explosões estelares); explosões nucleares ebombasdeP.E.M.(dealcancebemmenor.
Mesmo não sendo essa a intenção primordial da obra, ela
acaba nos oferecendo uma gama de informações acerca de
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ciência e tecnologia,bem comoalertasaosdanos causadosporessasmesmastecnologias,comonocasoexemplificadoacima.
Muitos outros títulospossuem essasmesmas características,masescolhemosapenasdoistítulosquemostrassemdoisníveisdistintos de tecnologia, uma cotidiana e uma de cunho maisavançado.
ConcluindoSão inúmeras as aparições nas páginas dos quadrinhos
japoneses de termos utilizados nas ciências e que fazemreferênciaaosatuaisdebatesno campoda ciência, tecnologiaesociedade.
Nosmangásmaisantigosépossívelnotarumpanoramadefuturo,ofuturoimaginadopeloautornaépocaemquecriavaaobra; memórias de futuro, que, para Bakhtin, constitui oinacabamentoemqueestamosinseridos,comfoconotempoqueesta por vir, ajudando‐nos nas escolhas e tomadas de decisão.Alguns desses panoramas imaginados pelos autores podem setornar, em parte, realidade, como foi o caso das “tecnologiasfantásticas”aolongodotexto.
Tambémfoipossívelnotarumapreocupaçãodoseditoresnasignificação dos termos escolhidos, apresentando glossários aofinal de cada edição lançada3, aumentando o grau dasinformaçõescontidasnomangá,comofoiocasodas“tecnologiasreais”duranteaconstruçãodoartigo.
Essa preocupação em significar da melhor forma possíveltermos mais específicos nas narrativas das histórias emquadrinhos japonesas possibilita que asmesmas sejam usadascomo complementação dos estudos emCTS, ajudando no que
3Nemtodasaseditorasfazemusodeglossários,contudo,éunânimeousodenotas de rodapé explicativas, tanto para traduzirem termos como paracontextualizaçãoesignificaçãodosmesmos.
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diz respeito ao entendimento de discursos e discussõesmotivadaspelosdebatesem campos científicos,bem como,emmuitoscasos,osefeitoscolateraisdecertastecnologiascriadaseaplicadaspelohomem.
AcompanhandoosestudospedagógicosemCTSfazendousodemangás realizados por LINSINGEN (2007), contudo, numaabordagemmaisdemonstrativa,acentuamosnesse textoalgunsaspectos relacionados a ciência, tecnologia e sociedadeapresentados, através de discursos quadrinísticos, nosquadrinhos japoneses,cujaaceitaçãoentreapopulaçãomundialécadavezmaior.
Utilizaroutrossuportesdeinformaçãoquenãoostradicionaisé uma realidade e amemória coletiva é preservadade acordocomosacontecimentosnaqualestaécontextualizada,fazendo‐seassimpartedeumaciênciachamadahistória.JacquesLeGoffemsuaobraHistóriaememória(1990),estruturaideologicamenteno último capítulo, nuances entre ambas as disposições deobservar a história, seja pelos monumentos ou pelosdocumentos. Hoje os quadrinhos são apenas quadrinhos,entretanto, futuramente, poderão nos contar acerca dopensamento dominante, dos debates e discussões, daspreocupações sociais da época de sua criação... Assim comofazemhoje.
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Umarevisãohistórico‐conceitualsobreaTecnologiaSocial
GabrielaG.MezzacappaIntrodução
Tecnologia Social (TS) é um termo que vem recentemente
ganhando crescente repercussão social e acadêmica no Brasil.Embora haja ainda poucos trabalhos desenvolvidos a esserespeito, sendoamaiorparteprovenientedosmesmosautoresou núcleos de pesquisa, sua abrangência vem crescendo tantoemquantidadedetrabalhos(boapartefoipublicadademeadosde2005paracá),quantoemdiversidadedeolharesarespeitodoconceito, de tecnologias desenvolvidas e de populaçõesrelacionadas.
Estetrabalhotemcomoobjetivorealizarumabreveretomadahistórico‐conceitual do termo, de forma a suscitar novasreflexõesquepossamcontribuir,diretaouindiretamente,comodesenvolvimento da definição e das aplicações da tecnologiasocial.
Primeiramente, será abordada a noção de tecnologia,conformeoolhardeFeenberg (2008).Num segundomomento,serãoapresentadasasdefiniçõesdeTecnologiaSocialsegundoaRededeTecnologiaSocial(RTS,2005)eoInstitutodeTecnologiaSocial (ITS,2009),alémdeexplorarasdiretrizesquedefinemeorientam a TS, com contribuições de diversos autores. Emseguida, será realizada uma retomada histórica do conceito,indicando suas possíveis origens. Por fim, será indicada umareflexãoa respeitodas relaçõesentreTSeocampodaCiência,TecnologiaeSociedade(CTS).
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ANoçãodeTecnologiaO correto entendimento do termo tecnologia social é
facilitado por um entendimento do significado do conceitotecnologia, bem como dos diversos olhares a respeito danaturezadaciênciaedatecnologia.SegundoFeenberg(2008),anoçãode tecnologia remontaàGréciaantiga, tempoe localemqueseacreditavaqueascoisaspossuíamemsiumaessênciaquepresumia sua finalidade para o uso humano, cabendo aosestudiososdescobri‐la.Atechné,nessecontexto,seriaoconjuntodeconhecimentosarespeitodessa finalidade,quecorrespondiaemseucontextoaopapelqueamodernatecnologiadesempenhanasociedadecontemporânea.
Para Feenberg, duasmáximas exemplificam o pensamentopredominante a respeitoda ciência eda tecnologia, adeRenéDescartes, que defendia o domínio da natureza por meio daciência, e adeFrancisBacon,que afirmavaque serdetentor oconhecimento significa ser detentor do poder. A visão atualpredominante sobre a Ciência e Tecnologia (C&T) não diferemuitodavisãomoderna.Nosalicercesdessa construçãoestáanoção de que as coisas não possuem um significado e umafunção para uso humano em si, mas que os seres humanosatribuem sentidos eutilidades às coisas aodesenvolvernossosartefatostecnológicos.
Desde a modernidade até atualmente, a tecnologia é omodelodo“ser”.OautordestacaosexemplosdadescriçãodeGalileuarespeitodofuncionamentodoUniversocomparando‐oao funcionamento de um relógio e dos diversos manuais de“como fazer” que assumem o próprio ser humano como umartefato, cujas regras de funcionamento são por eles ditadas(“Como educar seu filho”, “Como perder peso”, entre tantosoutros).
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Essas diferentes visões a respeito daC&T se encaixam emumarepresentaçãopropostapeloautor,compostapordoiseixos,umsimbolizandoaneutralidadeounãoneutralidadedaC&Teoutro simbolizandoaautonomiaou controle sobreoprogressodelas. A Figura 1 pode facilitar o entendimento dessarepresentação. Nos quadrantes formados por esses eixos seencontram:a)odeterminismo(C&Tneutraseautônomasemseudesenvolvimento); b) o substantivismo (C&T perspassadas porvalores e autônomas em seu desenvolvimento); c) oinstrumentalismo (C&T neutras e controladas em seudesenvolvimento); e d) a teoria crítica (C&T não neutras econtroladasemseudesenvolvimento).
Figura 1 –Representaçãodas correntesdepensamento a respeitodofuncionamentodaC&T.Figuraproduzidapelaautora.
Todas essas visões encontram coro em algumas vozes na
sociedadecontemporânea,porémFeenbergdefendeopontodevistadateoriacrítica,umavezqueaoassumirqueC&Tnãosão
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neutrasequeseudesenvolvimentodevesercontrolado,oautoradmite que é necessário pensar nas consequencias dodesenvolvimento científico e tecnológico desde sua concepção.Essepontodevista tambémadvogaqueodesenvolvimentodaC&T deveria ser pautado pelas necessidades sociais edesenvolvidodemocraticamente.Comoserápossívelverificarnapróxima seção, esse ponto de vista é bastante adequado àsdefiniçõesediretrizesdatecnologiasocial.
TecnologiaSocial:DefiniçõeseDiretrizes
Foram admitidas aqui as definições de dois dos principais
núcleos de pesquisa e registro de TS no Brasil: a Rede deTecnologiaSocial (RTS)eo InstitutodeTecnologiaSocial (ITS).Ambas possuem uma grande similaridade, embora possa serconsideradoqueadefiniçãodoITSincluidoiselementosamais:aapropriaçãodaTSpelapopulaçãoeanoçãodemelhoriadascondições de vida. Também, a definição da RTS inclui“produtos” comopartedo quepode ser consideradoTS, alémdastécnicasemetodologias.Devidoaessaspequenasdiferenças,pode‐se considerar que as definições não são mutuamenteexcludentes,mascomplementares.
Assim,aRTSconsideraqueTSsão“produtos,técnicase/oumetodologias reaplicáveis, desenvolvidas na interação com acomunidadequerepresentemefetivassoluçõesdetransformaçãosocial”(RTS,2005).JáoITSafirmaquesetratado
conjuntode técnicas emetodologias transformadoras,desenvolvidase/ou aplicadasna interação com apopulação e apropriadaspor ela,que representam soluções para inclusão social e melhoria dascondiçõesdevida(ITS,2009,p.13).
É possível depreender daí as diretrizes que definem uma
certa tecnologia comoTS.Cabe ressaltarque asdefiniçõesnão
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foram construídasde forma a criar essasdiretrizes, antes foi aconfluência de características dos diversos contextos em que aterminologia foi utilizada que permitiu a construção dasdefinições(ITS,2004).
Há uma concordância entre diversos autores a respeito dequaissãoessasdiretrizes,quesãoapresentadasabaixo,seguidasdasreferênciasqueasendossam.
a)TSimplicanavisãodemundodequeC&Tnãosãoneutras,mascondicionadas por valores e intenções específicos (FONSECA,SERAFIM,2010;ITS,2004);
b)Voltada à inclusão social, compreendida como inserçãodepopulaçõeshistoricamenteexcluídas(como idosos,pessoascomnecessidadesespeciais,mulheres,doentesmentais,entreoutros),especialmente em relação aomercadode trabalho (FONSECA,SERAFIM,2010);
c)Requer a participação de diversos atores: pesquisadores, poderpúblico emovimentos sociais, sociedade civilorganizada,de formaagarantir umamultiplicidade de olhares que possam contribuirparaaresoluçãodeumademandasocial(FONSECA,SERAFIM,2010;ITS,2004);
d) Possui uma relação com políticas públicas, àmedida quepodem indicar diretrizes para essas políticas com base naresolução de necessidades sociais específicas (FONSECA,SERAFIM,2010;DAGNINO,R.,2004);
e)Aênfaseestánoprocessodeproduçãodatecnologia,maisdoqueno artefato, processo ou metodologia em si (RODRIGUES;BARBIERI,2007);
f)A construçãode conhecimento é coletiva, com participaçãodos diretamente atingidos (RODRIGUES; BARBIERI, 2007; ITS,2004);
g) Objetiva o atendimento a demandas sociais concretas,especialmenteaslocais,umavezqueaC&Tnãoéneutra,deveser
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direcionada de forma a promover a inclusão e a resolução deproblemassociais(RODRIGUES;BARBIERI,2007;ITS,2004);
h) O planejamento e a aplicação são organizados, partindo deumaagendapré‐definida,deformaquesejapossívelavaliarseusimpactosparaaquelapopulação(RODRIGUES;BARBIERI,2007;ITS,2004);
i)Oprocessodeconstruçãodoconhecimentoéensejoparaaaprendizagem de todos os envolvidos, possibilitandoconcomitantementeumacerta formadealfabetizaçãocientífico‐tecnológica para os assim chamados “leigos” e o contato comobjetos de pesquisa interessantes para os pesquisadores, entreoutraspossíveisaprendizagens (RODRIGUES;BARBIERI,2007;ITS,2004);
j)A tecnologiadesenvolvidadevegarantira sustentabilidadeeconômica,socialeambiental(RODRIGUES;BARBIERI,2007);
k)A construção de conhecimento deve ser realizada a partir daprática, levando em consideração o conhecimento tradicional eempíricodapopulaçãodiretamenteafetada(ITS,2004);
l)Devehaver a possibilidade de aplicação e aperfeiçoamento emsituaçõessimilares(ITS,2004);
m) Deve ser interdisciplinar em seu desenvolvimento, deforma a possibilitar um olhar mais abrangente acerca dacomplexidade do problema e solução abordados (DAGNINO,2004);
n)Oconceitodevepermaneceremconstanteconstruçãoconjunta,pormeiodereuniões,encontroseestudosespecíficosparaessefim,deformaqueaevoluçãodoconceitoacompanheaevoluçãoda sociedade conforme asmudanças forem acontecendo (ITS,2004).
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HistóricoSegundoFrança(2010),existemduasvertentesarespeitodo
surgimento da TS, quais sejam na Índia, com base nodesenvolvimento da Tecnologia Apropriada (TA) ou emcontraposição à Tecnologia Convencional (TC). É possível,porém, considerar que ambas as vertentes se entrecruzam,podendo ter influenciado concomitantemente o surgimento doconceito.
Dagnino, Brandão e Novaes (2010) contextualizam osurgimento da TS a partir da crise da TecnologiaApropriada(TA),cujaorigemremontariaàÍndiadoséculoXIX.Nocontextodadominaçãoinglesa,Ghanditeriaincentivadoaapropriaçãodeumatecnologiajáutilizadaporpequenosgruposdeartesãosporpartedeumagamamaiordapopulaçãoindiana,comoformadecombateraimportaçãodeprodutosestrangeirosedevalorizaraproduçãonacional,fortalecendoaeconomiaindiana.Trata‐sedeumaespéciederocadefiar,chamadaCharkha,cujaimportânciaprática e simbólica foi tão forte no contexto em que o país seencontrava que até hoje é representada em sua bandeira. AapropriaçãodatecnologiadoCharkhaparaumusodiferente,emmaislargaescala,possibilitouestabilidadeeconômicaesocialnocontexto de crise. Uma frase de Ghandi se tornou célebre aovalorizar o saber tradicional e ousoda tecnologia apropriada:“produção pelas massas e não produção em massa”,contrapondoessaformadeapropriaçãotecnológicaàtecnologiaindustrializada.
Segundo Rodrigues e Barbieri (2007), mais tarde, já nasdécadasde1960e1970,aTAfoidifundidacomoalternativaaousodas tecnologiasdesenvolvidas pelos paísesde ponta, umavez que essas Tecnologias Convencionais (TC) eram caras einacessíveisaospaísessubdesenvolvidos.ATArecebeudiversasdenominaçõesentreasdécadasde70e90,porém todaselasse
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referiamaummesmomodelo:admitirumacertatecnologiapré‐existente e adapta‐laparaumuso oupropósito específicos,deacordo com as condições sócio‐culturais dos usuários dessatecnologia.
Para esses autores, os princípios da TA seriam a baixanecessidade de investimento, a geração de empregos, asimplicidade organizacional, a adaptação sociocultural, a auto‐suficiência local, a economia de recursos, o uso de recursosrenováveiseocontrolesocial.
Nadécadade70,aconteceuareuniãodoClubedeRoma,emqueospaísesdesenvolvidosdebatiamquestõesambientais.Nessecontexto,admitiu‐sequeaTAdesenvolvidapelospaísespobresera interessante, uma vez que permitiria que esses paísespermanecessem poluindo a uma baixa taxa, de forma que omontante de poluição gerado pelos paísesmais desenvolvidospudessepermaneceromesmo,minimizandoaquestãoambientalanívelglobal.Dessaforma,oapoioàTAporpartedoClubedeRoma envolveu o interesse de que servisse como um paliativo,mitigou consequenciasda situaçãodedominaçãoporpartedospaíses desenvolvidos, de forma a manter esse sistema dedominação(RODRIGUES;BARBIERI,2007).
Assim,umadascríticascitadaspelosautoresàTAéofatodetender a manter a exclusão social por meio de uma geraçãopaliativademelhorescondiçõesdevida.OutrascríticascitadassãodequealgumascorrentesdaTAmantinhamumpensamentosalvacionista, do tipo “a minha tecnologia é a tecnologiaadequada, émelhor do que a sua”, e determinista, segundo oque o desenvolvimento científico‐tecnológico é linear einvariavelmente ruma ao progresso, além da visão da ciênciacomoneutra.Assim,aTAgeradesenvolvimentosocial,masnãocriticaofuncionamentodasociedade(RODRIGUES;BARBIERI,2007).
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Aindasegundoessesautores,nocontextodaglobalizaçãoedoneoliberalismo,aTAentraemcrise,aose instituiromodelodaTCcomoatecnologiaideal,amaisdesenvolvidaeaquegeravantagensnomercadocompetitivo,deformaqueaTAnãomaisaparentasersuficienteparaageraçãodequalidadedevida,umavezqueaquelesqueaadotamnãosãocapazesdecompetircomos que fazem uso da TC. A crise da TA abriria, assim, emconjunto com os processos de adequação sociotécnica, portaspara o desenvolvimento de uma forma mais socialmenteadequada de desenvolvimento tecnológico, mantendo osprincípiosdaTA,masassumindoanão‐neutralidadedaC&Teanecessidade da construção coletiva da tecnologia, envolvendoaquelesdiretamenteatingidosporela,de formaapossibilitaroempoderamento da população em relação ao conhecimento.Assim, a TS se contrapõe à TA basicamente em relação aoprocessodeconstruçãodoconhecimento.
ParaOliveira,Costa,Dagnino e Faria (2009), a TC serve àlógicacapitalistaemercadológica,sendoguiadapelosinteressesdequemdetémopodernessecontexto.Porém,essa finalidadeda TC permaneceria protegida pela noção de neutralidadecientífica e tecnológica (a visãode que aTC é a tecnologiadeponta, a mais avançada, isenta de interesses, mas comodesenvolvimento natural da C&T). Além disso, por meio deprocessos de patenteamento, a TC traria lucro aos seusinventores,enãodiretamenteaosseususuários,eageraçãodebem‐estarequalidadedevidaparaasociedadecomoum todoaconteceriamaisa longoprazo.Dagnino(2004)consideraaindaqueaTCéinadequadaàinclusãosocial,umavezqueépautadana lógicada competição eda hierarquizaçãodo trabalho, cujoritmo de trabalho é ditado pelas máquinas num modelocoercitivo de controle da produtividade. Devido ao fato deobjetivar o lucro e a competitividade, a TC não permite aparticipaçãopúblicaemsuaformulação.
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Contrapondoessascaracterísticas,aTSseriacapazdegerardesenvolvimento social e qualidade de vida a curto prazodiretamente para os inventores e usuários da tecnologiadesenvolvida – os próprios atingidos pela problemáticasolucionadapelaTS (OLIVEIRA,COSTA,DAGNINOeFARIA,2009). Ela seria adequada à inclusão social, aos pequenosprodutoreseaosempreendimentosautogestionários,sendoqueoritmodotrabalhoéditadopelasnecessidadesecaracterísticasdaquelapopulação.ATSseriaintrinsecamenteparticipativa,nãoapenas possibilitando a opinião pública a seu respeito,mas aconstruçãocoletivaeparticipativadoconhecimentoportodososinteressados(DAGNINO,2004).
Retomando essa perspectiva histórica, parece bastantepalpável imaginar a TS enquanto procedimentos ou artefatos,uma máquina inventada por um conjunto de pessoas, comdeterminada forma de utilização. Porém alguns autores, comoDalRi(2007),consideramqueotermoTSpoderiaseraplicadoaformas organizacionais do trabalho e da produção,especificamente as formas associativas e autogestionárias detrabalho, que teriam surgido para sanar uma demanda socialespecífica.Assim,nãosepodeperderdevistaqueadefiniçãodeTS émais ampla, e tem sempre emvistauma inovação social,uma tecnologia nova para ser aplicada com um propósitoespecíficoaumasituaçãoespecífica.
ComodesenvolvimentodaTSeacriaçãodaRTSedo ITS,foram tambémdesenvolvidos centrosdedifusãode tecnologiasocial e incentivos ao desenvolvimento de TS, de forma apossibilitar a replicação da TS por outros grupos sociais, deforma adaptada ao novo contexto sócio‐cultural.Algumas dasinstituiçõesrelacionadasaissosão:RTS,ITS,FundaçãoBancodoBrasil, Banco de Tecnologias Sociais, Centro Brasileiro deReferência em Tecnologia Social, Centro Avançado de
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TecnologiaSocialAyrtonSenna(RODRIGUES;BARBIERI,2007;OLIVEIRA,COSTA,DAGNINOEFARIA,2009).
TecnologiaSocialeoCampoCTS
Bourdieu(1997)afirmaqueaagendadaC&Tédefinidapor
quem detém poder na comunidade acadêmica. Essa afirmaçãosuscitaareflexãoarespeitodequemdetémocontroledaciência.Omercado?Osgestorespúblicos?A comunidade científica?Asociedadeemgeral?Nessesentido,Dagnino(2004)apontaqueaagenda de pesquisa da Universidade é definida pelos grandenomes, que são os que são reconhecidos, especialmente noexterior. Dessa forma, a pesquisa seria orientada para osinteressesexternos,enãoparaarealidadenacional.
Merthon (1968) postulou o chamado Efeito Matheus naciência. Segundo esse modelo, a comunidade científica éestratificada de forma que apenas aqueles que já possuemrenomeobtêmvantagens,sendoquepesquisadoresquenãotêmvínculos com esses “grandes nomes” dificilmente se tornarãoreconhecidos.Assim, analisando esse fato em conjunto com aspostulações de Dagnino (2004) e Bourdieu (1997), é possívelinferir que se trata de um círculo vicioso, em que oreconhecimentorecaisobreospesquisadoresqueestãono topodapirâmide,quedefinem a agendadepesquisanacional, eostemasqueessespesquisadorestratamestárelacionadoàagendade pesquisa internacional, que prioriza a tecnologiaconvencional.Dessa forma, pesquisas relacionadas a temáticasdeinteressediretodasociedadebrasileiraseriamdesvalorizadas,e esse pode ser um dos motivos do descrédito sofrido pelauniversidade na sociedade brasileira (DAGNINO, 2004), umavezqueelanãoatendeinteresses“nemparaaclassedominantenemparaaclassedominada”(DAGNINO,2004,p.21).
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Nesse contexto, a tecnologia social poderia se apresentarcomopossível alternativapara o concomitante atendimentodenecessidades e problemáticas sociais específicas e para odesenvolvimento de pesquisasmais focadas à realidade local,regional e nacional (DAGNINO; BRANDÃO;NOVAES, 2010).Segundo o FINEP (2008), a TS foi inserida recentemente nocampo da ciência, tecnologia e sociedade, por se tratar de umconceitorelativamenterecente.Eleserelacionaintimamentecomametodologiadepesquisa‐ação,umavezenfocandoaresoluçãode uma condição social adversa e específica, de forma que odebate pode ser expandido na direção das metodologias depesquisa atuais, numa interface que pode ser rica tanto aodesenvolvimento do conceito de TS quanto aos estudosmetodológicos.
Aindanosentidodeumapossível interfaceentreoconceitodeTSeosestudosemCiência,TecnologiaeSociedade,Oliveira(2005)criticaomodelodeciênciacomoalavancadoprogresso,ouseja,avisãodeterminista,seaproximandodavisãodateoriacrítica a respeito da ciência e da tecnologia. Retomando asdiretrizeseohistóricoapresentadosacima,épossívelrelacionarmais intimamenteaTSaomodeloda teoriacríticadaC&TqueFeenberg (2008) aborda,uma vez que ambas sepautam numanoçãodeC&Tnãoneutraecujoprogressodevesercontrolado,no sentido de que os pesquisadores, ao desenvolver umconhecimentoouumatecnologia,sãotambémresponsáveisporpensarsuaaplicaçãoe,comisso,seuspossíveisefeitospositivosounegativossobreasociedadeeomeio‐ambiente.França(2010)coloca ainda a necessidade de repensar o modelo dedesenvolvimento,pautadopeloaumentodaprodutividadeedoconsumo acima das condições do meio‐ambiente e do serhumano.Nesse sentido, o autor considera que a TS pode serdisseminadora de novos valores, por ter como um de seuscritériosasustentabilidadesócio‐ambiental.
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Para o ITS (2004), existe a necessidade de participaçãopública para o avanço da ciência, em consonância com osinteressesenecessidadeda sociedade.ATSé colocadaporelecomo facilitadora desse processo, uma vez que não apenaspermite a opinião pública a respeito do desenvolvimentocientífico‐tecnológico, mas também coloca ao alcance dospróprios interessados diretos (acometidos pelas situações‐problema) participarem da construção do conhecimento e datecnologiaquelheserãomaisadequados,tendovalorizadooseusaberempíricoetradicional.
SegundoVelho (2010),aspolíticasdeCiência,Tecnologia eInovação(CTI)noBrasilestãogradativaelentamentemudandoavisãopredominantede ciência, aomenos em alguns círculossociais, de uma visão determinista para uma visão de que eladevesersocialmentecontextualizada,localevoltadaainteressesnacionais. Essas características estão presentes nas diretrizesnacionais para CTI, embora na prática provavelmente não severifiqueumamudançapalpávelnavisãopredominante sobreC&T, especialmente dentro da academia. Nesse contexto, econsiderando todas as possíveis articulações já apresentadasentre TS e o campo CTS, a TS encontra campo fértil para sedesenvolver e contribuir com a expansão e consolidação docampoCTS,comoferramentapotencialmentetransformadoradofazercientíficoatual.
Conclusão
Este trabalho coloca‐se enquanto um esforço de reflexão
sobre a tecnologia social, suasdiretrizes,história e inserçãonocampo CTS. Porém ainda são necessários estudoscomplementares, de forma a clarear essas questões. Umadiscussãoquepoderia seraprofundada,porexemplo,seriasuarelaçãocomametodologiadepesquisa‐açãoparticipativa,cujos
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pressupostosmetodológicosemmuitoseassemelhamaosdaTS:construção de conhecimento para a solução de uma demandasocial específica,participaçãodogrupodiretamenteafetadonaconstruçãodesseconhecimento,adequaçãoacoletivospequenosemédios,entreoutros(THIOLLENT,2003).
ATSécriticadapordiversospensadores,comopaternalista,assistencialista e postuladora de necessidades sociais irreais(FINEP, 2008). Todas essas críticas poderiam ser respondidascomasseguintesinformações:
a)nãosetratadepaternalismoouassistencialismo,umavezque promove a aprendizagem do processo de construção deconhecimentoporpartedos“leigos”envolvidos,de formaqueseaUniversidadeououtrainstituiçãoenvolvidanoprocessoseretirar, a própria população será capaz de desenvolver suassoluções.
b) com relação à crítica que afirma que a TS postulanecessidades sociais irreais, ela é produzida a partir de umaproblemáticatrazidaexplicitamentepelapopulaçãodiretamenteatingidaporela,sendoqueessamesmapopulaçãoparticipanaprodução de conhecimento e formulação da tecnologia. Aproblemática não é identificada por um pesquisador externoàquelapopulaçãoeapresentadaaela,aposturaassumidapelopesquisadorédeescutadasdemandasemrelaçãodiretacomaspessoas atingidas. Assim, dificilmente a problemática tratadapelaTSéerroneamentepostulada(FINEP,2008).
Essascríticaspoderiamserconsideradas ingênuas,umavezanalisadas as diretrizes da TS. Outras questões, talvez maisrelevantes do que se a TS é ou não assistencialista oupaternalista, poderiam ser levantadas, tais como: Como serelacionao envolvimentodaTS com a formulaçãodepolíticaspúblicascoma liberdadedaciênciaemseu livre‐pensar?Comose dá a questão da propriedade intelectual da TS, de forma agarantirqueogrupoqueadesenvolveunãosejalesadodevidoà
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apropriaçãodesua tecnologiaporoutrempara finscomerciais,garantindo aomesmo tempo sua reaplicabilidade?Que outraspropostas de participação social na C&T e de transformaçãosocialpormeiodaC&T jáforam,estãosendo,oupoderiamserpropostas?
Relacionada a segunda questão, uma crítica talvez maisrelevante seja o fatodas iniciativasdeTS se inserirem emumcontextosócio‐políticomaisamploquevalorizaacompetiçãoeaTC,seráqueelapodeserconsideradaumaefetivasoluçãosocial,enquanto esses pequenos empreendimentos são mantidospequenos?Não estaria a TS contribuindo, com a participaçãosocial e a visão de não‐neutralidade da ciência, para amanutençãodos oprimidosno lugarde oprimidos, tal como ofaziaaTA?
Da mesma forma que a autogestão está imersa emcontradições, tal como o fato de que os empreendimentosautogestionários precisam competir com empreendimentoscapitalistasno contexto socialemquevivemos,aTS sofre comcontradições parecidas. Tais contradições não devem serconsideradas empecilhos ao desenvolvimento de possíveisestratégias de desenvolvimento dessa proposta, masoportunidades de aperfeiçoar um conceito e uma prática quecontinuam em constante construção e que possuem potencialtransformador, tanto dentro quanto fora da academia. Dessaforma, espera‐se que esta breve retomada histórico‐conceitual,ainda muito resumida, possa servir de provocação para quenovos estudos sejam feitosno sentidode criticar, aperfeiçoar epromover a tecnologia social enquanto parte do campo daciência,tecnologiaesociedade.
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Blogscomoespaçodiscursivo:paraalémdaperspectivatecnológica
GustavoGrandiniBastos
LucíliaMariaSousaRomãoIntrodução
Durante a história humana, tanto a ciência, como atecnologia, têmsidoobservadacomorelevantesestruturasparao desenvolvimento de nossa sociedade em diversos setores,permitindo a alteração dos rumos da economia, educação,política, saúde e do campo social. Nos dias atuais, essaconstataçãoéobservadacomgrandeforçapordiversosteóricos(SANTOS; MORTIMER, 2002). Uma infinidade de produçõescientíficasetecnológicasafetamasformasdeentenderquestõesde nossa sociedade, inclusive desestabilizando sentidosconsideradosimutáveisetidoscomoestabelecidos.Acreditamosqueocomputador,ainterneteosblogssãotrêsexemplosdessasproduçõesqueafetaramdeformaúnicaeprofundaasociedadecontemporânea, produzindo efeitos que configuram outrasrelaçõescomoespaço,tempoecomasformasdesubjetivação.
Acreditamos que os estudos de Ciência, Tecnologia eSociedade (doravanteCTS)podem colaborarefetivamenteparapensarmostaisquestões,jáquesuasinvestidasteóricasavançamem um desejo de refletir a sociedade afetada pela ciência etecnologia (doravanteC&T).Contribuindopara essadiscussão,mobilizamos a Análise do Discurso de tradição francesa parapensarosblogscomoumespaçodiscursivofecundoparapensara noção de sujeito, fugindo de postulações ingênuas que osespaçosdigitaissãoneutrosenãoseriamafetadosnemafetariamaconstituiçãodesujeitos.Consideramosqueosujeitodiscursivo
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inscreve‐se em regiões de dizer afetadas pela ciência e pelatecnologia,novascondiçõesdeproduçãodosdiscursoshoje.
OcampoCTS:algunsconceitosemcurso
OcampoCTSéobservadoporBazzo(2003)comoumespaço
deestudoepesquisaacadêmicaquetrabalhacomareflexãodosaspectossociaisdaciênciaedatecnologiaIssonoâmbitorelativoasnecessidadessociaisqueacabamcriadascomaspesquisasembusca de respostas realizadas por ambas, assim como no queafeta as consequências resultantesde seusprodutos e serviços.Destacamos que a apresentação de C&T como detentora dodesenvolvimento humano como a chave de pleno progresso,riqueza e bem estar social permearam o discurso técnico‐científicopormuitotempo,comoseambasfossemneutrasenãoafetadas por questões outras, como os fatores políticos eideológicosqueafetamosujeitocientista(BAZZO,2003).Comose a ciência e a tecnologia por si só assegurassem odesenvolvimento humano ou mesmo detivessem a únicaverdade existente: tal concepção é ingênua no nosso entender(AULER;DELIZOICOV,2001).
DeacordocomAulereBazzo(2001),noséculoXX,ocorreuaobservação de que o desenvolvimento científico, econômico etecnológico não acompanhava mais a ilusória equação quepostulavaqueapenasaevoluçãodaciênciaedatecnologiaeramsuficientesparaalcançarodesenvolvimentosocialeeconômicode todos. Corroborou para isso a observação de pontosrelevantes como a identificação de problemas ambientais edesenvolvimento armamentista, que ocorreram emdecorrênciado pretenso avanço daCiência e Tecnologia. Iniciamos, então,um período que permitiu uma melhor avaliação equestionamento acerca dos efeitos sociais da C&T e produziuefeitosnosentidoserefletirqueasaçõesgeradasnãosãosempre
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positivas, que é importante a participação democrática e énecessário pensar todas as consequências envolvidas nosprocessosdeC&T (AULER;BAZZO,2001).Relações simplistasque equacionam o desenvolvimento científico e o tecnológicolevando ao desenvolvimento econômico e finalmente ao bemestardetodososmembrosdasociedade(GONZÁLEZGARCÍAet al., 1996) passaram a ser colocadas em xeque, furando omodelodeprecisãomatemática quepassou a ser questionado,indagado. Vale registrar que tal movimento permitiu novosquestionamentosquepassarama inseriraC&Tdentrodeoutroenquadreeoutrasperspectivas.
Tal movimento de abrir‐se a novos contextos eivado decontradiçõeséagigantadocomosurgimentoda internet,criadaporVannevar Bush no âmbito da valorização da ciência e deseus avanços para as conquistasmilitares durante a SegundaGrande Guerra Mundial. No seu relatório Science: the EndlessFrontie,redigidoapedidodopresidenteestadunidenseFranklinRoosevelt, o criador da rede fundamenta que ela forneceriapontosdepossibilidadeparaaconsolidaçãodapaznomundo.Uma falsa noção de que todos os problemas poderiam serresolvidoscomacriaçãodeprodutosdeC&Tpassaasermuitodifundida, embasadaporumapretensaneutralidade e supostabuscadeprogressoidentificadocomosemprepositivo,ancoradoem decisões cientificas observadas como verdades cientificasinquestionáveis (AULER; BAZZO, 2001), como se essacompletudefossepossívelecerta.Apartirdeentão,observamosduas tendências de estudos de CTS no mundo, nos EstadosUnidos e na Europa. A perspectiva de estudos americanosobserva as influênciasque aC&T acabampor resultarnavidados sujeitos, considerando muito mais as consequênciasambientais e éticas resultantes das transformações acarretadaspelosprodutosgeradospela ciênciae tecnologia (LINSINGEN,2007;CACHAPUZ, et al., 2008). Já os estudos europeus têm o
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interessedeobservarcomoocontextosocialafetaasmudançascientificasetecnológicas(BAZZO,2003).Apósessascolocações,discutiremos traços da denominada Sociedade da Informaçãopara, posteriormente, adentrarmos o campo de discussão dainterneteseuhistóricoevolutivo.
ASociedadedaInformaçãovemsendonomeadadediversasformas,dentreasquaisdestacamosSociedadedoConhecimento,Sociedade da Educação, Sociedade de Informações(TAKAHASHI, 2000;MIRANDA, 2003) evem sendo objetodeestudodeuma sériedepesquisadoresnasmaisvariadas áreasdo conhecimento científico. Essas denominações colocam emmovimentoconseqüênciaseimpactoscausadospelastecnologiasde comunicação e informação (TIC) nas sociedadescontemporâneas, afetadas por espaços sociais e territoriaiscontrastantes entre si, com necessidades sociais e práticasculturaisigualmentedistintasentresi(SORJ,2003).Dessemodo,ASociedadedaInformação
[...] não é um modismo. Representa uma profunda mudança naorganizaçãodasociedadeedaeconomia,havendoquemaconsidereum novo paradigma técnico‐econômico. É um fenômeno global, comelevadopotencialtransformadordasatividadessociaiseeconômicas,uma vez que a estrutura e a dinâmica dessas atividadesinevitavelmente serão, em alguma medida, afetadas pela infra‐estrutura de informações disponível. É também acentuada suadimensão político‐econômica, decorrente da contribuição da infra‐estruturade informações para que as regiões sejammais oumenosatraentes em relação aos negócios e empreendimentos. Suaimportância assemelha‐se àdeumaboa estradade rodagemparaosucesso econômico das localidades. Tem ainda marcante dimensãosocial,emvirtudedoseuelevadopotencialdepromoveraintegração,ao reduzir as distâncias entre pessoas e aumentar o seu nível deinformação(TAKAHASHI,2000,p.5).
O termo “Sociedadeda Informação” já foimuito estudado,
inclusive com a busca por essa origem epistemológica, sendo
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incerta a sua origem, embora existam indícios de que seuaparecimento surgiu em documentos científicos de trabalhosprovenientesdosEstadosUnidose Japãodadécadade1960.Odesenvolvimento do termo ganha força na década seguinte,graças ao entendimento das transformações que passam aocorrer nomundo, discutindo seu papel e importância numasociedade que passava por grandes mudanças e avanços nocampo das comunicações e tecnologia. Nesses termos, aAmericanSociety for InformationScience (ASIS) foiaprimeiraque atuou na difusão e trabalho do termo na década de 1970através da Annual Review of Information Science andTechnology (ARIST) (FREITAS, 2002), de talmaneira que esseconceitoseformalizalogoapósaSegundaGuerraMundialcomoadventodasinovaçõestecnológicas(MATTELART,2002).
Crescenosanosdadécadade1980a consciênciaacercadaimportânciasocialdainformação,suaconsistênciaenecessidadenanovaconstituiçãomundial,destaca‐seaindaacomplexidadedadiscussãosobreomododeasTICsadquiriremespaçoelugar,vistoque
essastecnologiaspermitemacoordenaçãodetarefaseaadministraçãodacomplexidade. Issoresultanumacombinaçãosemprecedentesdeflexibilidade e desempenho de tarefa, de tomada de decisãocoordenadaeexecuçãodescentralizada,deexpressãoindividualizadae comunicação global, horizontal, que fornece uma formaorganizacionalsuperiorparaaaçãohumana(CASTELLS,2003a,p.8).
Com a consolidaçãodo termoSociedadeda Informação, as
TICspermitiramodesenvolvimentodeumasériedetecnologiaseamelhoriadedacirculaçãodedados,sendoaredeeletrônicaoponto alto desse processo. Com o desenvolvimento da rede ecomaampliaçãodesuavelocidadeecapacidadedecompactardados, inicia‐seum novomomento, no qual a internet está aoladodaevoluçãodaengenhariaeletrônica,desenvolvimentodafibra óptica, avanço do homem no espaço, aprimoramento do
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conhecimento acerca do mapeamento genético e de umainfinidade de conquistas possíveis e auxiliadas graças as TICs(GUERREIRO,2006).
O vertiginoso desenvolvimento das tecnologias de informação ecomunicações tem sidoumpoderoso instrumentoparaa rotinizaçãoreorganização e automatização do trabalho intelectual.O fenômenotecnológico tem operado como liberador de energia cognitiva, queseránecessariamente aplicadana áreade conhecimentode cada serhumano,nãoimportaseuníveldeeducação(MIRANDA,2003,p.62).
As inovações possibilitadas pela ciência e tecnologia
facilitaram o acesso e transmissão de informações nacontemporaneidadenumnívelnuncaantespensado,eaInternetpermitiu uma infra‐estrutura de circulação de grandequantidade evariedadede informações (BRANSKY, 2004),porisso,elaapresenta característicasúnicase seudesenvolvimentoconsistiu em uma “aventura humana extraordinária”(CASTELLS, 2003a, p. 13). A rede é apresentada por Sawaya(1999) de uma forma muito interessante, já que marca suaexistênciaemumaatuaçãodeformadescentralizada,oferecendouma série de serviços e recursos, sendo considerado umfundamental e poderoso instrumento de comunicação etecnologia no mundo contemporâneo, sendo que é possívelexistir através das conexões via telefone (LÉON, 2004). Taldispositivo funciona interligandomaisdeuma rede local,paratanto, é necessário um roteador nesse processo de trocas eintercâmbios, permitindo assim um fluxo comunicacional einformacionaleficiente,permitindooacessoarecursoslocaisouremotosporpartedossujeitos‐navegadores.
O histórico de desenvolvimento da Internet teve umincentivomuitograndevindodomedoprovenientedosanosdetensãodaGuerraFria,foidevidoaoconstantereceiodosEstadosUnidosdeperderacorridaarmamentistaparaaUniãoSoviética,
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que motivou a liberação de uma grande quantia eminvestimentos por parte do Departamento de Defesa Norte‐Americano e executado pela ARPA, que visava odesenvolvimentodeumsistemadecomunicaçãoeletrônicaentreosCentrosdeConhecimentoePesquisadaquelepaísde formaque pudesse ocorrer o alerta caso ocorresse algum ataque porparte dos soviéticos oferecesse perigo para os americanos. AdenominadaGuerraFriapermitiuaexistênciade
umcontextoemquehaviaforteapoiopopularegovernamentalparaoinvestimentoemciênciaetecnologiadeponta,particularmentedepoisqueodesafiodoprogramaespacialsoviéticotornou‐seumaameaçaàsegurançanacionaldosEUA(CASTELLS,2003a,p.22).
Ainda marcando algumas passagens importantes para a
construçãoda rede eletrônica,no anode 1961, foipublicado oprimeiro artigo sobre comutação de pacotes de autoria deLeonard Kleinrock. A Arpanet era um pequeno projetodesenvolvidoemumdosdepartamentosdaARPA,oInformationProcessing Techniques Office (IPTO), fundado em 1962, tendocomo objetivo o incentivo a pesquisa na área de computaçãointerativa. Na década seguinte, no ano de 1971 o primeiroprograma de e‐mail foi desenvolvido por Ray Tomlinson;exatamente em 1972 houve uma Conferência emWashingtonque realizou‐se a primeira demonstração pública emuito bemsucedidadaArpanet,alémdapráticadeuma intensapesquisaquefoirealizadaconcebendocomoumdosresultadosoTCP/IP,um conjunto de protocolos, na década seguinte uma série deoutrasinstituiçõesdeensinosuperiorpassaramaintegrá‐la.Em1973, Robert Kahn e Vint Cerf lançaram um artigo comdelineações acerca da Internet, ambos eram membros deinstitutos respeitáveis, o primeiro da ARPA e o segundovinculado da Universidade de Standford (CASTELLS, 2003b;NOVAES;GREGORES,2007).Em1980,é inscritopelaprimeira
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vezo termo Internet e, em 1985,que tivemospor iniciativadaNational Science Foundation (NSF) a interligação doscomputadores de seus centros de pesquisa e que em 1986 foiconectadaaArpanet,essaredelocaldaNSFrecebeuonomedeNational Science Foundation Network (NSFnet) e pode serconsiderada a espinha dorsal da internet que conhecemosatualmente,quando criada faziaa conexãoentre cincograndessupercomputadores, a conexão desses computadores a essasduas espinhasdorsais, backbones,passou a ser conhecido comoInternet(CASTELLS,2003a),quatroanosdepois,nocaso1990,aInternet já era utilizada por mais de cinquenta milhões depessoas, oitenta milhões em 1996 e em 1999 por cento ecinquenta milhões de pessoas (BARBOSA, 2005; NOVAES;GREGORES, 2007) a maioria esmagadora vivia em paísesdesenvolvidos.
AWorldWideWeb (WWW) foi criadaporTimBerners‐Lee,um consultor de informática e físico que quando desenvolveuessaferramentaatuavaprofissionalmentenolaboratóriodefísicada áreadeAltasEnergiasdoEuropeanOrganization forNuclearResearch(CERN),situadoemGenebra,Suíça.OprojetodaWorldWideWebsurgiudevidoanecessidadedeexistirumaferramentaquepermitissea realizaçãodepesquisas colaborativas entreosfísicosdomundotodo,jáqueoCERNéumimportantepólodeestudos domundo e o caráter colaborativo da área de físicaexigia tal funçãoauxiliarvisandoodesenvolvimentodaciênciano mundo. O projeto apresentado pelo pesquisador tinha oseguinte títuloWorldWideWeb:Proposal foraHyperTextProject(NOVAES;GREGORES,2007).AimportânciadaWorldWideWebpara o desenvolvimento e aprimoramento da Internet égigantescovistoque“tornava‐sepossívelgerarumconjuntodeinformaçãocujoconteúdoenvolvianãosópalavrasmastambémimagens, sons emovimentos” (NOVAES;GREGORES, 2007,p.24), Berners‐Lee criou ainda uma série de outras ferramentas,
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tais comooHyperTextTransferProtocol (HTTP) eoHyperTextMarkupLanguage(HTML).Essagigantescaredeéligadaporumainfinidadedeapetrechostecnológicos indodecabostelefônicos,fibraóptica,rádioesatélite,avelocidadedasoperaçõesdependemuito de que sistema é usado para essa ligação, por issovariando bastante. Devido à existência de uma infinidade decomputadoresesistemasdevelocidadedistintafazendousodaInternet ocorre por isso um processo que visa transmitir osdados todosnamesmavelocidade,oprotocolo temonomedeTransportControlProtocol/InternetProtocol(TCP/IP).
A rede eletrônica comporta uma discursividade quemuitonos interessa,oblog,definidoporSantaella(2004)comoo lugarque é aberto quando o navegador conecta‐se à rede eletrônicaatravésdaInternet,umespaçoquepermiteefetivasexploraçõesporpartedequempuderinscrever‐seemsuasredes.Édoinglêsaorigemdapalavraciberespaço,tendosidousadapelaprimeiravezpeloescritorestadunidense‐canadenseWilliamGibson,nosromances Neuromancer (1984) e Count Zero (1987), no qualpostulava esse espaço como um local de encontros,desencontros, trocas edisputas (BENEDIKT, 2002;BELL et al.,2004; FERNANDES, 2000). Ele escapava de definiçõesmeramentetécnicasparatratardaredecomoumlugaremqueasociedadeeo sujeitoeram realmente relevantes,Lévy (2007,p.104):
Existenomundo,hoje,um fervilhardecorrentes literárias,musicais,artísticas,quandonãopolíticas,quefalamemnomedaʺciberculturaʺ.Ociberespaçodesignamenososnovossuportesdeinformaçãodoqueosmodos originaisde criação,de navegação no conhecimento ederelaçãosocialporelespropiciado.
O ciberespaço é compreendido assim como ʺcamaleônico,
elástico, ubíquo e irreversívelʺ (LEÃO, 2004, p. 9), englobandopessoas, redes de computadores e sistemas, em uma ʺinter‐
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relaçãohomens‐documentos‐máquinasʺ.Existeumaobservaçãodo ciberespaço como um universo que existe em ‘paralelo’ aomundo ‘físico’, com uma nova noção de velocidade emovimento,quevemganhando forçaemnívelglobal,semquehajaumaideiadecentralização(SANTAELLA,2004),abrigandoopostos namesma teia, numa rede polissêmica de discursos esujeitos.Osujeitonãopossuiumaredeseguraemseucaminharpelas trilhas ofertadas pelo ciberespaço, inexiste bússola queassegure o caminho a ser tomado entre conexões de links epalavras,osfurosquemargeiamaredeexistemenãopermitemtaldesejodeestabelecimentocartográfico.Essaideiadefluidezecaminhos movediços que caracterizam a rede nos remete aoescrito“Olivrodeareia”doargentinoJorgeLuisBorges,vistoqueolivroearedeapresentamefeitosdemudança,dedeslocamentoem uma trama aparentemente infinita, marcada pelapossibilidade de inexistir o que antes estava ali, presente, aosolhos do leitor, o que comparece como condição para que osarquivos eletrônicos possam esvair‐se como fumaça e nãopossammaisserencontrados.No livrodeareiaounaspáginasde silícioqueconstituema redea instabilidadeeanão rigidezmarcamoqueéenunciado(ROMÃO,2005).
Comaredeeletrônica,hábitossealteraramenovasmaneirasdecomunicaçãoedeprodução/circulaçãodesentidostornaram‐sepossíveis, incluindonovaspossibilidadesdeescritae leitura,em espaços discursivos como os blogs e outras páginaseletrônicasdiversas,taiscomoasdemuseuseletrônicos,sitesdecompras, registros pessoais, listas de discussão etc. Temos,nesses espaços, um ambiente interativo, permeado pelossentidos que lhe atribuem a condição de um lugar de livreenunciação, em que se tem a ilusão de tudo poder dizer econtestar, sem interrupções ou mesmo silenciamentos. (DIAS,2005).
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Oblogsitua‐senesseâmbito,trata‐sedeumaabreviaturadeWeblog,junçãodaspalavrasweb(páginadaInternet)elog(diáriode bordo) (SCHITTINE, 2004; KOMESU, 2005; SOUZA, 2009),quesepopularizoumuitonociberespaço,sendocompreendidocomoumdosgênerosqueemergiramcomasnovastecnologiasde informação e comunicação (MARCHUSCHI, 2004). O blogenquadra‐secomoumprodutodachamadaWeb2.0,quebuscouampliar as maneiras possíveis de disponibilizar e produzirinformações (PRIMO, 2006). É compreendido como umaferramenta que permite a publicação de pequenos blocos detextoque seapresentam,geralmente,organizados emarquivoscronológicos,sendodefácilutilização,devidoapoucaexigênciadeconhecimentostécnicosde informáticaparasuaestruturaçãoe permanente ‘alimentação’, atualização de postagens. Nele épossível disponibilizar, além de textos, uma série de recursoscomo imagens, sons, vídeos, etc.Destacamos que, atualmente,váriosautores trabalham comuma sériede tipologiasde blogs,como, por exemplo, os empresariais, jornalísticos, políticos,educacionais, científicos, etc. Em nosso texto, dedicamo‐nos aanalisar,inicialmente,osblogspessoais.
DeacordocomAmaral,RecueroeMontardo(2009),otermoweblogfoiusadopelaprimeiravezem1997porJohnBargerparatratar de sites que realizavam a difusão de links queconsideravam interessantes para um determinado grupo, porconta dessa semelhança, muitos autores “como David Winerconsiderem como o primeiro weblog o primeiro site da web,mantido por Tim Berners‐Lee, no CERN. O site tinha comofunçãoapontar todososnovossitesqueeramcolocadosnoar”(AMARAL, RECUERO,MONTARDO, 2009, p. 28).Altamentepopularnomundo,onãoreclamagrandesconhecimentosacercada linguagem especializada da informática para a suamontagem, construção epostagem, alémda rápida atualizaçãopublicação domaterial que é postado (AMARAL, RECUERO,
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MONTARDO, 2009), abrindo espaço para a relação interativacomoutrosnavegadores.
OTechnoratiécompreendidocomoumsistemaquerealizaabusca e indexação de blogs e outros conteúdos criados eadministrados por sujeitos navegadores do ciberespaço, assimsãorastreadosemonitoradoslinks,comentáriosepromovendoaapresentaçãodastemáticasmaispopularesedosprincipaisblogsda internet (SILVA, 2007). De acordo com o último relatório,publicadoem2010,nomeadoStateoftheBlogospheregrandepartedos blogueiros demonstraram que tem conseguido estabelecernovasamizadese relaçõescompessoasquenuncaconhecerampessoalmente (63%).Essecaráterdebuscaroutros sujeitos,quetenham proximidades ou concordâncias com suas idéias,marcama internet.Foramentrevistados7200blogueiros,dessesentrevistados51%utilizamosblogscomoespaçosdeexposiçãodesuasideias,ouseja,comodiárioseletrônicos(TECHNORATI,2010).DeacordocomTapscotteWilliams(2008,p.19),milhõesdepessoaspartilham informaçõeserealizampostagensquesãoatualizadas a cada segundo e interessam a uma infinidade desujeitos inseridos nesse espaço. O que permite concluir quemuitos blogs recebem um número de leitores e navegadoresequivalente a grandes espaços tradicionais de circulação denotíciaseinformações.
Observamos a exposição de um mosaico de várias vozesem*ndadasdemodo contínuo a fazer (des)enrolar um imensopergaminho eletrônico onde estãomarcadas a voz do sujeito‐blogger e as outras tantas vozes de sujeitos‐navegadores. Asmarcas do privado passam a funcionar discursivamente comoalgo tecidono âmbitoda coletividade,ou seja,dopúblicoqueacessa o blog (SCHITTINE, 2004). Temos, assim, pegadasdiversasdospassosdesujeitos implicadoseafetadospelotemaouautordoblog,pegadasestasquenosremetemaoconceitodeumdiscursopermanentementeemconstruçãosemoutrofechoa
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não ser a postagem de cada sujeito. O efeito de fim éescamoteado e colocado empausa, suspendendo o instantedeacabamentoecriandoa ilusãodeumgerúndiocontínuo,queésustentada pelomovimento de sujeitos em trânsito (ROMÃO,2005).
Compreendemosoblogcomoumdiárioàsavessas,noqualosujeitonãoescrevepara siemum cadernoguardadoem lugarsecreto,masparaumoutro,quelheé,noentanto,desconhecido.Marcamosque,de acordo comKomesu (2005),os trêsmaioressites de construção de blogs brasileiros atribuem ao blog adefiniçãodediárioeletrônico,oquemarcaaressonânciadequeainda é comum o uso desse espaço discursivo como diárioeletrônico, como discursividade marcada pela produção ecirculação de discursos sobre si e sobre omundo a partir doestabelecimentoderelaçõesnosmaisvariadosníveis,doafetivoaoespaçodeconfissão.
Umolhardiscursivosobreblogs
AAnálise doDiscurso dematriz francesa (doravanteAD)
surgiuemmeadosdosanos60eémarcadaporfundamentar‐seem três áreasdo conhecimento: aLinguística, oMarxismo e aPsicanálise;deacordo comOrlandi (2005),a teoria surge comofruto de um contexto marcado por rupturas, assim “com oprogresso da linguística, era possível não mais considerar osentidoapenas como conteúdo. IstopermitiaàADnãovisaroque o texto quer dizer (posição tradicional da análise deconteúdo face a um texto),mas como um texto funciona”. OdiscursopodeserentendidocomoumdospilaresdesustentaçãodaAnálisedoDiscursodematriz francesa,que como colocadoporFerreira(1998,p.203)podeserentendidocomo
[...]umobjeto teóriconaAD. Isto significaque ele é entendido, emprimeiro lugar, como um lugarde reflexão. Pêcheuxdefine‐o como
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‘efeitode sentidoentre interlocutores’.Maisdoqueum resultado,odiscurso vai definir um processo de significação no qual estãopresentes a língua e a história, em usamaterialidade, e o sujeito,devidamenteinterpeladospelaideologia.
Para aAD anoçãodediscurso temumdistanciamentoda
noçãode falaedaestruturaclássicapropostapeloesquemadecomunicação, que é constituída da seguintemaneira: emissor(quefalabaseando‐seemalgumcódigo)ereceptor(quecaptaamensagemeacabapordecodificá‐la).Poressasrazõesodiscursose coloca como o “objeto teórico da AD (objeto histórico‐ideológico), que se produz socialmente através de suamaterialidade específica (a língua); prática social cujaregularidade só pode ser apreendida a partir da análise dosprocessos de sua produção, não de seus produtos”(UNIVERSIDADEFEDERALDORIOGRANDEDOSUL,2010).Assim,nãoexisteumsentidopré‐existenteefixado(ORLANDI,1997),demodoqueanoçãodeevidênciaéilusória,poisdurantealeitura,ossentidosescapame,nãoraro,caminhamparaoutrasdireções,antesnãopensadaspelosujeitoenunciador.
Ao inscrever‐sena linguagem,o sujeitoassume‐se emumaposição,sempreprovisóriadadapeloquelheépossíveldizernaposiçãoemqueestá;assim,osujeitonãoécontrolável,tampoucopode ser categorizado a partir de parâmetros sociológicos oupsicológicos, é posição no discurso. A Análise do Discursoconsidera que o sujeito assume uma posição dentre outras,podendomovimentar‐se, provocando um rompimento com ossentidosdominantes,conseguindoassimrompe‐losnovamente,sustentando‐se para depois rompê‐los novamente, enfim, osujeitomovimenta‐se em processo de errâncias, visto que elefunciona pelo inconsciente e pela ideologia, não sendo assim,dessa forma, a fonte transparente de seu dizer. O sujeito é aposição social e ideológica que ocupa em um determinadomomento da história e podendo vir a não ocupar a mesma
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posição em outromomento.O processo discursivo, que acabaporapresentarsentidoscomoclarosparaosujeito,nãotemumaescolha aleatória,mas é fruto da evidência ideológica daquiloqueéaceitoeimpostocomonaturalpelogrupodominante,que,por suavez,estáem constante tensão comogrupodominado,que deseja aquela posição de poder. Isso tem relaçãofundamental coma ideologia,entendidanão comoum sistemaque oculta um ponto de vista, mas como ponto de relaçãoconstitutiva entre sujeito e condições sócio‐históricas,demodoqueumdizerfaçasentidoparaosujeito.
Assim,sãoasevidênciasquepermitemqueosujeitoconsigaolhararealidadeatravésdesistemasdesignificação,permitindoque seu dizer tenha relação com o contexto sócio‐histórico noqualestáinserido(ORLANDI,1997).Sobreaideologia,podemosconsiderar tambémqueela“seproduz justamentenopontodeencontro da materialidade da língua com a materialidade dahistória” (ORLANDI,op.cit.,p.20).Entendemos,nosdizeres,ainjunção ideológica, isto é, o mecanismo que “torna possíveltantoànaturalizaçãodealgunssentidos,pelaforçadarepetição,quanto os seusdeslocamentos, rupturas, atravésdo jogo tensodasrelaçõesideológicasdepoderentreossujeitose,também,dahistória” (FERRAREZI,2007,p.18).Aevidênciadeumsentidodadocomoindiscutíveleclaropelaideologiaéoquepermiteaosujeito enunciar, produzindo retornos e deslocamentos,deslocando‐sepela línguaapartirderepetiçõeseregularidadesem enunciados produzidos hoje renegociam sentidos já‐postosemfuncionamentoemoutroscontextos.
AmemóriaparaaADnãoéaquelareferenteàs lembrançasquepossuimos,masumamemóriaqueossujeitosseencontraminscritos,assimécondiçãodalinguagemjáqueosujeitosempresemoveemdizeresalheios,re‐significando‐ose inscrevendo‐seemlugaresjáditos,promovendomanutençõesoudeslocamentosnasformaçõesdiscursivas.Entendemos,assim,oefeitode‘fiodo
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discurso’dosujeitoqueseaninhaemumaformulaçãodiscursivamobilizando“oecodeantigaspalavras”comocantaotrovador.OsmovimentosobservadosnociberespaçopossibilitamgrandesincursõesdaADquepode trabalharcoma reflexãodecomoosujeitoéafetadopelosdizeresaliexistentesenosquaissefiliaourompe sentidos emmovimento, assim como rompe o que seencontra posto como permanente.Como dito anteriormente, arede eletrônica visa a transmissãode uma concepçãode lugarsemfurosequetodospodemacessar,masarealidadeéoutra,jáquenemtodostemacessoaelaeofurodiscursivoéinevitável.
Para investigar como se dá a constituição de sujeitos esentidos nos blogs e na Internet, apresentamos uma análisediscursivadeumrecortedo texto“TornadosdaMinhaVida”eum comentário obtido do blog “Confissões de um Urso” epostado no dia 3 de janeiro de 2011. No heterogêneo espaçodiscursivo do blog, o constante uso da primeira pessoa dodiscursonessesdiárioscontemporâneoséalgorecorrente,sendocostumeiraaescritadecarátercoloquialeconfessional,marcadapela oralidade epelo questionamentode si edo(s) outro(s).Osujeito é capturado pela ilusão de ser o dono do seu dizer epoder enunciar o que desejar (PÊCHEUX, 1997), instalando‐secomo livre nas páginas de seu diário eletrônico. O sujeitoblogueiro possui condições de interditar, apagar, censurarcomentáriospostadospelosleitoresdoblogequeeventualmentenãoconcordeoqueinstalaumaregiãodedisputanesseespaço.Noprimeirorecorte:
Fonte: CONFISSÕES DE UM JOVEM URSO, 3 jan. 2011. Disponível em:<http://jovemurso.wordpress.com/tag/tornados‐2/>.Acessoem:20jun.2011.
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Flagramos sentidos que rompem com o dominante, aoobservarmosoespantodosujeitobloggercomoquestionamentofeito por uma outra voz sobre o processo de exposição nainternet, anotando a desfronteirização do privado através daexposiçãoemumespaçopúblico.OOutroémaisqueapenasoleitor,ele inter‐fereno textododonodoblog, instalandoaliumespaçopolêmicodedisputaporregiõesdedizer,algodaordemda confrontação tensa de reconhecer a exposição pública dedetalhes íntimos em contraponto comoque estánaturalizadocomo evidente, como prática comum atualmente.O blogueiropromoveumarupturanosentidodequeacirculaçãodedadosnaredeélivre,questionandoadifusãodoqueseescrevenoon‐line, fazendo des‐crer o poder de alcance que sua escritarealmente teria, visto que ele não sabe exatamente quantossujeitosvãoacessaraquelearquivodiscursivo,opinarouapenasler.Emergeosentidodequesepodedizeralipostoqueélugarseguroesecreto,disponibilizaroquesedesejarali,retomandoamemóriadiscursivadosantigosdiáriosqueguardavamsegredosequeeraacessadosomenteporseudono.Temosacirculaçãodesentidosquepostulamo espaço eletrônico comoguardadordesegredose intimidades,quenãoserãoacessados,vasculhadoseremexidos por outros sujeitos.No segundo recorte, temos umcomentário postado por um leitor domesmo blog, no qual sereforçaaparáfrasediscursiva.
Fonte: CONFISSÕES DE UM JOVEM URSO, 3 jan. 2011. Disponível em:<http://jovemurso.wordpress.com/tag/tornados‐2/>.Acessoem:20jun.2011.
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A intimidadeeoefeitoafetivoemrelaçãoaodiárionaredesão flagradosnamarcaquerido,naqual retomamosos sentidosde proximidade e confidência. No comentário, o sujeito‐leitorFoxxretomasentidosqueatestamquequemnãopossuiumblogse espanta com o processo de desvelamento de segredos noespaçoali.Osopostosunem‐senoblog,vistoqueaexposiçãoeosegredo caminham lado a lado, já que o sujeito blogueiromantem sua identidade em segredo, ocupando outra posiçãodiscursivana rede,noqual teceuma infinidadede relatosquesão de sua intimidade, mas ao mesmo tempo matem‐seresguardado,poisocupanaredeoutraidentidade,possibilitadapor essa tecnologia que afeta sua vida e possibilita uma novaformadeintimidade.Ossegredossãoabertosatodos,namaioriadas vezes estranhos, que acabam por acessar e filiar‐se àspalavrasexpostasemdadodiárioeblog,estabelecendorelaçõesepermitindo uma intimidade entre sujeitos que muitas vezesnuncaseencontraramnaditavidareal,foradoespaçovirtual.Consideraçõesfinais
Com os avanços científicos e tecnológicos, impactos
profundos puderam ser observados em nossa sociedadecontemporânea, tambémnomeadadesociedadeda informação.As relações alteraram‐se, novos padrões e possibilidadesacabaram possíveis com tais desenvolvimentos, entre elestivemos a Internet e as ferramentas interacionaispossibilitadaspor ela, como os blogsquepermitiramuma inscriçãode vozesoutrasnaredeeletrônicaecom issoachancedeobservaçãodesentidosoutros
Odiárioencontranociberespaçoumespaçodeinscrição,masque é outra ordem, pois sai de cena do campo do segredoreservado e guardado permanente, entrando na esfera deexposiçãodaintimidadenocéuabertodarede.Aimportânciade
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revelarparaomundoosdetalhesmaisíntimos,deobservaroqueosoutrosachamdetudoissoedenãotercertezadaaceitaçãooumesmodadurabilidadedoblogsãomuitosfatoresqueafetamsuaexistênciaeainjunçãoideológicadedizernesselugar.Permanecea busca por expressar, pela escrita, sentimentos e questõestomadas como interessantes e fundamentais não apenas para osujeito,mastambémparaumpúblicoávidodeleitoresquebuscaaliumespaçodefiliaçãoedeumapretensacerteza,mesmoqueoleitornãosaibaquemrealmenteescreveas linhasalipostadas, jáquemuitasvezes,comonocasodoblogaquiestudado,nãosesabea real identidade do sujeito‐autor. Aliás isso parece o menosimportante, o que favorece a (suposta) liberdade que afeta obloggeremsuasexposiçõesaoolhardooutro.
Vimos que o sujeito‐ navegador da Internet enreda‐se empalavrasquenão são suas, entremeando‐se avoláteis redesdesentidos e de sujeitos que produzem um efeito deheterogeneidade e incompletude. Historicamente, oshom*ossexuais enfrentam uma série de preconceitos (SOARES,2006), observamos que buscar um espaço de filiação e deinscriçãodasubjetividadedosgaysnaredemantémrelaçãocoma inscrição de outros discursos e sentidos não estabilizados,abrindo espaços de ruptura e deslizamento nos pergaminhosdigitais existentes. São novas formas de dizer e simbolizar omundoqueafetamosujeitocontemporâneoprofundamente.ReferênciasAMARAL, Adriana; MONTARDO, Sandra; RECUERO, Raquel. Blogs:mapeando um objeto. In: ______ (Org.). Blogs.com: estudos sobre blogs ecomunicação.SãoPaulo:MomentoEditorial,2009.p.27‐54.
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OplanejamentosustentáveldoturismoesuainterfacecomocampoCTS
HeltonGonçalves
Introdução
Oturismoseconstituiemumimportantefenômenosocial,degrande atratividade econômica, passível de proporcionar umasérie de benefícios às localidades onde se desenvolve, como:interação social, geração de divisas e empregos,desenvolvimentosocioeconômico,entreoutros.
No início do século XXI, o turismo surge como uma forçasocial, cultural e econômica capaz demovimentar centenas demilhões de pessoas pelo mundo todo. É uma atividaderelativamentenova,compreendidacomofenômenodemassaháapenasmeioséculo(ANSARAH,2000).
O turismoestádifundidonomundo inteiro,poisapartirdoprocesso de globalização das economias e da cultura, assimcomo, amelhora nosmeios de comunicação e transporte, sãopoucososlugaresquenãosãoacessíveisaosturistas(BARRETO,2004).
NoBrasil,observam‐seesforçosnosentidode implantarumconjunto de políticas públicas com o objetivo de fomentar aatividade turísticanopaís, tantoporpartedogoverno federal,quantonasesferasestaduaisemunicipais,comoargumentodeque o turismo pode ajudar a alavancar o desenvolvimentoeconômicoemdiversasregiõesbrasileiras(SILVEIRA,2002).
Contudo, não é viável fomentar o desenvolvimento doturismo sem planejamento. Os impactos socioculturais eambientaisprovenientesdaatividadeturísticamuitasvezesnãosãolevadosemcontapelosarticuladoresdoturismo.
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Assim,quandosurgiuoturismodemassa,caracterizadopelodeslocamentoepelapermanêncianosnúcleosreceptoresdeumgrande número de turistas, acreditava‐se que os recursosnaturais eram inesgotáveis e por isso, estabelecia‐se poucasrestriçõesaoseuuso.Porém,o tempoeonúmeroexcessivode turistasem locais
específicosdemonstraramqueoturismoagrideascaracterísticaseaoriginalidadedasatrações.Aconstataçãodequeosrecursosturísticos são finitos e de que seu uso deve ser monitoradolevaramespecialistaseosresponsáveispelodesenvolvimentodaatividade, considerar a necessidade de planejamento pararegiõescompotencialidadeturística(RUSHMANN,1997).
Oplanejamentodoturismopressupõeocuidadonãosomentecomomeioambientenatural,mastambémcomsustentabilidadesocial,políticaeeconômica,fatoresestesquenãopossuemfácilconciliação(BARRETO,2005).
Oturismo,porsuavez,trata‐sedeumcampocientíficomultie interdisciplinar que abrange diversas áreasdo conhecimentocomo a biologia, antropologia, engenharia, arquitetura,sociologia, direito, comunicação, história, entre outros. Assim,esses campos do saber podem ajudar na elaboração doplanejamentosustentáveldoturismo.
A intersecção disciplinar que origina o campo científico doturismo e que também dialoga tanto com as ciências exatasquanto as ciênciashumanas se refere aumadas temáticasdosestudossociaisdaciênciaetecnologia(BLOOR,2010).
A proposta deste trabalho é analisar como a ciência podeauxiliar no planejamento sustentáveldo turismo pormeiodasmaisdiferentesáreasdoconhecimento.Osabercientíficoajudaodesenvolvimentodaatividade turística, tornando‐a sustentável,minimizando seus impactos negativos emaximizando os seusbenefícios.
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O turismo feito sem planejamento pode acarretar impactossociais, culturais eambientaisparaas comunidades receptoras.Oplanejamentoturísticovaiaoencontrodospreceitosdocampoda Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS), ao promover umturismo sustentável, com responsabilidade socioambiental,visandoobem‐estardasociedade.Ciência,tecnologiaeoplanejamentosustentáveldoturismo
A ciência, uma criação do ser humano, faz parte da suacultura e tem como um dos seus compromissos auxiliar nasolução dos problemas enfrentados pela sociedade no seucotidiano.DeacordocomSalleseKovaliczn(2007),aciêncianãodeve caminhar sozinha, isto é, tem que evoluir ao lado dasociedade por meio de uma postura holística, contemplandoaspectoshistóricos,éticos,ambientais,políticosesociais.
No século XX, o desenvolvimento tecnológico e científicotrouxe inúmerosprogressos,porém,havia anecessidadede sefazer uma reflexão crítica sobre a C&T, visando umaaproximação desses dois conceitos com as questões sociais.Apartirdeentão,osestudossobreCiência,TecnologiaeSociedade(CTS) estabelecem que aC&T precisam contribuir demaneiraefetivaparabem‐estarsociale iraoencontrodasdemandasdasociedade,
A Ciência e a Tecnologia evoluíram eficazmente a partir dasegundametade do século XX, fruto, entre outras coisas, daGuerra Fria ocorrida entre os Estados Unidos e a UniãoSoviética, o que contribuiu para o surgimento de um novocampo de investigação científica associado ao domínio daSociologiadenominadoCiência,TecnologiaeSociedade(CTS),amplo movimento de repercussão mundial que veminfluenciandoametodologiadoensinodeciênciashámaisdetrês décadas. A sua finalidade maior é instruir o cidadão,
146
visandoasuaparticipaçãoefetivaemassuntoscorrelacionadosà ciência e à tecnologia que contribuam efetivamente para apromoçãodobem‐estarsocial(CRUZetal.,2005,p.17).
Bazzo, Linsingen e Pereira (2000, p.04), destacam que as
pesquisas em CTS visam entender os aspectos sociais dofenômeno científico‐tecnológico, tanto nos assuntos queressaltem os condicionantes sociais da tecnologia, quanto nastemáticasrelacionadasaomeio‐ambiente,
Esse campo de estudo trata também de favorecer odesenvolvimento e a consolidação de atitudes e práticasigualitárias com relação às questões de importância socialrelacionadas com a inovação tecnológica ou a intervençãoambiental. Propicia o compromisso a respeito da integraçãodas mulheres e minorias, assim como o estímulo para umdesenvolvimento socioeconômico respeitoso com o meioambienteeequitativocomrelaçãoàsfuturasgerações.
As preocupações do campo CTS em proporcionar odesenvolvimento econômico da sociedade de forma que serespeite às questões socioambientais também se referem aospropósitosdoplanejamentosustentáveldoturismo.
A Organização Mundial de Turismo (2001, p.36) defineturismo como “as atividades que as pessoas realizam durantesuas viagens e estadas em lugares diferentes ao seu entornohabitual, por um período consecutivo inferior a um ano, comfinalidadedelazer,negóciosououtros”.
ParaTrigo(2009,p.11),oturismointegraumuniversomaior,denominado lazer. Compreendem‐se por lazer todas asatividadesdesenvolvidas forado sistemaprodutivo (trabalho),das obrigações sociais, religiosas e familiares. “O lazer é umanecessidadeeumdireito tão legítimodo serhumanoquantoaeducação,asaúde,otransporteousegurança”.
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O ser humano é um animal extremamente especial ecomplexo, que não se contenta com omínimo indispensável asuasobrevivência.Suavidaenvolveaspectosmaisamplos,comooslúdicos,imaginativosecriativos,elementosesses,encontradosnaatividadeturística(TRIGO,2009).
Além de dialogar com elementos eminentemente humanos,vê‐se que turismo surge atualmente como um importantefenômenosocial,degrandeatratividadeeconômica,eleécapazde proporcionar desenvolvimento sócio‐econômico, com ageraçãoderendaeemprego,interaçãoentreaspessoas,ocasionaa difusão cultural, cria uma imagem favorável a destinaçãoturística,entreoutros.
Entretanto, apesar dos inúmeros benefícios, odesenvolvimentodoturismopodetrazeralgumasdesvantagens,como: desenvolver demanda em excesso; gerar perdas tãograndes,queosbenefícioseconômicosnãocobremocusto;criarproblemassociaisdecorrentesdediferençassociaisederendaedaintroduçãodeprostituição,dojogoedocrime;podedegradaro ambiente físico e cultural, entre outros (GOELDNER, et.al,2002).
Rushmann (1997, p.10) avalia que em quase todas asdestinações turísticas é possível perceber a falta de culturaturística das pessoas que viajam, pois elas se comportam deforma alienada em relação aomeio que visitam, “acreditandonão terem nenhuma responsabilidade na preservação danaturezaenaoriginalidadedasdestinações”.
Aindasegundoaautora,osturistasentendemqueseutempolivre é “sagrado”, que têm direito ao uso daquilo pelo quepagaram e, por permanecerem pouco tempo na destinaçãoturística, não podem ser responsabilizados pelas agressões aomeioambiente(RUSHMANN,1997).
Os impactos do turismo no meio ambiente podem serdesastrosos,casonãosejamdimensionados.Osrecursosnaturais
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são limitadoseatividade turística se localizapreferencialmenteem regiões onde esses recursos apresentam maiordisponibilidade.Dadooriscoqueousomassivoedesordenadopode acarretar, recomenda‐se que o turismo seja realizado deformaque se compatibilizeo seuuso com aproteçãodomeioambiente(RABANY,2003).
Para que o turismo não traga impactos negativos é precisoplanejar.Oplanejamentofazpartedeumaaçãoanterior,emquemuitosfatoresprecisamsercoordenadosparaqueoseuobjetivopossaseralcançado(BARRETO,2005).
Afinalidadedoplanejamentoturísticoconsisteemordenarasaçõesdohomem sobreo território, tambémdirecionaousodetecnologias de forma adequada, evitando assim, os efeitosnegativos que podem destruir ou reduzir a atratividade doturismo(RUSHMANN,1997).
O planejamento sustentável da atividade turística induz odesenvolvimento do turismo sustentável, isto é, o equilíbrioharmônicoentretrêsdimensões:aeconômica,asocioculturaleaambiental(DIAS,2003).
De acordo comBarreto (2005), oplanejamento turístico temsidoobjetodemuitasdefiniçõesao longodo tempo. Issonãoéuma peculiaridade, mas algo normal dentro das ciênciashumanas e sociais, nas quais as definições não obedecem aosmesmoscritériosdeelaboraçãoseguidospelasciênciasexatas,
Quando elaboramos conceitos que se referem a leis da física, daquímica,damatemáticaoudabiologia,nãohámuitapossibilidadedevariaçõessobpenadeperder‐seosentidodadefinição.Masquandoos conceitos se referem às leis sociais,háumamaior flexibilidade ecada pessoa pode elaborar a sua própria definição de fenômenos,desdequeentendaosprincípiosbásicosqueosproduzem(BARRETO,p.29,2005).
Emmeioaessaflexibilidadeconceitual,pode‐seperceberque
o bomplanejamentodo turismo vaimuito alémdemetas que
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maximizem os lucros, muito embora o desenvolvimentolucrativo traga benefícios econômicos e sociais para acomunidade,aatividadeturísticatambémpodetrazerdanos.
Os empreendedores turismo ao estimular essa atividadedevem se preocupar emmanter a qualidade arquitetônica dasedificaçõesque sãovisitadas, assim comoos recursosnaturais;escolhermeiosdetransportesadequados,promoveraeducaçãoturística,entreoutros(GOELDNER,et.al,2002).
Dessaforma,oplanejamentoturísticoserefereaumconceitoholístico, apropriando‐sedo conhecimentodediversos camposcientíficos,poiselesauxiliamnasustentabilidadedaatividade.
A diversidade dos tipos de estudos referentes ao turismodenota sua interdisciplinaridade. Namaioria dos trabalhos, oturismo éanalisado“sobos cânonesda especializaçãode cadadisciplina que o constitui ‐ economia, antropologia, geografia,planejamento, administração, marketing, sociologia ecomunicação”,poisnão existeuma teoria turística consolidada(MOESH,2000,p.07).
Primeiramente,pode‐sedestacar que as ciências sociaisdãosuporteao campo científicodo turismopelo fatodo turista serconsideradoum agente social.A ciênciado turismo ainda estáem formação,mas alguns estudiosos já arriscam amencionar,principalmente na Europa, como a “ciência social de viagens”(ANSARAH,2000).Barreto (2004) acredita que o turismo é um fenômeno
socioantropológico, emque a antropologia ajuda a averiguarocomportamento das populações receptoras e emissoras,buscando assim, planejar o turismo de forma que não geregrandesimpactossociais.
Asociologiadolazer,temáticaquecomeçouaserdifundidaapartirdadécadade1970, temno turismoasuareferência.Essecampoabrange“todasàsocupaçõesàsquaisoindivíduopodesededicar,apóssedesobrigardastarefasfamiliares,profissionaise
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sociais.A condição de liberdade de optar pelo que fazer seriainerenteaolazer”(PAIVA,2005,p.35).
Emcontrapartida,pormeiodabiologiaépossívelconhecerosbiomas existentes e que podem ser apropriados pelo turismo,visando sempre à implantação de projetos de educaçãoambiental para que o turista além de apreciar os recursosnaturais possam também conservá‐los. Quando as ações sãocontroladas e planejadas, o turismo se torna uma das formasviáveisdeseexplorareconomicamenteosrecursosdanatureza,em que o objetivo maior é a sua preservação, pois são oselementosnaturaisque justamentedãoatratividadeao turismo(RABANY,2003).
Aengenhariade tráfego juntamentecomaarquiteturapodeajudarnaelaboraçãodoroteiroquedeveráserpercorridopelosônibus de turismo demodo a não piorar o trânsito urbano etambémnãoafetaredificaçõeshistóricas,poisosônibuscausamcerta trepidaçãonesse tipodeconstrução,quecomopassardotempo,causam trincase rachaduras.Alémdisso,a fumaçaqueexala dos escapamentos danificam a pintura desses prédioshistóricos(DAMAS,2007).
Aliás, o campo científico da história possui grandeimportâncianaatividadeturística,poispormeiodelaépossívelressaltarosaspectosculturaiseartísticosdeumasociedadeequepodemdespertaro interessedo turista emviajar, fazendo comqueelepossavalorizaropassadoeo simbolismohistóricodaslocalidadesturísticas(CHOAY,2001).
Já as ciências jurídicas estudam o conjunto de relações efenômenos que se originam do ato ou fato jurídico que oindivíduolevaaefeitodecompreenderourealizarumaviagem;permiteaindaconhecerosdireitosedeveresdosviajantes,bemcomo o código de ética do bacharel de turismo. “O turismo éconsiderado exercício do direito à liberdade individual detrânsito”(ANSARAH,2000,p.16).
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Noplanejamentodo turismo,as informações sãoexternadaspor meio de ações de marketing, considerada uma área dacomunicação.
Dessa forma, para que o turista tenha conhecimento sobredeterminada localidade,omarketing turísticopossuiumpapelmaisdoquedecisivo,poisdeacordocomRUSCHMANN(1990),um plano de marketing se constrói basicamente com umaprofunda análise do mercado turístico, tendo como metasprincipais: aumentar o fluxo turístico, persuadindo os turistaspotenciais a se deslocarem para a destinação com açõespromocionaisepublicitárias.
Entretanto,apromoçãodeuma localidade temque ser feitacom responsabilidade, procurando evidenciar as suas reaiscaracterísticas, com a preocupação de que determinadainformação pode causar algum tipo de reação nas pessoas,buscandoprimarpeloreal,evitandoaveiculaçãodeinformaçõesimprecisas que possam confundir o turista, sendo que taisinformaçõesdevem retratarcomexatidãoosaspectosculturais,sociaiseambientaisdolocalaservisitado(DAMAS,2007).
E por fim, o campo científico do turismo tem amissão defazer a convergência entre diferentes áreas do saber e buscarsoluções criativas e inovadoras que venham suprir asnecessidades domercado, preocupando‐se não só com o ladoeconômico, dando a devida importância aos aspectos sociais eculturais dessa atividade, além de avançar nos conhecimentoscientíficos do próprio turismo, para que se possa aumentar aeficáciadoplanejamentodaatividadeturística(GUZELA,2004)
Segundo Barreto (2005, p.32), “O planejamento implica aaplicação de políticas preexistentes ou a elaboração de novas,assimcomodeplanos,programas,projetos(...)”.Dessaforma,oplanejamentodoturismonecessitadeumaarticulaçãodasmaisdiferentesentidadespúblicas.
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E os objetivos governamentais são de fundamentalimportância.Asmetasdogovernonãodevem ter como focoodesenvolvimento turístico somente sob o ponto de vistaeconômico. É necessário levar em conta os aspectos sociais,culturais e ambientais da atividade, pois eles não devem sernegligenciados e exigem envolvimento e estudo por parte dasentidadesgovernamentais.“Historicamente,oêxitodo turismoemumadestinaçãodependedaaçãodoEstado”(RUSHMANN,p.155,1997).
Conforme com Barreto (2005), uma das propostas maisrecentesparapropiciarodesenvolvimentodoturismorealmentesustentável é a do planejamento cooperativo, que vai além daproposta das parcerias entre os setores público e privado,incluindoauniãoentreosdiferentesníveisdegoverno,entreasdiversas agências governamentais e entre estas e os diferentesinteressadosdosetorprivado.ConsideraçõesfinaisOs estudos em CTS ajudam a averiguar como os mais
diferentes campos científicos congregam o planejamentosustentável do turismo, possibilita constatar que a ciência e atecnologia podem auxiliar no desenvolvimento do turismo deformaqueelenãotragaprejuízosàsociedade.As políticas públicas de turismo, por sua vez, necessitam
fomentar o turismo com planejamento, observando sempre osimpactossocioambientaisqueessaatividadepodecausar.
O turismo e a busca por um tempo livre que possa serdedicadoàsviagensdespontamcomoumanseiodohomempós‐moderno,quelidacomdiversaspressõesreferentesaocotidianovividonosgrandescentrosurbanos.
Assim,pode‐seperceberqueaexpansãodaatividadeturísticaserefereaumprocessonaturaldasociedadedolazereaciência
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etecnologiapodeproverossustentáculosdessefenômenosocial,fazendocomqueoturismotragamaisimpactospositivosdoquenegativos.
Asdiscussões levantadasnesse trabalhosereferemapenasauma apreciação inicial sobre a relação existente entre oconhecimento científico e o planejamento do turismo, sendopertinente a realização de pesquisas que complementem asexplanaçõesdesseestudo.
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Reflexõessobreaimportânciadoconhecimentotradicionalparaaciênciaeodesenvolvimentodasociedade
LíviaCoelhodeMello
CamilaCarneiroDiasRigolin
A humanidade desde sempre esteve em busca dodesenvolvimento e atualmente uma forma de alcançá‐lo é pormeioda informaçãoedoconhecimento.A informaçãosegundoScotti(2007)temseconstituídonuminstrumentoimprescindívelao desenvolvimento social, político e econômico dos países,devido principalmente ao processo de globalização e aumentodousodasferramentastecnológicas.
A informação e o conhecimento, objetos de estudo para aCiência da Informação, são termos distintos, porém,complementares.Setzer(1999)osdiferenciadaseguintemaneira:
‐ Informação: abstração informal, que representa algosignificativo para alguém através de textos, imagens, sons ouanimação [...] A representação da informação podeeventualmenteserfeitapormeiodedados.
‐Conhecimento:éumaabstração interior,pessoal,dealgumacoisaquefoiexperimentadaporalguém.[...]oconhecimentonãopode ser descrito inteiramente, não depende apenas de umainterpretação pessoal, como a informação, pois requer umavivênciadoobjetodoconhecimento.[...]Associamosinformaçãoàsemântica.Conhecimentoestáassociadocompragmática.
Uma informação,quando transmitidaparaum receptorpormeiodeumprocessodecomunicação,podese transformaremconhecimento,eestepodegerardesenvolvimento,constituindodestaformaociclocitadoporBarreto(1998):
informação=>conhecimento=>desenvolvimento=>informação
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Davenport e Prusak (1998 apudVALENTIM, 2002) dão aoconhecimentoasseguintescaracterísticas:
• Informaçãovaliosadamentehumana• Incluireflexão,síntese,contexto• Dedifícilestruturação• Dedifícilcapturaemmáquinas• Freqüentementetácito• DedifíciltransferênciaFoiapósaRevoluçãoIndustrialqueopapeldoconhecimento
passoupormudanças,poisoshomenspassaramapensarmaissobre o controle de suas relações com a natureza, sobre astransformações econômico‐sociais que estavam ocorrendo esobre a veracidade do conhecimento. (BERTELLI; PALMEIRA;VELHO,1967)
Antesdosurgimentodastécnicasdeimpressão,paraWersig(1993) o conhecimento era pessoal e organizado na forma oraltradicional, tanto é que, “por um longo período de tempoprovérbios e conhecimentos dos camponeses formaram umrespeitável corpo de conhecimento baseado na experiênciapessoal a na tradição”. Com a produção escrita à mão oconhecimento era divulgado e armazenado, porém eratransmitido a uma parcela mínina da população, pois eramnecessáriaspessoascapazesdeleredepoistransmitiroralmenteparaoutras.
ComainvençãodeGutemberg,houveumagrandeevoluçãona transmissão do conhecimento, possibilitando um númeromaiordepessoasregistraremseusconhecimentosemaispessoasterem acesso a eles.No século XIX, com os desenvolvimentostecnológicos,asimpressõespassaramaseremfeitasemgrandesescalas, aumentando desta forma o valor do conhecimentoregistrado.
Oregistrodoconhecimentofeitopormeiodapublicaçãodedocumentos impressos, como em livros, jornais e revistas, se
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tornou a principal forma de divulgar informações científicas enão científicaspara apopulação.Mas,paraWersig (1993) estemeiodedocumentaçãofezoconhecimentoficardespersonalizado,sem a dependência de um indivíduo para transmiti‐lo,diferentemente do que ocorria quando as informações eramdivulgadasoralmente.
Esta forma de impessoalidade existente na leitura dedocumentos impressos faz aumentar a utilização das“tecnologias de comunicação mais personalizadas” (WERSIG,1993),comoporexemplo,atelevisão.Hátambémoaumentodeeventos que promovem a interação entre as pessoas, comocongressos, seminários eworkshops;mantendodesta formaoscanais informais de comunicação, nos quais os conhecimentossãotransmitidospessoalmente.
Oconhecimento,independentedosdiversosmeiosqueorepresentam,de acordo comMorin (2000,p.20) “sob formadepalavra, de idéia, de teoria, é o fruto de umatradução/reconstruçãopormeiodalinguagemedopensamentoe, por conseguinte, está sujeito ao erro”. Sendo odesenvolvimentodoconhecimentocientíficoumpoderosomeiodedetecçãodoserros.
OConhecimentoCientífico
Oconhecimentocientíficoéafonteparaodesenvolvimento
da ciência e da tecnologia em um país. Tem início com asatividadesde pesquisa científica, caracterizadas pela utilizaçãodo método científico. Este conhecimento é sistemático,organizado, objetivo, está sempreprocurando respostaspara o“como”eo“porque”dos fatos,propõe teoriasehipóteses,eéencontrado, sobretudo, dentro das instituições de ensino epesquisa e as conclusões científicas geradas por esses
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conhecimentossãoconsideradasverdadeirasatéqueseproveocontrário.
A criação do conhecimento por um pesquisador “partedaquilo que foi construído anteriormente por outrospesquisadores”,utilizando“oscanaisdecomunicaçãoemtodoociclo do conhecimento – desde a sua criação até a suadivulgação”(LEITE;COSTA,2007).
A comunicação científica é o processomais importante naconstruçãodoconhecimentocientífico,poisépormeiodestaqueoconhecimentodeumindivíduoétransmitidoparaoutro.Paraistoserpossível,existemdoiscanaisdecomunicação:o formal,que é representado geralmente pela escrita, é de fácilarmazenamento e recuperação, sendoosprincipais exemplosolivroeoperiódico;eoinformal,difundidopelafala,presentenainteração direta entre as pessoas, ocorrida durante encontros,comoporexemploosqueacontecememcongressos.
Oscanaisinformaissãomaisutilizadosdoqueosformaisnadivulgação do conhecimento científico, mas a forma maisabrangente é a da publicação pormeio dos canais formais decomunicação,devidosuacapacidadedeatingirumnúmeromaiselevadodepessoas.Atualmenteoacessoàsinformaçõesescritasestámaisfácil,porcausadasbasesdedadosquedisponibilizamartigospelainternet.
Nãobastaadquirirmosoconhecimentopelométodocientíficoe adotarmos uma abordagem científica a esse conhecimento.Defendo que para ser considerado conhecimento científicodeve também ser aceito por parcela significativa dacomunidade científica [...] conhecimentos científicos nãoadequadamente divulgados não serão conhecimento útilenquanto permanecerem fora do discurso científico corrente.(VOLPATO,2004)
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Quantomaior for adivulgaçãodo conhecimento científico,maior será o desenvolvimento da ciência e o progressotecnológico, essenciais para o bem estar da sociedade, quandoutilizadosdemaneira correta.Devido a importânciadeste tipode conhecimento, fica claro que os governosdeveriam investirmaisnossistemasdepesquisaedesenvolvimento,aumentandoeincentivando as comunidades científicas e os fluxos dainformaçãocientífica.
Atualmente ovalor que sedá ao conhecimento científico émuitomaior aodado a outros tiposde conhecimento, como oconhecimento tradicionaleo tácito,porémeles são tambémdeextremaimportânciaparaahumanidade.
OConhecimentoTradicional
O conhecimento tradicional ao contrário do conhecimento
científiconãoéregistradoenemorganizado,porém“éaformamais antiga de produção de teorias, experiências, regras econceitos, isto é, amais ancestral forma de produzir ciência.”(MOREIRA,2007).
Caracterizadocomosendoumconhecimentotransmitidodegeração por geração, é encontrado principalmente nascomunidades locais, que englobam os povos indígenas,ribeirinhos, quilombolas, pescadores artesanais, camponeses,entreoutros.Éumconhecimentoqueabrangeasmaisdiversasáreasdosaber,porémaquemaissedestacaéarelacionadacomabiodiversidade,devido ao fatodas comunidades tradicionaispossuíremumaligaçãomuitograndecomanatureza.
Este conhecimento relacionado com a biodiversidadeenvolvedesdetécnicasdemanejoderecursosnaturais,métodosdecaçaepesca,oconhecimentosobreosdiversosecossistemas,propriedadesfarmacêuticas,alimentíciaseagrícolaseatémesmoascategorizaçõesdeespéciesdefloraefauna.(SANTILLI,2004).
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Odesenvolvimentoeocompartilhamentodoconhecimentopelascomunidades tradicionaisocorremsegundoSantilli (2004)“apartirdepesquisas e observaçõesminuciosas, especulações,experimentações e ampla troca de informações” e são“produzidos a partir de atividades e práticas coletivamentedesenvolvidasnafloresta”.
Apreservaçãodestetipodeconhecimentoédefundamentalimportânciaparaasustentabilidadeglobaleconsequentementeparaasobrevivênciadahumanidade,sendoobjetodeestudodemuitospesquisadorese temasdediversos fórunseconvenções,osquaisdiscutemsobreaproteçãodoconhecimentotradicional.
Frequentementeascomunidadestradicionaissãoprocuradaspor cientistas, que se deslocam até elas interessados porinformações sobre abiodiversidade local.A fimdediminuir otempoeosrecursosgastoscompesquisasoscientistasutilizamessas informações em experimentos e produtos, como porexemplo,nafabricaçãodemedicamentosoucosméticos,gerandolucroscomacomercializaçãoecomaspatentesquepossamsercriadas, tornando‐se contemporaneamente um ativo para ocomerciointernacional.
A simples transformação dos conhecimentos tradicionais emmercadoriasoucommodities,aseremnegociadosnomercado,representa a subversão da lógica que preside a própriaproduçãodessesconhecimentos.(SANTILLI,2004,p.14)
Oproblemaéqueosbenefíciosgeradoscomestasatividades
comerciaisnamaiorpartedasvezesnãosãorepassadosparaascomunidadesquederamorigemaoconhecimento.EsseassuntofoiumdosdestaquesnaConferênciadasNaçõesUnidasparaoMeioAmbienteeoDesenvolvimento,queaconteceunoRiodeJaneiro em 1992, sendo publicada a Convenção sobreDiversidade Biológica (CDB), com os seguintes objetivos:conservação da diversidade biológica; uso sustentável de suas
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partesconstitutivaserepartiçãojustaeeqüitativadosbenefíciosqueadvêmdousodosrecursosgenéticos(CUNHA,1999).
AConvençãosobreDiversidadeBiológicareconheceque:édesejávelrepartireqüitativamenteosbenefíciosderivadosdautilização do conhecimento tradicional, de inovações e depráticasrelevantesàconservaçãodadiversidadebiológicaeàutilizaçãosustentáveldeseuscomponentes.[...]Reconhecendoa estreita e tradicionaldependênciade recursosbiológicosdemuitascomunidadeslocaisepopulaçõesindígenascomestilosdevidatradicionais.(CDB,1992)
A CDB reconhece a importância das comunidades
tradicionaisnaconservaçãoeusosustentáveldabiodiversidade,sendo consciente também da necessidade do desenvolvimentodacapacitaçãocientífica,técnicaeinstitucionalqueproporcioneo conhecimento fundamental necessário ao planejamento eimplementaçãodemedidas adequadasparaprever,prevenir ecombaternaorigemascausasdasensívelreduçãoouperdadadiversidadebiológica.
PropondonoArtigo12(PesquisaeTreinamento):a)Oestabelecimento,amanutençãoeoapoioaprogramas
deeducaçãoetreinamentocientíficoetécnico;b) O estimulo às pesquisas que contribuam para a
conservaçãoeautilizaçãosustentáveldadiversidadebiológica,especialmentenospaísesemdesenvolvimento,
c) A cooperação na utilização de avanços científicos dapesquisa sobrediversidadebiológicaparaelaborarmétodosdeconservaçãoeutilizaçãosustentávelderecursosbiológicos.
TambémnaConferênciade1992foipublicadoodocumentointitulado “Agenda 21” que propôs, no capítulo 26, o“reconhecimento e o fortalecimento do papel das populaçõesindígenas e suas comunidades”, traçando diversos objetivos aseremcumpridospelosgovernos,sendoqueoterceiro,objetiva:
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“o reconhecimento de seus valores, seus conhecimentostradicionais e suas práticas demanejo de recursos, tendo emvistapromoverumdesenvolvimentoambientalmentesaudávelesustentável”;édescrita tambémalgumasatividadesquepodemser atribuídas aos governos, como a de “adotar ou reforçarpolíticase/ouinstrumentosjurídicosapropriadosqueprotejamapropriedade intelectual e cultural indígena e o direito depreservar sistemas e práticas consuetudinários eadministrativos”.Há ainda neste documento no capítulo 40, aproposta de fortalecimento da capacidade de difusão dainformaçãotradicional.
AtéestemomentonoBrasiloque regulamentaoacessoaopatrimônio genético, a proteção e o acesso ao conhecimentotradicional associado, a repartição de benefícios e o acesso àtecnologiae transferênciade tecnologiaparaa conservaçãoeautilizaçãodadiversidadebiológica,éamedidaprovisória2.186‐16 de 23 de agosto de 2001, porém muitas discussões estãoacontecendoparaque sejacriadoum sistemadeproteçãomaiseficiente.
Lentamente, muitas propostas estão surgindo, mas aefetivação delas não é fácil, devido às controvérsias sócio‐jurídicas existentes sobre a proteção do conhecimentotradicional.AOrganizaçãoMundialdePropriedade Intelectual(OMPI) defende a utilização do sistema de patentes, massegundo Santilli (2004) esse é um sistema que protege asinovações individuais, com aplicações industriais e oconhecimento tradicional possui a titularidade coletiva, sendoimpossívelprotegê‐locomalógicadapatente.
A mesma autora sugere a construção de um regime suigeneris,deproteçãoaosconhecimentostradicionaisassociadosàbiodiversidade, que possui como elemento fundamental o“reconhecimento e fortalecimento das normas internas e dodireitocostumeiro,não‐oficial,dospovosindígenas,quilombolas
163
epopulações tradicionais”, reconhecendo a identidade culturalcoletiva, os costumes e tradições coletivamente desenvolvidos,reproduzidosecompartilhados.(SANTILLI,2004).
Relações entre conhecimento tradicional e conhecimentocientífico
O conhecimento científico costuma sermais valorizado pela
sociedadedoqueo tradicional, entretantoosdois são apontadoscomofundamentaisparaodesenvolvimento,principalmenteseumestiver ligadoaooutro.O conhecimento tradicionalnãopode seresquecido, nem excluído, pois se isso ocorresse haveria muitasconseqüênciasnegativas.SegundoDhewa(2011),aciência,sozinha,nãoconseguirácombaterapobreza,asdoençaseosdesequilíbriosecológicos,elaprecisarádeoutrasviasdeinvestigação.
Os conhecimentos adquiridos por meio da ciênciaconvencional,quenormalmenteé fechadoe formal,podem serampliadosatravésdesistemasdeconhecimentostradicionaisouindígenas,quesãoabertoseinformais(DHEWA,2011).
Rahman diferencia os dois sistemas de conhecimentos deacordocomatabela1.
Conhecimentocientífico Conhecimentotradicional
Conhecimentoexplícito(objetivo) Conhecimentotácito(subjetivo)
Conhecimentodaracionalidade(mente)
Conhecimentodaexperiência(corpo)
Conhecimentoseqüencial(láeentão)Conhecimentosimultâneo(aquieagora)
ConhecimentoDigital(teoria) Conhecimentoanalógico(prática)
Tabela1–RAHMAN,2000,p.4
164
Enquantoaciênciaconvencionalformulaprincípioseteoriaspara descrever a natureza, as comunidades tradicionais, combasenacompreensãodouniverso,atribuemànaturezavalores,crenças,costumesecerimônias(DHEWA,2011).
As novas tecnologias de informação e comunicação estãodesempenhando um papel importante no processo devalorização do conhecimento tradicional, sendo utilizadas empesquisas científicas ou pelas próprias comunidades comoferramentas para o registro, proteção e revitalização doconhecimento.
Estes processos de transformação de um saber em outro,mesmosendoumcaminhocomdiversosdesafios,cumprindo‐seas normas, as legislações e formas de proteção intelectual,podemtrazermuitosbenefíciosparaasociedadecomoumtodo.Mas,paraissoserpossível,ocientistaprecisariapensarmaisnasituaçãodoplanetaedeixarumpoucode ladoaambiçãopelolucro, acabando de vez com a exploração e apropriação dosconhecimentos tradicionais de forma desregrada e ilegal. Alegislação deveria ser revista e atualizada e os governosdeveriam assumir e por em prática o que foi declarado naConferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e oDesenvolvimentode1992. ReferênciasCONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MEIO AMBIENTE EDESENVOLVIMENTO (1992, Rio de Janeiro, Brasil)Agenda21.São Paulo:Secretaria de Estado do Meio Ambiente, 1997. 383 p. ‐‐ (DocumentosAmbientais)
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167
Alfabetizaçãocientíficaeaparticipaçãopúblicanaspolíticasdesaúde
LuizHenriqueChenchi
MariaLúciaTeixeiraMachadoIntrodução
Este artigo tem por objetivo articular as consultas públicas
comomeio de participação da sociedade em assuntos deCTSque afetam a saúde das pessoas, haja vista a pouca literaturaexistentesobreotema.Paratanto,seráabordadaaalfabetizaçãocientífica como importante característica para um indivíduoconscienteeatuantenasaçõesdeCTS,sejanoentendimentodequestões práticas do seu dia‐a‐dia, na tomada de decisões nasociedadeeaténaformulaçãodepolíticaspúblicas.Emseguida,uma abordagem das consultas públicas, definição ecaracterísticas, e seu uso administrativo para formulação depolíticaspúblicas,principalmentenocampodasaúde.
Existem duas tradições fundamentais dentro do enfoqueCiência,TecnologiaeSociedade (CTS):a tradiçãoeuropéia,quecentra seu estudo na análise dos antecedentes ou oscondicionantes da ciência e, a tradição norte‐ americana, quecentra seus estudos nas conseqüências sociais e ambientais doconhecimento científico. Um aspecto interessante a serconsiderado é que ambas consideramprioritária anecessidadede controle público da ciência e da tecnologia e promovemdiversosmecanismosdemocráticosquefacilitamaaberturadosprocessos de tomada de decisão à participação dos cidadãos(SANTOS&ICHIKAWA,2004).
Furnival (2008) ressalta que, no Brasil, tem havido umacrescentepropagaçãodovalordaparticipaçãodasociedadenos
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processos políticos, como forma de superar o “déficitdemocrático”. Há uma preocupação em torno da nãoreceptividadedopúblicoem tornodosavançosC&Tquesedáacerca da percepção e compreensão sobre C&T que estãopresentes na sociedade. A educação por meio da divulgaçãocientíficaéentendidacomonecessáriaparamaioreschancesdeaceitar avanços científicos e tecnológicos, visto que aversões aalgumavançosurgemapenasporfaltadeacessoecompreensãodosfatoscientíficos.
De acordo com os pressupostos do movimento CTS, oaumentodaparticipaçãodasociedadeemassuntosdeciênciaetecnologiaseriadesenvolvidoapartirdemudançasnocurrículode ciências, apresentando uma visão diferente de ciência e detecnologia, que passasse a explorar suas relações com asociedade(FARESetal.,2007).
Pfuetzenreiter (2001) destaca que o desenvolvimentocientífico e tecnológico tem sido consideradoummarcoparaasociedade moderna. O aumento do conhecimento em ritmoacelerado, comum curto intervalodesde asnovasdescobertasaté a sua aplicação em grande escala, tem afetado a vida daspessoas.Entretanto,nãohámuitainformaçãoarespeitodecomoessesavançosestãosendoassimilados.
NoBrasil,canaisadequadosdedebateeexpressãodevemsercriados e multiplicados de modo a garantir a participaçãopopular nas grandes decisões que orientam o progressocientífico,equeasociedadedeveopinarantesdarealizaçãodapesquisa, e não apenas depois de sua realização (SANTOS &ICHIKAWA,2004).
AlfabetizaçãocientíficaemCTS
Os estudos CTS têm por objetivo, por um lado, acontextualização histórico‐social do conhecimento científico‐
169
tecnológico, e por outro lado, a promoção da participaçãopública.Ambososobjetivosexigem,comoumdosprocessos,aalfabetização dos cidadãos em ciência e tecnologia, para quepossam tomardecisões com base em informações (SANTOS&ICHIKAWA,2004).
Umdosproblemasenfrentadospelasociedademodernaéomontante de informações qualificadas como científicas nosdiversos meios de comunicação, principalmente pelapropaganda de produtos, que promete prodígios utilizando aautoridadedaciência.Alertadeve‐se terparaoproblemadeaspessoas acreditarem cegamente em informações que sãoveiculadas pelamídia e que são classificadas como científicas.Essadimensãopoderiaserampliada,complementando‐sequeaalfabetizaçãocientíficaetecnológicaserianecessárianãoapenaspara participar de debates e tomada de decisões em nívelcoletivo,mas tambémpara facilitar a compreensãode fatosdavida cotidiana e a tomada de decisões acertadasindividualmente.Dentreelesestáoempregodosconhecimentoscientíficos com fins utilitários, exemplificado pela aplicaçãocorretada teoriamicrobiananaprevençãoda contaminaçãodealimentos por ocasião de sua preparação (PFUETZENREITER,2001).
A globalização e a sociedadedo conhecimento exigem quetodo cidadão tenha competências básicas (combinação deconhecimentos, capacidades e atitudes), que permita suarealização pessoal, inclusão social, cidadania ativa e emprego(ARRIBA,2007).
Umapessoaalfabetizada científica e tecnologicamentedeveser capaz de saber utilizar os conhecimentos adequados paratomar uma decisão. Por exemplo, em relação à prevenção daAIDS,eleprecisadecidirquemedidadeproteçãoadotará,alémdesuaparticipaçãonodebateemsociedadesobreasmedidasaserem tomadas coletivamente em relação à profilaxia da
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enfermidade. Ainda, deve ser capaz de desenvolver algumashabilidades, como a utilização de conceitos científicos para aadoção de decisões responsáveis para a sua vida(PFUETZENREITER,2001).
SegundaArriba(2007),aalfabetizaçãocientíficaetecnológicaé imprescindívelparaocidadãodoséculoXXI,vistoocontextoatual da ciência e tecnologia para a sociedade, onde novastecnologiassãoimplementadas(e,comelas,surgeainovação)ea participação pública na construção das políticas é cada vezmaisnecessária(Figura1).
Sociedade do século XXI
Sociedade industrial e do conhecimento
Rápida incorporação da inovação
Aprendizagem permanente
necessitacaracterizada
Alfabetização científica
Divulgação científica
Aprendizagem informal
Desenvolvimento pessoal e capacidade crítica
Cidadãos adaptados e com escassa divisão social
Figura1:CaracterizaçãodasociedadedoséculoXXIfrenteaosnovoscontextosdeciênciaetecnologia(ARRIBA,2007).
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Santos(2007,p.480)afirmaque:oletramentocientífico1doscidadãosvaidesdeoletramentonosentidodoentendimentodeprincípiosbásicosdefenômenosdocotidianoatéacapacidade de tomada de decisão em questões relativas à ciência etecnologia em que estejam diretamente envolvidos, sejam decisõespessoais ou de interesse público.Assim, uma pessoa funcionalmenteletrada em ciência e tecnologia saberia, por exemplo, prepararadequadamente diluições de produtos domissanitários; compreendersatisfatoriamente as especificaçõesdeuma buladeummedicamento;adotar profilaxia para evitar doenças básicas que afetam a saúdepública; exigir que as mercadorias atendam às exigências legais decomercialização,comoespecificaçãodesuadatadevalidade,cuidadostécnicos de manuseio, indicação dos componentes ativos; operarprodutos eletroeletrônicos etc. Além disso, essa pessoa saberiaposicionar‐se, por exemplo, em uma assembléia comunitária paraencaminhar providências junto aos órgãos públicos sobre problemasqueafetamasuacomunidadeemtermosdeciênciaetecnologia.
Esse letramento, comoprática social, implicanaparticipação
ativa do indivíduo na sociedade, o que requer também odesenvolvimento de valores vinculados aos interesses coletivosrelacionadosàsnecessidadeshumanasedeveriamservistoscomonão subordinados aos valores econômicos. Por exemplo, aolidarem diariamente com vários produtos químicos as pessoastêm que decidir qual devem consumir e como fazê‐lo. Essadecisãopoderiasertomada levandoemcontanãosóaeficiênciados produtos para os fins que se desejam, mas também seus
1 Santos (2007) adota a diferenciação entre alfabetização e letramento,justificando que na tradição escolar a alfabetização científica tem sidoconsiderada na acepção do domínio da linguagem científica, enquanto oletramentocientífico,nosentidodousodapráticasocial,pareceserummitodistantedapráticadesaladeaula.Aoempregarotermoletramento,elebuscaenfatizar a função social da educação científica contrapondo‐se ao restritosignificadodealfabetizaçãoescolar.Observa‐seque,enquantoaalfabetizaçãopode ser considerada o processo mais simples do domínio da linguagemcientífica,oletramento,alémdessedomínio,exigeodapráticasocial.
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efeitos sobre a saúde, seus efeitos ambientais, seu valoreconômico, as questões éticas relacionadas à sua produção ecomercialização(SANTOS,2007).
A educação escolar nem sempre prepara o indivíduo paraexerceropensamentocrítico.
Umaopçãoseriapoderdirecionaressasquestõesparaasaúdefazendoalgumas indagações: para que serve a alfabetização científica etecnológica em saúde? Quem teria essas prerrogativas? Como aspessoas que não tiveram acesso à educação formal, ou o fizeram hámuito tempo, poderão estar alfabetizadas científico‐tecnologicamenteemsaúde?Essaspessoasnãopoderãoterautonomia,capacidadedesecomunicarcomosdemaiseresponsabilidadesemrelaçãoàsuaprópriasaúdeequalidadedevida?Comopoderãoparticipardosdebatesedasdecisões?Nocasodosalimentostransgênicos,porexemplo,comoessaspessoaspoderãoopinarediscutirsobreotemasealinguagemutilizadapelosmeiosdecomunicaçãoestátãodistantedalinguagemdodia‐a‐diadapopulaçãoemgeral?(PFUETZENREITER,2001,p.4).
Diversos são os argumentos para justificar a alfabetização
científica. Millar (1996)2 apud Santos (2007) agrupa essesargumentos em cinco categorias: a) argumento econômico, queconecta o nível de conhecimento público da ciência com odesenvolvimentoeconômicodopaís;b)utilitário,que justificaoletramentoporrazõespráticaseúteis;c)democrático,queajudaoscidadãosaparticipardasdiscussões,dodebateedatomadadedecisãosobrequestõescientíficas;d)social,quevinculaaciênciaàcultura, fazendo com que as pessoas fiquem mais adeptas àciênciaeà tecnologia;ee)cultural,que temcomometa forneceraosalunosoconhecimentocientíficocomoprodutocultural.
2MILLAR,Robin.Towardsasciencecurriculumforpublicunderstanding.SchoolScienceReview,v.77,n.280,p.7‐18,1996.
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ParticipaçãopúblicaeconsultaspúblicasFaresetal.(2007)destacaomodelodeparticipaçãopúblicana
comunicação da ciência, como baseado no compromisso dedemocratizaçãodaciênciaedatecnologia,ondeaparticipaçãodopúblicoemassuntosdeCTenaformulaçãodepolíticascientíficasetecnológicassedánasmesmascondiçõesqueparaoscientistaseemespaçospropíciosparaissocomoforos,debateseconferenciasde consenso. Pressupõe como condição necessária para odesenvolvimento dessas atividades, a valorização do diálogoentreoscientistaseosnão‐cientistas,ressaltandooenvolvimentodopúbliconosprocessosde tomadadedecisão sobreCT enosprocessosde formulaçãodepolíticas científico‐tecnológicas, sejapormeiodavalorizaçãode saberes locaisoupormeioda ativaparticipação.
Para que haja envolvimento do público nesses processosdecisórios,éprecisoqueocorraoacessoà informaçãoadequadavisando à formaçãoda opinião, compouca influênciademitos,suposições e discursos persuasivos emitidos por grupos depressão. A apatia dos cidadãos, o grau de especialização doconhecimentocientíficoetecnológico,apoucacoberturadamídia,falta de oportunidade e a crença de que o conhecimentonecessário para participar é limitado aos cientistas são vistoscomobarreirasparaosucessodaparticipaçãopública(RESENDE&ROTHBERG,2011).
NoBrasil, as consultaspúblicas (ou consultas online) têm semostrado o meio mais adotado de participação pública,especialmenteno âmbitoda saúde.Destacam‐se comomeiosdeconstrução compartilhada de diretrizes de políticas públicas elegislações.Umdado setor governamental submeteuma versãoinicialdo textosobconsultapela internet,e indivíduosesetorespodem se manifestar sobre cada aspecto proposto, indicar anecessidade de mudanças, justificar o porquê das sugestões,
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conhecer as contribuições de outros participantes, revisar seusconceitos após descobrir as posições alheias, combinar‐se comoutros para conjuntamente propor alterações, enfim participarativamente da política. Para se legitimarem, as contribuiçõesdevem ser processadas com transparência, de modo que oparticipantepercebaquesuacolaboraçãofoiefetivamentelevadaemcontanoprocessodeformulaçãopolítica.Aexclusãodigitaleafaltadedomíniodopúblicoemgeralcomasnovastecnologiassãoenormes,empaísescomooBrasileoutrosdaAméricaLatina,e têmse tornadoobjeçõesparaaefetivaparticipação (RESENDE&ROTHBERG,2011;ROTHBERG,2010;ROTHBERG&BERBEL,2010).
A participação em consultas públicas requer conhecimentos einformações que sustentem a formulação de perspectivas e sugestõesconsistentes. Indivíduos e setores interessados em participar devembuscar diversas fontes de informação e interpretação (ROTHBERG&BERBEL,2010,p.456).
Consultapúblicanasaúde
AparticipaçãoéumdosprincípiosdoSistemaÚnicodeSaúde (SUS)que, além de incorporar aspectos de ordem organizacional, implicaassumirumposicionamentoético‐políticodecaráterdemocráticoparasuaconcretização(ACIOLI,2005,p.293).
Aparticipaçãopúblicanaspolíticasorganizacionaisdasaúde,
especificamentenoSUS,éumaexpressãovivadaparticipaçãodasociedadenastomadasdedecisõespeloEstadonointeressegeral,caracterizando‐se como efetivo exercício do poder políticopopular(CARVALHO&SANTOS,2006).
OSUSutilizaomecanismodeconsultaspúblicasparacolhercontribuições,tantodesetoresespecializadosquantodasociedadeem geral, sobre as políticas e os instrumentos legais que irãoorientar as diversas ações no campo da saúde no país. Esta
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ferramenta abre a possibilidade de uma ampla discussão sobrediversos temas na área da saúde, permitindo a participação econtribuição pública na construção do SUS. Por meio dela, oprocesso de elaboração do documento é democrático etransparenteparaasociedade(BRASIL,2011a).
No sitedoMinistérioda Saúde (BRASIL, 2011a) foipossívelverificarque jáforamencerradas43consultasnoâmbitodoSUSdesde2003,comdestaqueparaoProgramadeAvaliaçãoparaaQualificação do SUS (com contribuições encerradas em 08 dejunhode2011)que tempormetaavaliarodesempenhodoSUSconsiderandoassuasváriasesferasdegestão. Aindanomesmosite, encontra‐se disponível o histórico das consultas públicasreferentes à revisão e elaboração dos Protocolos Clínicos eDiretrizes Terapêuticas do Ministério Saúde para as doençastratadas no Componente Especializado da AssistênciaFarmacêutica, sendoquenoanode2010 foramdisponibilizadas45 consultas a esses protocolos de alta complexidade e apenasumadisponibilizadano anode 2003,notando‐seum avançonouso desta ferramenta de participação popular, por parte dosgestorespúblicos,naáreadasaúde.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)também utiliza desta ferramenta de forma crescente, verificadoemconsultaàpáginadaagêncianainternet,ondenoanode2009foramrealizadas101consultaspúblicas,120em2010eatémeadosdeabrilde2011,foram25(BRASIL,2011b).Naprópriapágina,édisponibilizado o formulário para contribuições, onde éinteressante destacar o item segmento do participante(Consumidor (pessoa física);Associaçãoouentidadededefesaeproteção do consumidor; Profissional de saúde (pessoa física);Entidadedeclasseoucategoriaprofissionaldesaúde;Empresárioou proprietário de estabelecimento empresarial; Associação ouentidade representativa do setor regulado; Academia ouinstituiçãodeensinoepesquisa;ÓrgãoouentidadedoGoverno
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(Federal, Estadual ou Municipal); Outro. Especifique), ondequalquer cidadão pode contribuir, destacando‐se o letramentocientíficocomoformadorparaqueestacontribuiçãosejaefetiva.
Consideraçõesfinais
Os apontamentos apresentados visualizam a importânciada
participação pública nos domínios das políticas de saúde edestacam como ferramentametodológica as consultas online e aalfabetizaçãocientíficacomopropulsorparaqueestaparticipaçãosejaapropriadaeefetiva.
O campo saúde se destaca por afetar diretamente apopulação e esta sentir os efeitos imediatos, diferentemente dequando surgi uma inovação tecnológica e esta pode levar anosparaqueasociedadepercebasuasimplicações.
Notam‐se avanços na realização de consultas públicasrelacionadas à saúde, mas a participação ainda é deficiente.Resende & Rothberg (2011) argumentam que o tipo e ainsuficiência de informação disponível na internet parafundamentar a participação geram dificuldades, o que seriacontornadoatravésdo interessepessoal,capacidadedecadaumemselecionarosdadosdisponíveis,doincentivoaoengajamentoedaqualidadedainformação.ReferênciasACIOLI, S. Participação social na saúde: revisitando sentidos, reafirmandopropostas.In:ConstruçãoSocialdaDemanda:direitoàsaúde,trabalhoemequipe,participaçãoeespaçospúblicos.RiodeJaneiro:CEPESC/UERJ:ABRASCO,2005,p.293–303.
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Oprocessodeindexaçãocomotécnicadecontrolesocial
MarcoDonizetePaulinodaSilvaIntrodução
Este trabalho versa sobre a situação da Ciência
contemporânea em sua relação com aproduçãode tecnologiasdiversas que colaboram na construção de sentidos discursivosrelacionadosaprodutosculturais–maisespecificamenteofilmedocumentário–atravésderedeseletrônicasde interaçãosocial.Seupressuposto éodeque apossibilidadede trocas livresdeinformação‐naordemdecanaisinformaisougruposetradiçõesestéticas diversas ‐ podem gerar maior distinção entreconceituações sobre o que são os objetos documentaisaudiovisuais e suasdiretrizes, considerandoosmecanismosdaclassificaçãoeindexaçãocomoelementostécnicosqueproduzeme cristalizam definições, proprietários de grande poder decaracterizaçãopelasimplesatodenomeareposicionarconceitos,idéiaseobjetos.
Sua base teórica reside em autores das áreas daBiblioteconomia, Ciência da Informação, Cinema, e psicologia,objetivando produzir um diálogo caloroso e instrutivo entreessescampos.AsiglaCTS,aindaquesejautilizadapoucasvezesduranteessepercursonarrativo,encontra‐seembutidaemcadaelemento considerado relevante nessa discussão.Dessa forma,expõe‐se a seguir a seguinte correspondência de termos‐referênciaparaaconduçãododebate:
Ciência=conhecimento;Tecnologia=classificaçãoeindexação;eSociedade=objetocontrolado.
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Seguindoessamesmaordemnaargumentaçãoapresentamosnos próximos tópicos algumas explanações sobre cada umadessaspremissas.
I. Ciência&Conhecimento
Ao tratar da questão evolutiva da ciência até o paradigma
modernoParís(2004)contrapõeasvisõeshelênicas,operadasnaAntiguidade ‐queviamo conhecimento científicoderivadodaobservaçãodanatureza‐definindoaconcepçãogregadeciênciacomo“[...]contemplaçãodeumarealidadeexterior–sejaestaocosmos, o ser, o fluir, as idéias [...]” (p. 199), objetivandoconclusões baseadas na percepção, e racionalização, dosfenômenos físicos, promovendo conhecimento a partir desseentendimento. Essa atitude de observador é o principalcontrapontopelo idealdaciênciamodernaquepassouaoperarintervençõesnomundoreal,encarandoessasintervençõescomoformadeconheceromundofísico.Ouseja,umaconcepçãopró‐ativadopensador‐investigador,comoapontadoporParís(2004),quetemcomoprincípioaidéiadequesóconhecemosrealmentealguma coisa se nósmesmos a produzirmos.Dessemodo, osinstrumentos produzidos como extensões do corpo humanoexemplificamoesforçodesuperaçãodoslimitesfísicosimpostosaohomempelanatureza.
Essa idéia de “produção” como equipamento potencial deconhecimento científico do mundo encontrou ressonância nasvariações posteriores de París (2004) sobre o mesmo tema,tornando‐se prática plenamente estabelecida a partir da visãomecanicistadouniverso,manifestademaneirainquestionávelnarepresentação, por Galileu Galilei, do funcionamento desseuniversonummodelotridimensional,produzidoemlaboratório.
Essa atitude do cientista prenuncia uma ação diferenciadaem relação aos fenômenos observados, transportando a ação
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paraoníveldaprodução,replicando‐ona intençãodeatingirameta: conhecer cientificamente o mundo concreto. A adoçãodessa postura de imitação domacro numa versão objetiva, aomesmo tempoemquecondicionaomundopalpávelàsituaçãodeobjetomanipulável,outorga ao egohumano –num sentidolato – a idéia de controle da índole natural, posicionando‐secomogerentedesuasfunçõesefenômenos.
OnascimentodaCTSemfinsdadécadade1960 tevecomomotor a capacidade deste em funcionar autonomamente,repensandoessaperspectivaegocrática,tendoemmetaevitarosembaraços e riscos observados na manipulação de técnicas etecnologias então vigentes. A Ciência da Informação tambémganha impulso sob essa demanda, uma vez que suasprerrogativastinhamporfundamentoapreocupaçãoecológicaeaformaçãodeumamentalidademaisconscientedosefeitosdasescolhasfeitasnodomíniododesenvolvimento.
Voltando à questão de um modelo de Ciência comofundamentoparaaaçãoprodutiva,aexpansãodessecorolário–agoranoutromomento,maispróximodenossarealidadesocial‐,apontaalteraçõesquedilataramopressupostoaocristalizaraconcepção da Ciência em duas distinções: Ciência Básica eCiência Aplicada. A base dessas distinções/contraposiçõesencontra‐se, segundo Stokes (2005), na formulação de duasmáximas creditadas à Vannevar Bush, pelas quais a pesquisabásicaera,emprimeiro lugar,realizadasemobjetivarinteressespráticose,emsegundolugar,queamesmaagecomoprecursoradoprogresso tecnológico.Aciênciaaplicada,porsuavez,seriadefinidapelautilizaçãodosconhecimentosgeradospelaciênciabásicanaproduçãodeatividades,métodoseprodutosvoltadosparafinsutilitários.
Oelementomaiscontundentenessepequenopreâmbulo,aonossover,éatransferênciadaatençãodaconstruçãodohomematravésdo conhecimentoparauma condiçãode construçãodo
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homem através dos produtos gerados na aplicação dosconhecimentoscientíficosemnovastecnologias.Ouseja,apartirdacriaçãodaimprensa,porexemplo,astecnologiasadentraramdemaneiramais incisiva nadinâmicade construçãodo saber,sendo que com a revolução industrial essemovimento foi setornandomais acelerado enovas inclusõesoferecerammaiorescondições de desenvolvimento. Hoje, com a revoluçãotecnológica,ainformaçãofluidemaneiraostensiva,propiciandoelucidações, resoluções e diferenciações que, potencialmente,gerariamaprendizagensemelhoriasdoser.Noentanto,o focode atenção desviou‐se da formação do homem como serinstruído para a produção/sofisticação de ferramentastecnológicas,criadasnaintençãodegerarmaiordependênciadoseuoperadorqueautonomia.Umambientequeconduz,anossover,aumaproduçãovaziadesentido.Essaformadeconduçãoda episteme configura o que París veio a nomear como“Tecnosfera”,conceitoutilizadonopróximotópico.
II. Tecnologia=classificaçãoeindexação
A“Tecnosfera”édefinidaporParíscomo“[...]oconjuntoouo universo dos artefatos, não só dos instrumentos, mas dasmúltiplas formasdeles, criadaspeloshumanos.” (2004,p.206).Poressadefinição todaasériede técnicase tecnologiasemusoou desuso no cenário social‐humano, compõe a listagem deelementospresentescomoobjetoscontribuintesdamanutençãodesseambiente.
Pressupõe‐se que a dinâmica de emergência de novoferramental inclua sempre, nessas condições, adaptações ouencerramentos de outros ferramentais em uso, estabelecendoassim as regras de câmbio entre os processos e objetosproduzidos.Adiciona‐se a issoque a formadevida capitalistadetermina, por essa ordem de raciocínio, a idéia do consumocomoumafunçãorenovadorae,nummoldemaissedutor,capaz
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depromover a sensaçãode renascimentodo indivíduo atravésdoatodeatualizaçãodesipormeiodoequipamentotecnológicoquefazusonoseucotidiano.
Voltando à fala de París (2004), a diferenciação entre“Técnica” e “Tecnologia” acontece pela aquiescênciade que: aprimeirasupõeseuaperfeiçoamentonumalinhaestabelecidadeenergia emateriais, tendo a segunda se originado dos saltosqualitativospromovidospelaincursãoderecursosenergéticosenovosmateriais descobertos no avanço da ciência posterior àrevolução industrial. Uma vez que a introdução de novastecnologiasdepende, nomodelo atual,dos pactos surgidosdapercepçãodenecessidadespolíticas,econômicasesociais,nãoédeseestranharqueaderiveumníveldecontrolecadavezmaiordessa produção, controle objetivado nas ferramentas queestabelecemdefiniçõesquantoaoquesãoeaquecorrespondemtaisinclusões.
ACiência, seja ela aplicada ou básica – pela concepção deretornosocialprodutivo ‐conciliasuaformadeatuaçãocomasagendaspolíticasvigentes–sejamestasemnívelglobal,nacionalou regional ‐, exigindo a aplicação de estratégias quepossibilitem a negociação entre Estado e Sociedade naimplementaçãodenovastecnologias.
Atécnica,naperspectivadeParís,apresentaumahistóriaemqueodesejodepoder“[...]adquiremúltiplasformas,nãosónaviolência,mastambém[...]naproduçãodeumnovomundo,nocuidadoprotetorenaocupação.” (2004,p.176).Essepoder,notocanteàdivulgaçãoecomunicaçãocientífica,residenousodosprocessosde“Classificação”e“Indexação”sobrediscursosquepossam vir a afetar a imagem e episteme científicas junto àgrande massa de sujeitos contemporâneos, leigos ouespecialistas.
O documento, elemento essencial na dinâmica daclassificação,écaracterizadoporMolina,GarcíaMarcoeAgustín
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Lacruz (2002) comouma tecnologia “[...] que permite superar laslimitaciones de la comunicación presencial [...]” (p. 36), prenhe devalormnemônico, capaz de preservar – e cristalizar pormeiodessa preservação – leituras do mundo através de idéias econceitosneleregistrados.
A Classificação é entendida como um dos processos pelosquais um documento pode ser categorizado e classificado emdeterminadaordem,conformedeterminadaorientação.Poressaviatodoelementoclassificadoacabaporocuparumlugareumaposição,que,pormeiodeoutroprocesso,odaIndexaçãodeumconceitoaelerelacionado,podeserlocalizadoerecuperadoparapronta utilização. Langridge (1977) argumenta que aclassificação,sobaperspectivasocial,podeserentendidacomouma ferramenta de gerenciamento, ou seja, sua aplicaçãopromoveaçãomaisprodutivaeeconômica.
Paraqueissosedênecessita‐se,noentanto,deumaparelholingüístico que capacite essa operação de transferência: umalinguagem. Essa linguagem, por sua vez, pode ser construída,em duas modalidades: natural ou controlada. Fujita (2010)distingue ambas asmodalidades pela ausência do controle deum vocabulário na primeira em detrimento desse controle nasegunda.Ouseja,grossomodo,aslinguagensnaturaisacontecemespontaneamente, sem que haja intervenções normativas,institucionaissobreseusconteúdos,jáascontroladassãoregidaspelaexigênciadeprecisão,procurandoeliminardeseuconteúdoelementosinviáveisaoprincípiodefuncionalidade.
Um dos canaismais promulgados como fórum de debatesdemocráticoselibertáriostemsidoaWeb,quesecompõedeumgrandeemaranhadoderedessociaiscapazderefletirumpoucoda efervescência cultural contemporânea. Nesse ambiente, aslinguagens – tanto naturais quanto controladas – acontecem,produzindo posicionamentos e movimentos a partir das
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interações humanas que obedecem a critérios próprios declassificaçãoecontrole.
No próximo tópico será dada maior elucidação sobre aquestão de uso daWeb como canal de transformação de umarealidadetecnocrata.
III. Sociedade=objetocontroladoe“IndexaçãoSocial”
AsbasesdaCiênciaobjetiva,nofinaldoséculoXIX,sofreramumgrandedeslocamentoaosepromoveremospressupostosdapsicologia de Sigmund Freud e Carl Gustav Jung. Em seuprefácio do livro O Homem e seus Símbolos, de Jung, JohnFroeman afirmava que a psicologia de Jung concebia oinconscientecomo“[...]ummundoqueépartetãovitalerealdavida de um indivíduo quanto o é o mundo consciente e‘meditativo’doego.“(JUNG;vonFRANZ,1996,p.12).
Aperspectivadapsicologiaanalíticaédeque,aopassarpeloconsciente, as ações derivariam escolhas baseadas em valoresconstrutivos de indivíduo e sociedade, potencializados pelaanálise dos estímulos inconscientes, com o fim de, aodecifrarmos suas origens, os tornássemos positivos em nossainteração com omundo. O valor social das ações individuaisresidiria nisso: a somatória de escolhas pessoais conscientes eindividualizadas(maduras)queconstituiriamoscenáriossociaiscabíveisàquelasrealidadesindividuais.
Nesse tocante,acompreensãoda“consciência”–noâmbitopsicológico–écitadaporParís(2004)comovivenciadadeformatribal pelas culturas primitivas e de forma individual nasculturas ditas “avançadas”. Nessa segunda situação, viver epensaraspectosdarealidadehumana(naturezaesociedadequea circunda) émais diverso na forma, consubstanciando‐se naheterogeneidadedeexpressões individuais.Atécnica,agoraemuso pelo sujeito, surgiria nesse contexto como possibilidadesvariantes do indivíduo em expressar opiniões, sentimentos,
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visões do mundo, mesmo que essas formulações“individualizadas” carreguem características tradicionalmentedefendidasporumgrupodoqualseuemissorfazparte.
Dos elementos utilizados pelo poder dominante comoreguladoresdessecenário,oautorcitao“princípiodaação”–talcomo definido porHabermas ‐ em dois níveis: instrumental eintrumentalizante. Situa a primeira ação como relacionada aousode“instrumentos”easegundacomo,nãosóderivadadessesusos,mas,condicionantedoobjetoaoqualsedirige–nocaso,oindivíduo – como instrumento que agirá em favor da fonteemissora.Essaprerrogativaabreespaçoparaespecificaçãodessaação em duas vertentes: de ação comunicante, e de açãodramatúrgica.Ambas constituídasdeelementos informativoserepresentacionaisdirigidosportécnicasorganizacionaisque“[...]criando imagens interessantes,manipulam os sujeitos a quemambassedirigem.”(PARÍS,2004,p.188).
Então, o fundamento para nossa proposição reside napercepção de que, contrapondo‐se a essa ação comunicantemanipuladora existeuma ação comunicantede conscientizaçãocrítica, tanto na ordem dos produtos classificados comomidiáticos,quantonaordemdasatribuiçõesdegêneroeespéciespeloscanaisdecomunicação.Taisaçõespossibilitamdefiniçõesquanto aos conteúdos desses produtos ou seu valor enquantoconceito,conferindo‐lhesentidodiscursivo.Opressupostoédeque ações de caráter controlador ocorrem em ambientescorporativos – sejam eles uma biblioteca ou uma agência depublicidade, já, as ações de carátermais conscientizador, temmaiorchancedeocorrerememambientesinformais,nosquaisainformação circula de maneira livre, integrando sentidosinterativos, na configuração do que veio a se nomear de“IndexaçãoSocial”, expressãoque justificaousodaWeb comoconceitopromotordessaincursão.
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Voltandoàquestãodaclassificação,Langridge(1977)criaumpersonagem e, por meio da descrição de seu cotidiano,demonstraouso constante e,quase inconsciente,do raciocínioclassificatório na vida do homem. Esta premissa estabelece ovalordoprocesso classificatório na forma como o ser humanoconcebe o mundo e, por essa concepção, potencializa asatividadescotidianas,sejamelasnoterrenodeaçõesmundanasouprioritáriasdavida.EssaafirmaçãoresgataaobservaçãofeitaporJ.D.Foskett(1980)dequeoprocessomentaldeconstruçãodo conhecimento, fundamentado em Vygotsky, constrói osconceitos através da interação da consciência humana com osestímulosexternosquerepercutemnocérebroe,sendoporestereconhecidos, são encaixados em categorias hierarquizadasconformeosvalorese conhecimentospré‐existentesnopróprioindivíduo,receptordoestímulo.
UmprocessosimilarédescritoporParís(2004)naconstruçãodalinguagempelopensamento:“Omaisexatoseriadizerquealinguagem‘brota’dopensamento,quenãosótratadecomunicá‐lo,masdedar‐lhe forma.” (p.319).Àmercêdessepostulado,ohomem,comoanimalcomunicante, lançariamãoda linguagemparaexpressarereceber idéias/conceitosdeoutrem,utilizando‐se do processo de troca de mensagens para constituir‐se nainteração com o outro ou dele diferenciar‐se, constituindo‐seoutro indivíduo,numarelaçãotransacional,dialógica,pelaqualseumundosubjetivoprocuraintegraçãocomomundoobjetivo.
Aquestãoadvindadessa“construção”emduasvias,resideno fato de defender‐se certa autonomia do indivíduo – econsequente consciência/responsabilidade – dentro de umambiente em que seu senso crítico, assim como a noção deelemento reprodutor de um discurso representativo dedeterminadaclasseoutradiçãosocial‐profissional(umavezquenão se pode alienar o ser de toda série de influências queconstruíram sua personalidade durante todo período de
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interaçãosocial),encontraencorajamentoourefutação,conformea convergência ou divergência de suas leituras domundo e ocontextofavoráveloudesfavorávelàsmesmas.
Nesse sentido, as técnicas de ação comunicativa edramatúrgica utilizadas pelos mecanismos de propaganda eprodutos midiáticos de massa operariam suas estratégias depersuasão,baseando suasatividadesna confecçãodediscursosaparentemente integradosaosquesitos: realidadeenecessidadevital, tentando conseguir a adesão dos coletivos aos interessesque defendem. Essas técnicas a nosso ver potencializam ouesvaziamdiscursos,dependendodaconformidadedosmesmosaoquese instituichamarcomo“produtivo”.Surgeentãooutroquestionamento: o pensamento crítico sofre algum prejuízoirreparávelnesseambiente?Acreditamosquenão,aindaquenãosejafácilexpressá‐loeexercê‐lonessascircunstâncias.
Algumasdefiniçõesdedocumentário ede ficçãono campodoaudiovisuallevamemcontaavinculaçãomaioroumenordodiscursocinematográficocomoreal.Nichols(2005),ponderandosobreospressupostosdessadivisão,dizque:“Asensaçãodequeumfilmeéumdocumentárioestátantonamentedoespectadorquantonocontextoounaestruturado filme.” (p.64). Indoporessavia,existeaidéiadequeoindivíduo,especialistaounãoemalgumadessastradições,mesmosemainformaçãoantecipada–anomeaçãodogênero–seriacapazdereconhecernaexperiênciadoobjeto sua filiaçãonumaounoutra categoria.Aexperiênciadireta com o filme, apercepçãode suas tendências ou acentosestilísticospeloindivíduoocategorizariamdentrodeumaoudeoutra concepção, conscientizando‐lhe dos pressupostosanunciados e, forçando‐lhe uma tomada de decisão sobre osfundamentosdaproposiçãofílmica.
Aimportânciadessemecanismoesuarelaçãocomotrabalhoa que nos propomos residem na defesa de que os produtosculturais de teor mais aprofundado enfraquecem o domínio
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massificador,possibilitandoumavisãomaisabrangenteeefetivadomundo.
Essa percepção é vivenciada nas considerações com que oâmbito institucional‐científico trata o produto cultural e ainformaçãoestéticaqueosmesmoscontêm.AmesmadefesafoiassumidaporSilvaeGracioso (2010)no tocanteao“FenômenoTeatral” e sua representação pela Classificação Decimal deDewey (CDD).No caso do objeto “FilmeDocumentário”, essadiscussão avança ao se considerar que, nele, a imagem queregistra o fato é vivenciada de maneira mais intensa, porpossibilitarumamaioridentificaçãodelacomoobjetoreal,comoafirma Nichols (2005), ao reconhecer que a “[...] dimensãoindexadoradaimagemrefere‐seàmaneirapelaqualaaparênciadelaémoldadaoudeterminadaporaquiloqueelaregistra[...]”(p.65),ouseja,elapermitemaiorpossibilidadederepresentaçãodoobjetofísicopeloobjetoregistradonapelícula.
Não se quer dizer com isso que o registro documentárioapresenteo fato (oudeterminadarealidade)com isenção ‐umavez que se reconhece a precedência de um pensamentoidealizador (o realizador do filme) na sua representação domundo – o que se quer dizer é que nossa expectativa deencontrarmos melhor representação do mundo real, comoobservadop*rnichols(2005),éreforçadaporessaqualidadedaimagem em estabelecer relações entre as leituras subjetivasdomundo–feitaspelodocumentarista‐comosobjetosesituaçõesdomundoreal.
Oautorreconheceaindaadistinçãodovalor“científico”dofilmedocumentárioquandoobservaaexigênciaquefazaciênciano processo de investigação científica: neutralidade dopesquisador. Exigência que o “documentarista” não engajadonumdiscurso institucional jamaispoderá cumprir,porqueessaisenção, esse silêncio, pressupõe o sufocamento de uma
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subjetividade necessária, seja ela de caráter introspectivo ouextrovertido.
Aindexaçãosocialcomoprocessodeveiculaçãodoproduto“filme documentário” é mencionada por Ramos (2008) comoresultanteda interaçãoentrevárias forçassociais, regidas tantopelos produtores do documentário, quanto pelos seusrealizadores,alienandooespectadordessemecanismo,comosepercebe na seguinte afirmação: “Em geral, a narrativaDocumentária chega já classificada ao espectador, seguindo aintençãodoautor.” (p.27).Noentanto, ficaapergunta seessaquestão não mereceria um melhor aprofundamento frente àspossibilidadesdeintercâmbiopromovidaspelasredessociais,talqualseapregoapelasteoriaslevantadasemtornodoconceitode“indexação social” no âmbito da Ciência da Informação (CI),conhecido também como “Folksonomia” que prevê umdesengessamento dos processos de classificação e indexaçãoutilizadospelopoderinstitucional.
Hassan‐Monterodefine“indexaçãosocial”como
[…] un nuevomodelo de indización, en el que son los propiosusuariosoconsumidoresde losrecursos losque llevanacabosudescripción[…]Ladescripcióndecadarecursoseobtendríaporagregación,esdecir,unmismorecursosería indizadop*rnumerosos usuarios, dando como resultado una descripciónintersubjetiva y por tantomás fiable que la realizada por elautordelrecurso,einclusoporunprofesional.
Guedes e Dias (2009), por sua vez, justificam o uso da
expressão”indexaçãosocial”nocontextodaWeb[...] não apenas pelo fato da ação ser concretizada porindivíduos, mas também por ser um ato colaborativo edemocrático, onde o papel de todos os indivíduos tem omesmovalorepesodentrodosistema.
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ConclusãoPartindo das duas citações anteriores nos encaminhamos
paraafinalizaçãodessetrabalho,propondoque:‐ A indexação social, tanto no âmbito de uma defesa de
parâmetros de classes, grupos oumovimentos – configuradosaqui na ordem de tradições documentárias e suas vozes, ouobjetos culturais de outras ordens diversas – quanto naproposiçãodeações comunicantes libertáriasdegruposque semanifestam no ambiente das redes sociais, atua demaneira acriarcondiçõespositivasparaodesenvolvimentodoindivíduo.
‐ Que tais condições possibilitam aos objetos culturaisdesenvolve, ainda que prenhes de valor subjetivo, apossibilidade de construção de sentidos para seus grupos deinteresse.
‐Que o caráter subjetivo atribuído ao filme documentárionãoodestituidovalorde“documento”,registrodeumevento,fenômeno ou ponto de vista sobre determinado assunto, fato.Afirmando‐se que, pelo contrário, essa característica particularlhe outorgaum valor extra: a análise humanadedeterminadaocorrência,suaformaplenaderelacionar‐secriticamentecomoseventoshistórico‐sociais.
‐ Que a exigência de neutralidade científica,reconhecidamentenecessáriaemalgunscamposcientíficos,nãodeve obstruir o interesse da ciência pelos registros fílmico‐documentais na ordem de instrumentos capazes de apontarvisõesdomundohistórico,pertinentesdecientificidade.
O que se espera é que se valorem as ações de leituras domundosocialehistóricopelasóticascriativasesubjetivas,plenasdecompromissoderepresentaçãodeumarealidadepessoalouimpessoal,maspassíveldeocorrência.
Dessaperspectivaéquesepropõe ‐contrapondo‐seàvisãoinstitucional propalada pelos espaços oficiais ‐ os discursos
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disseminados em paralelo pelos espaços democráticos, sejameles coletivos ou individuais, como promocionais de umaconstruçãomaisequilibradadossensoscríticosem formaçãoe,quemsabe,reabilitadordosemprocessodedeformação.Referências
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ACiênciaCívicaeasMudançasClimáticas:construindoumdiálogo.
MariaLuísaNozawaRibeiro
ThalesHaddadNovaesdeAndrade
Introdução
EstetrabalhobuscarelacionarocampodeEstudosSociaisdeCiênciaeTecnologia(CTS)comaáreadeMudançasClimáticas,inserida nas Ciências Sociais. O texto “Civic Science forSustainability:ReframingtheRoleofExperts,Policy‐MakersandCitizens in Environmental Governance” de Karin Bäckstrandserá utilizado como fio condutor desta análise, incorporandotambém outro autor importante para a o campo CTS,WalterAntônioBazzo.
O texto principal deste trabalho discute a noção deCiênciaCívica, o que nos remete imediatamente à questão ambiental,considerandoqueseusdebatesdentrodaSociologiaedaCiênciaPolíticasecaracterizamporumaanálisedacontribuiçãodecadaumindividualmenteouemgrupoparaasMudançasClimáticas.Essas análises se fundamentam no princípio deresponsabilizaçãodepartedosimpactosambientaisocorridonosúltimos anos, devido a industrialização e seu processo dedesenvolvimento humano acelerado. O desenvolvimentoapresenta‐sedesprovidode consciência e tentativadeprevisãodaspossíveisconsequênciasdeseuprocesso.Onossomodelodedesenvolvimentoextraidanatureza,mais recursosdoqueestateria a capacidade de repor, segundo pesquisas atuais, aliberaçãodepoluiçãonoar,naterraenaságuasdoplanetaestãodestruindosuacapacidadedesuprirnossasnecessidadesvitais.
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Nestecontexto,umsociólogosurgecomanoçãodeSociedadede Risco, Ulrich Beck. Parte deste termo se refere a nossasociedademoderna, que inicialmente é caracterizada por umagrandeespecializaçãoprofissional,oqueocasionaumaconfiançanecessárianos técnicos.Contudo,estaconfiançase tornamuitofrágilquando,nasegundametadedoséculoXX,sepercebequeesses conhecimentos antes confiados a uma elite científica nãogeramnecessariamenteresultadospositivosparaasociedade.
Anteriormente, acreditava‐se em uma produção científico‐tecnológicacomopositiva,comoumavantagememsi,queestavaisenta de influências ideológicas, políticas, sociais, econômicas,entreoutras.SegundoBazzo (2003),apartirdasdécadasde60e70, a produção científica‐tecnológica passou a ser reconhecidacomoprovidade influênciasmorais,religiosas,econômicaseetc.dospesquisadores,assimcomopassou‐seanotaraexistênciadepossíveis resultadosnegativosda aplicaçãodamesma, como asarmasatômicas,posteriormenteosconhecimentossobreproduçãoalimentar,controlededoenças,etc.
Comaconsideraçãodestasinfluênciasnaproduçãocientífica‐tecnológica, podemos então legitimar o questionamento deelaboraçãodepolíticaspúblicas,jáqueestassãofundamentadaspeloprincípiodequeoEstadodeveparticipardoprocessodeescolha e aplicação da produção científica (no caso através depolíticaspúblicas), assim como a comunidade leiga, atravésdaparticipação pública. O nosso contexto aponta paraconsequênciasdesastrosasparaomeioambienteadvindasdestavisãoda“ciênciaautônoma”,deumatotalentregaaoscientistasas tomadasdedecisões relacionadas asproduções científicas etecnológicas. Portanto, aponto que há uma necessidade deavaliaçãodestenovocontextodeproduçãocientífica‐tecnológicadentro de ações de governos, compromissada com o âmbitosocial e ambiental destas produções, sendo a sua efetividadepassandoporessecompromissocomassuasconseqüências.
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“No campo da política pública, os estudos CTS têm defendido aregulaçãosocialdaciênciaeda tecnologia,promovendoacriaçãodediversos mecanismos democráticos que facilitem a abertura deprocessosdetomadadedecisãoemquestõesconcernentesapolíticascientífico‐tecnológicas”(BAZZO,2003:127).
CitandoGarrafaeBerlinguer,Bazzoexpõeque
“(...)oempreendimentodeformasdecontrolesocialdaC&Tconstitui‐se,alémdeumametademocrática,numaquestãofundamentalmenteética. Somente a construção de mecanismos que permitam aoscidadãos apropriar‐se de informações sobre C&T e inserir‐se emcontextos de tomada de decisões políticas poderá impedir novasformasdeexclusãosociale,atémesmo,deescravidão.Contudo,essecompromisso,emfavorprincipalmentedasfuturasgerações,deveserconfiado,mais do que às leis, à necessidade de evoluçãomoral denossasociedade”(BAZZO,2006:3).
AquestãodaCiênciaCívicadentrodocampoCTSeMudançasClimáticas
Para iniciarmos a discussão, precisamos passar por umadefiniçãodoqueseriaocampodeEstudosSociaisdeCiênciaeTecnologia (CTS).Esteabrangeestudos sobreos fatores sociaisinfluenciando a ciência e a tecnologia, assim como asconsequênciassociaiseambientais.Navisãoclássica,aciênciaea tecnologiaeramconsideradasmodosneutroseautônomosdeprodução de conhecimento, de conquista da natureza semprevoltadoparaobemestardasociedade, restritosaumpequenogrupodeespecialistas.Amelhoravaliaçãodeste conhecimentoseriaafeitapelosseuspares,ouseja,pelosprópriosespecialistas.Durante e logo após a SegundaGuerraMundial, acreditava‐secegamente na legitimidade dos cientistas, e nas vantagensincontestáveisdodesenvolvimentode tecnologiase incentivoàciência, tirando o papel da política neste processo. Isso
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principalmente por causa de demanda militar, de embate depoder.
Ainda segundo Bazzo, podemos citar que os movimentoscontra‐culturais,anti‐sistemasurgidosnoperíododaGuerradoVietnã incitaramumavisãocríticacom relaçãoa tecnologiaeatecnocracia,dandoenfoqueàssuasconseqüênciasnegativasparaarelaçãoentreestadosevoltadasparaadegradaçãoambiental.Então, na década de 60 e 70, surgiram correntes críticas aomodelolinear,buscandoumapolíticacientífico‐tecnológica.
Esse campo surge com a proposição de uma forma maisdemocrática deste processo, em todos os seus âmbitos,enfatizando a interdependência dessa complexa tríade. Ocontextosocial interferenaelaboração,produçãoeaplicaçãodetecnologias, as quais não seriam possíveis sem a produçãocientífica,quepor suaveznãoexistiriae sedesenvolveria semtecnologias específicas, e por ai em diante.Considerando essarelação e a interferência de questões políticas, ideológicas,econômicasesociaisnaproduçãoeaplicaçãodaCT,passou‐seadarmais atenção ao âmbito social, propondo uma política deciência e tecnologia mais intervencionista, lançando mão detécnicasparaavaliarosimpactossociaiseambientais.
“Aocolocaroprocessotecnocientíficonocontextosocialedefenderanecessidade da participação democrática na orientação de seudesenvolvimento,osestudosCTSadquiremumarelevânciapúblicadeprimeiramagnitude”(BAZZO,2003:9).
Neste mesmo período que surgem os movimentos
ambientalistas,dando enfoque àdimensãodas ações humanassobreoplanetaTerra, assim comoos estudos sobreMudançasClimáticas. Apenas para contextualizar, segundo oIntergovernmental Panel of Climate Change (IPCC),MudançaClimáticaabrangequalquermudançanoclimadaTerra,causadopelavariabilidadenaturalouaçãohumana.Contudo,naQuarta
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Convenção das Partes – COP (1997), quando se elaborou oProtocolodeKyoto, sedelimitou essamudança como causadaexclusivamentepor ações humanas, e que geraria impactos naatmosfera em escala global. Dentro da discussão ambiental,podemos apontar que as responsabilidades pelas mudançasclimáticas são provocadas pela sociedade que, a partir de seusistema econômico,utilizaos recursosnaturais egera resíduospoluentes,semconsideraroslimitesdanatureza.Anossaformade relacionamento com a natureza não tinha sido posta emquestãoatéentão,devidoanossaincapacidadedepercepçãodoníveldevastadordenossasaçõessobreela.
Asdiscussõessobremudançasclimáticasvêmocorrendonasúltimas 4décadas, e se alarmaramdevido aos sériosdesastrescausados pelo aquecimento da temperatura da Terra. Jornais,centros de pesquisa ambiental e programas interdisciplinaresforam criados em diversos países da América Latina, todospreocupadoscomoâmbitolocal,regionalenacionaldaquestãoclimática (GIDDENS, 2009).O problema em questão apresentacaracterísticas incomuns, devido ao seu alcance em escalaplanetáriaeàssuasconseqüênciasseapresentarem,emgeral,alongo prazo e necessitarem políticas também a longo prazo.Essesperigos sãoabstratos, irreais edifíceisde compreender edefinir,apesardaconsciênciadeseupotencialdevastador.
Podemos, então, apontar o sociólogo Ulrich Beck comoimportantenaelaboraçãodanoçãodesociedadederisco.Dentrodas discussões ambientais, podemos apontar a noção de riscocomo norteadora.Os riscos podem se associar à utilização daterra, aos modos de produção e utilização dos recursosambientais e suas conseqüênciaspodem afetar oplaneta comoumtodo.Oriscoserefereaumapossibilidadedeocorrênciadeum fenômeno,easpolíticassempresevoltamparaesse termo,na intençãodedesenvolverprojetosevoltarseus investimentosparagerirofuturo,queéincerto.Nasultimasdécadasdoséculo
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XX, as discussões se voltaram para os perigos de desastresambientais,apopulaçãopassouadepositara sua confiançadesolução dos problemas na ciência, o que gerou, portanto, anecessidadedeumplanejamento.
CitandoCerezoeLuján,
“A caracterizaçãoda sociedadede risco conta também,porpartedeseu fundador,comum importantequestionamentodosprincípiosdaciênciaedatecnologiamoderna.Dessaótica,vivemosnumasociedadede risco por conta de nossa cultura industrializada e da contínuainserção de inovações científico/tecnológicas em nossomeio social.Essas inovações têmcriado,constantemente,novas formasderiscoeimpõeumapericulosidadequalitativamentedistintadaquevivemosnopassado.Essesriscosseriamdanos (potenciaisoureais)aosquaisestamosnossubmetendoporcontadenossarelaçãocomC&T,equeestão sendo democraticamente distribuídos já que não respeitamfronteirasdepaísesoudeclasses”(BAZZO,2006:4).
Partindo entãopara a análisedo textodeKarinBäckstrand
(2003),sobreCiênciaCívica,podemosapontarqueesteseinserena áreadaparticipaçãopúblicana ciência,dentrodosEstudosSociais de Ciência e Tecnologia. Resumidamente, a autoradefendeumamaiorparticipaçãonabuscapelasustentabilidadepor parte das comunidades científica e tecnológica somada aoutros atores não estatais. Expõe a necessidade de uma buscapor mudanças no sistema de expertise científica para maiortransparência, maior democracia e mais responsabilidade,combatendo a cientifização dos políticos, propondo umadeliberação democrática contrariamente ao conhecimentotécnico,pararesolverproblemassociaisepolíticos.
A noção de Ciência Cívica passa pela defesa do papel daparticipação pública no uso e produção do conhecimentocientífico, considerando que os cidadãos teriam interesse empolítica científica, área que não deveria ser definida comoexclusiva dos especialistas e policy‐makers. As indagações por
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parte dos leigos passam pelas questões da biotecnologia,tecnologiareprodutiva,oarmazenamentodesubstânciastóxicasedosresíduosnucleares,mudançasclimáticaseoprojetogenoma.
NoâmbitodasMudançasClimáticas,biosegurançaerecursosnaturais, o conhecimento especializadoparticipativo também édemandado. O crescimento de regimes ambientais globaisapresentou a necessidade de uma extensão dos parecerescientíficos locais para uma avaliação científica multilateral.Surgiu então, a dúvida de como conciliar o conhecimentoespecializado e aparticipaçãopública na ciência.A autora vaidesenvolvendoumaanáliseaolongodotextonabuscaporsanaressequestionamento.Partindodomodeloclássico,aBäckstrandelabora ummodelo baseado na tríade entre cientistas experts,policy‐makersecidadãos.Ocidadãonãoseriaummeroreceptordepolítica,massimumatordentrodarelaçãopolítica‐ciência,oconhecimentocientíficopode serconcebido,portanto,comoumbempúblicoglobalnoqualoscidadãosdevemterparticipação.
A Ciência Cívica adveio dos estudos das RelaçõesInternacionais,edeinícioabordavaosaspectosinstitucionaisdaconsultoria científicanapolíticaambientalglobal,eatualmentesãoosórgãosconsultivoscientíficosetécnicosinternacionaisquedão a entrada para negociações ambientais internacionais. AAscensão da “ciência negociada” é uma característicaproeminentenos esforçosdiplomáticos em curso associados àsmudançasclimáticas,apoluiçãoatmosférica,abiodiversidadeedesertificação.Aassessoriacientíficaexercegrande importânciasobreosprojetosinternacionaisacercadaquestãoambiental.Osestudos das Relações Internacionais excluiam a teoria socialassim como a noçãodepolítica excluia opúblico, construindoumcontextonoqualademocracianãoestariasendoaplicadanoprocesso de governança no que diz respeito às políticasambientais, dando apenas enfoque para o conhecimentoespecífico.
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Construindoumarelação,Giddens(2009)põeemdiscussãoanecessidadededecisõeseestabelecimentodemudançasnoníveldacoletividade,dequetemossemprequelevaremconsideraçãoa dimensão global das causas e conseqüências dasmudançasclimáticas, contudo, não desconsiderando as iniciativasindividuais. Podemos apontar a relação com os debates sobreparticipação pública, já que ambas linhas defendem umaparticipaçãocoletiva,comsuabagagemsócio‐histórica,nabuscapor soluções mais democráticas. O domínio da produção edecisão de conhecimento científico por parte de uma elite setransformaesetornaperceptívelumarelaçãodepoder,expressonafrasedeBäckstrand:“Thetop‐downmodelofenvironmentalproblem‐solvinggrantspower tonetworksofscientificexperts,specialists, and bureaucrats in environmental science”(BÄCKSTRAND;2003:6).
Fazendoumparalelocomadiscussãosobreconcentraçãodepoder,LadislauDowbor(2007)analisouquenocontextoatual,amídia seutiliza e explora o assuntodo aquecimentoglobaldeforma mercadológica e não no intuito de conscientizaçãopopular. O autor aponta uma necessidade de mudança nasestruturasdepoder,sendoesteconcentradosobocomandodospaíses desenvolvidos.Apresenta‐se então, uma necessidade deabertura para discussões que apresentem pontos de vistadiversosnocenáriomundial(diferentescontextosemdiálogo).
Em complemento,no textodeValério eBazzo (2006), citamDorea e Segurado, que definem osmeios de comunicação demassa de “quarto poder” na sociedade, sobretudo por suacapacidadedeproduzirmodosdevidaedinâmicassociais.
“Segundo essas autoras, a mídia destaca‐se como um potentedisparador de processos de subjetivação, porque investe comoninguém no cotidiano de cada indivíduo, podendo adequarcomportamentosemaneirasdepensardeacordocomseusinteresses.Assim,faz‐senecessárioeprementequeadivulgaçãocientíficapasse
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rapidamente a contemplar tais capacidades” (VALÉRIO, BAZZO;2006:6).
Adivulgaçãocientíficaseriaumcampodeexposiçãopública
de conhecimentos,pressupostos, valores, atitudes, e o que nosinteressa, funcionamento da CT. Essa circulação de idéiasjuntamentecomosresultadosdaspesquisas,servemparaavaliaro impacto do assunto na sociedade, através de livre debate econfrontodeopiniões.
A Ciência Cívica foi definida como esforços por parte doscientistas em se comunicar com o público, divulgando osresultados científicos no intuito de contribuir para a literaturacientífica. Existem controvérsias a respeito da capacidade doscidadãos leigosdedeliberaremassuntoscientíficos,específicos.Dentro desta ciência, os autores se indagam se os leigosdeveriam deliberar sobre a aplicação da CT ou se engajar naformulação de problemas científicos, se o conhecimento leigodeveria se limitar ao agenciamento dos riscos ou participarativamentedoprocessodeassessoria.
Nadécadade1990,acrença indiscriminadana legitimidadedaproduçãodeciênciaporpartedosespecialistascaiuporterra,havendo, portanto, uma busca pela produção científica comofornecedoradebases firmespara justificar e construirdecisõespolíticas críveis.Mas se percebeu que emmuitas áreas, essesconhecimentos podem ser incertos, incompletos ou apenasprevisões.“Whenthepublicexperiencesthatsciencecanbebothcontested and uncertain, the policy‐process, which relies onpurportedly objective knowledge, loses credibility”(BÄCKSTRAND;2003:7).
Dando continuidade, aCiênciaCívica se caracteriza atravésde trêspremissas,adequeadisseminaçãodacompreensãodaciênciaaopúblicopodediminuiroencantamentocomrelaçãoàexpertise científica; a de que a complexidade dos problemas
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ambientaisglobaisnecessitaumareflexãoquesomeaexpertisecientífica e o conhecimento tradicional, leigo e por fim, buscaestender os princípios da democracia para a produção doconhecimentocientífico.
Acomplexidadeaceleradadosproblemasambientaisglobaisgeraumaindeterminação,quemoveanecessidadedeumanovaciência,ocontroledanaturezapelocientistaaumenta,contudo,as incertezas e os riscos permanecem. As discussões sobre oambiente global sempre se caracterizaram como incertas, apolítica surge, portanto, como substituta da certeza, sendo oprocessopolíticoaberto, transparenteepromotordeumaauto‐reflexãonabuscaporsolucionarincertezascientíficasesuperaravulnerabilidadeecológica.“However,due to theuncertaintyoffuture environmental outcomes, possible surprises andecological catastrophes, a multiplicity of perspectives canpreventthenarrowingofalternatives”(BÄCKSTRAND;2003:9).
Ao fim de sua análise, a autora propõe discutir sobre aCiênciadaSustentabilidade,aqualarticulaumaciênciaproativa,transparente e interdisciplinar, demanda vinda da sociedade,sendo a chave de compreensão da interação dinâmica einterdependência entre natureza e sociedade. Rompe com aslacunasdoconhecimentopresentesnarelaçãoentreospaísesdoNorte e do Sul, e promove aos países em desenvolvimento,estrutura para participar do debate científico com maiorescondições de igualdade. A relação entre o global e o local érelevante no âmbito da ciência da sustentabilidade, oconhecimentoglobalsobredegradaçãoambientaldevedialogarcom o conhecimento local para a produção de soluçõessustentáveis. O conhecimento universal, juntamente com oconhecimento local formariam uma parceria equitativa egerariam aprendizadomútuo.Contudo, o focomaior seria naparticipação e não nas mudanças do sistema e de regras do
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sistemadeprodução,utilizaçãoecomunicaçãodoconhecimentocientífico.Consideraçõesfinais
A partir da relação estabelecida no desenvolver do texto,entreocampoCTS,maisespecificamentecomrelaçãoànoçãodeCiência Cívica, entrando na discussão acerca da participaçãopública, e as discussões ambientais podemos fazer algunsapontamentos.
Aaltamodernidade,comodiriaGiddens,nosapresentacomoumcontextodealtodesenvolvimentodaciênciaedatecnologia,juntamente com uma condição de incerteza. Por um ladobuscamosmaior investimento em CT paramelhorar ao nossobem‐estar,poroutropercebemosqueosprópriospodem trazerconsequênciasnegativasparaanossacondiçãodeserhumano,enumâmbitocoletivocomosociedade,principalmenteemrelaçãocom a natureza. A nossa busca por desenvolvimento trouxedesmedidas consequências ambientais, as quais temos queaprender a lidar. E a política como promotora de formas deenfrentamento tem se apresentado como necessária cada vezmais.Contudo,apolíticaestabelecida,principalmenteempaísesemdesenvolvimentose/ousubdesenvolvidosnãoseapresentamtotalmentedemocráticas.
Surge então, a necessidade de um debate coletivo,interdisciplinar, inserindo além dos “experts”, os leigos e osportadores do conhecimento tradicional. Isso, principalmentepelo fatodequeos leigos estão inseridosnamesma sociedadedosespecialistas,sãoafetadosigualmenteoumaisdoqueestes,pelas tomadas de decisão, pelas políticas públicas, pelasassessorias, entre outras ações. Apesar de desprovidos dodiscurso legitimado, do domínio do conhecimento específico,essaparcelamajoritária,temcondiçõesdeparticipardosdebates
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sobreosrumosdesuasociedade,deseumeioambiente,desuacultura,de suapolítica eprincipalmentepolíticas ambientais ede CT. O conhecimento tradicional pode também, contribuirpara este debate, levando em consideração o princípio deigualdadederelevânciadeconhecimentos.
“Public questioning of science constitutes a healthy feature ofdemocracy,andcallsfortransparencyinsciencedonotautomaticallyrepresent an anti‐scientific position. A democratic model of civicsciencewillenhanceactivecitizenry,publicengagementandscrutiny”(BÄCKSTRAND;2003:12‐13).
Complementando,
“Vivemos mais e melhor por conseqüência de inovaçõescientíficas/tecnológicas, cujos aparatos significam, muitas vezes,facilidadesebenefíciosparaosucessodenossaexistência.Porém,porconta dessasmesmas inovações, vivemos também num contexto deincertezas e dúvidas: os benefícios da C&T dificilmente se fazemdemocratizados e, assim, ensejam possibilidades de dominaçãoeconômica e cultural; seus riscos, pelo contrário, atingem a todos eassociam‐se amazelas sociais insustentáveis” (VALÉRIO e BAZZO;2006:7).
A citação “Os desafios principais do planeta não consistem
em inventar um chip mais veloz ou uma arma eficiente:consistememnosdotarmosdeformasdeorganizaçãosocialquepermitamaocidadãoterimpactosobreoquerealmenteimporta,em gerar processos de decisões mais racionais” (DOWBOR,2007:107), pode ser aplicada no contextoCT&S, relacionadoÀnecessidade de uma organização coletiva, dos especialistascientistas,dos tecnocratas,doEstadoedos leigosnabuscaporsoluções objetivas e que tenham impacto sobre questõesrealmenterelevantes.Sendoosafetados,participantesativosnasdecisõessobresuasprópriasvidasdiretamente.
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Bäckstrandbuscaumademocratizaçãoda ciência,abrindoodebateantes concentradoemuma“elite científica”.Buscaumaciência mais efetiva, não considerando necessariamente queexista alguma forma de conhecimento mais correta, tanto acientífica,comoaleiga.ReferênciasBÄCKSTRAND,K.Civicscienceforsustainability:reframingtheroleofexperts,policy‐makers,andcitizensinenvironmentalgovernanceglobalenvironmentalpolitics,v.3,n.4,p.24‐41,nov2003.
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209
Logísticahumanitária:conhecimentosetécnicasaserviçodacomunidade
MarthaReginaBortolatoCardoso
WandaAparecidaMachadoHoffmann
IntroduçãoO ambiente atual em que vivemos, segundo Valencio et al
(2004), é resultado de uma produção de cunhom*odernizantequanto à expressãomaterial de crescimento e conservador emsuas práticas políticas. O corpo técnico e político, que são osplanejadores das cidades, desconsiderou os processosambientais, subjugando e destruindo os sistemas bióticos eabióticos em que a população se assenta. Se concentrando nasexpressõesmateriaisdo fazer, relegouanecessidadede refletirsobre como tais projetos de ocupação humana se tornariamameaçasasuavulnerabilidade.
Aemergênciadamodernidadedeverianoslevaraumaordemmaissegura,noentanto“Omundoemquevivemoshojeéummundocarregadoeperigoso”(GIDDENS,1991,p.19).Vivernouniversodaaltamodernidade proporcionada pelos avanços da ciência e datecnologiaé,segundoGiddens(2002,p.104),“vivernumambientedeoportunidadeseriscos”. Oautoratentaparaocontrolehumanodosmundos natural e social, onde o universo dos eventos queocorrerãono futuro está abertonopresente a sermoldadopelohomem,dentrodelimitesreguladospelaaferiçãoderiscos.
Dentro desse contexto, Ciência, Tecnologia e Sociedadeprecisamcaminhar juntasafimdeproporcionara talregulaçãoadequada. SegundoDagnino (2002),arazãodeserdapolíticadeCiênciaeTecnologia (C&T)éestimularacapacidadedeum
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sistemaparatransformarconhecimentoemproduçãoqueatendaasdemandassocioeconômicas.
O modus operandi da sociedade, baseado nas expressõesmateriais do fazer, revela contradições à medida que umimportante conjunto de fenômenos naturais vem ganhando ostatus de ameaça. As severas precipitações pluviométricasobrigamoscitadinosarepensarrapidamenteseusfixosefluxosdiante das perspectivas de danos humanos, materiais eambientaispassíveisdesofrereassistir.(VALENCIOetal,2004)
DeacordocomKobiyama(2010) fenômenosnaturaispassamaser vistos como desastres naturais quando geram danos asociedade.Amagnitudedesseseventosnão seelevadevidoàsmudançasno clima,mas sim,por fatoresantropogênicos comoos inerentes à própria urbanização inadequada. Segundo oautor,seosdesastresocorressemapenaspor fatoresclimáticos,nãohaveriamais solução.Felizmente amaioriadesses eventosadvém de causas humanas e assim é passível de solução,corrigindo‐seasaçõesinadequadasdohomem.
Épossívelqueaatualrotadecolisãoentreeventosadversosno clima e nosso modelo de urbanização, continue gerandodesastres.Dentrodessaperspectiva, a logísticavem atravésdeseus conhecimentos e técnicas oferecer propostas que visematenderasociedadedeformaamitigarosefeitospotencialmentedanososqueumdesastreocasiona.
CondicionantesdaLogísticaHumanitária
ALogísticaHumanitáriasefaznecessáriaquandoasociedadeseencontraàsvoltascomaocorrênciadeumdesastre,envolvetodaacomunidade, tantoapopulaçãoafetadapelosefeitosdosdesastres como os indivíduos, entidades e instituições(governamentais ou não) que se colocam a serviço, prestando
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assistência às vítimas, visando à redução dos danos, perdas eprejuízosocasionados.a)Desastres
ConformeCastro(2002)desastreécompreendidocomoo:
Resultado de eventos adversos, naturais ou provocados pelohomem, sobre um ecossistema (vulnerável), causando danoshumanos,materiais e/ou ambientais e conseqüentes prejuízoseconômicosesociais.
É proposta pela International Federation of Red Cross andRedCrescentSocietiesaseguinteequação:
Vulnerabilidade+Perigo=Catástrofes
Capacidade
Ouseja,todavezquetivermosumambienteondeseencontreuma população exposta a vulnerabilidades e nesse ambienteocorrerem eventos ambientais extremados, se a capacidade desuportaraesseseventosnãoforadequada,ocorrerãocatástrofes.
DeacordocomCastro(2002)catástrofessão:
Grandedesgraça,acontecimento funestoe lastimoso.Desastrede grandes proporções, envolvendo alto número de vítimase/oudanosseveros.
ADefesaCivildoBrasil codificaosdesastres em três tipos:naturaisaquelesquedependemexclusivamentedadinâmicadoplanetacomoterremotos,vulcõesentreoutros;humanosaquelesde natureza tecnológica, social ou mesmo biológica comoacidentes,guerraseasepidemias;eaindaosmistosaquelesem
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queaaçãohumanapotencializaascausasnaturaiscomochuvasácidasedesertificação.
b)ComunidadeAfetada
Compilando dados da Secretaria Nacional de Defesa Civilparaoanode2010encontramos893municípiosquenotificaramaocorrênciadeeventos.ComdestaqueparaosestadosdeSantaCatarina,RioGrandedo Sul,Riode Janeiro ePiauí, contandorespectivamente com 155, 136, 132 e 113municípios afetados.Apenas Acre, Amapá, Roraima e Tocantins não apresentaramnenhumregistrodeocorrências.
OQuadro 1 apresenta a freqüênciademortos, afetados e onúmerodemunicípiosemcadaestadoondeocorreuregistro.
Quadro1.Númerodemortos,deafetadosedemunicípiosporestadoem2010Fonte:adaptadodaSecretariaNacionaldeDefesaCivil
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Observa‐se peloQuadro 1 total de 158mortos e 12.082.794pessoasafetadasdealgumaformaporalgumtipodedesastre.Amaiorpartedasocorrênciasestárelacionadaaeventosclimáticoscomo chuvas intensas, tempestades, vendavais, enchentes,inundações, deslizamentos, erosões, estiagens e seca entreoutros. Houve raros registros de abalos sísmicos, incêndiosflorestais, ocorrências biológicas como a Salmonelose, oudesastre propriamente humano como incêndios em plantasindustriais,porexemplo.
Segundo Guha‐Sapir; Vos; Below (2011) a ocorrência decatástrofes a nível mundial encontra‐se dividida da seguinteforma:34,8%dasocorrênciasnaÁsia;25,2%naAmérica;18,2%naEuropa;17,9%naÁfrica;e3,9%naOceania.Deacordocomorelatório, em toda América foram observados mais eventos,vítimasedanosemrelaçãoàmédiaanualdaultimadécada.Onúmero de ocorrências para 2010 foi de 97 enquanto amédiaanualde 2000‐2009 erade 92, o númerode vítimaspassoudeaproximadamente 7,09milhõespor anopara 12,10milhões em2010, os danos estimados em 43,69 bilhões de dólares (2009)anuaischegarama56,84bilhõesdedólares(2010).
c)ComunidadeEnvolvidaEmgeralquandoocorreumdesastreaentidaderesponsável
na maioria dos países é a Defesa Civil e no Brasil ela estápresenteemtodososestados.ADefesaCiviléquecoordenaosesforços de todos os órgãos governamentais e as demaisorganizaçõespúblicasouprivadas,eaprópriacomunidade,paraoplanejamentoeaexecuçãodemedidasdesdeaprevenção,osocorroàspopulaçõesafetadasatéorestabelecimentodaordemebemestarsocial.
Quando a intensidadeda ocorrência extrapola a capacidadede um país de responder adequadamente às necessidades
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geradas, diversos órgãos e instituições internacionaisgovernamentais ou não, podem oferecer auxilio objetivando amitigaçãodosdanosgeradospeloevento.
AOrganizaciónPanamericanadeLaSaludatravésdoManualparaelManejoLogísticodeSuministrosHumanitáriosapresentaos principais organismos internacionais que atuam emocorrênciasdedesastres,quesão:‐ÓrgãosvinculadosaONU:ProgramadasNaçõesUnidasparao Desenvolvimento (PNUD), Departamento de AssuntosHumanitários(OCHA),ProgramaMundialdeAlimentos(PMA),Alto Comissionado das Nações Unidas para os Refugiados(ACNUR),FundodasNaçõesUnidasparaaInfância(UNICEF),OrganizaçãoMundialdaSaúde/OrganizaçãoPan‐AmericanadaSaúde(OMS/OPS).‐ Outras agências multilaterais: Organização dos EstadosAmericanos (OEA), Agência do Caribe para Assistência aDesastres (CDERA), Centro para Prevenção de DesastresNaturais na América Central (CEPREDENAC), Oficina deAssistênciaHumanitáriadaComunidadeEuropéia(ECHO).‐Agênciasgovernamentaisoubilaterais:OficinadoGovernodosEUAParaDesastresnoExterior(OFDA‐AID),AgênciaJaponesade Cooperação Internacional (JICA), Agência Alemã deCooperação (GTZ), Agência Sueca de DesenvolvimentoInternacional(SIDA).‐ Principais organizações não‐governamentais: Movimento daCruzVermelhaedoCrescenteVermelho(presenteemdiversospaíses), Comitê Internacional da Cruz Vermelha (federaçãointernacional), CARE (organização estadunidense), CARITAS(braçosocialda igrejacatólica),MédicosSemFronteiras–MSF,OXFAM (organização britânica), Ação Contra a Fome –ACH(organização européia), Exército de Salvação (organizaçãoreligiosa),ConselhoMundialdasIgrejas(envolveigrejascristãseortodoxas).
215
Logística
“A logística empresarial associa estudo e administraçãodosfluxosdebenseserviçoseda informaçãoassociadaqueospõeemmovimento”(BALLOU,1993,p.23).Paraoautoramissãodalogísticaédisponibilizaroprodutoouserviçocerto,no lugareinstantecorretos,nacondiçãodesejadaaomenorcustopossível.
Nogueira,GonçalveseNovaes(2007)entendemoobjetivodalogística humanitária como o de vencer tempo e distância namovimentaçãodemateriaiseserviçosdeformaeficienteeeficazaserviçodacomunidadeafetada. a)LogísticaEmpresarialversusLogísticaHumanitáriaPara Ballou (1993) as atividades primárias da logística são:
transporte,manutençãodeestoqueeprocessamentodepedidos.Bowesox e Closs (2004) complementam considerando comorecursos logísticos: informação,previsões,estratégiadeestoque,gerenciamento de estoques, infra‐estrutura de transporte,gerenciamento de transporte, gerenciamento de depósitos,movimentaçãodemateriaiseembalagem.
Os recursos logísticos apresentados pelos autores para aLogística Empresarial (LE) podem ser aplicados à LogísticaHumanitária(LH)respeitandoalgumasespecificidadesinerentesasituaçõesemergenciais.Informação: LE – pedidos de clientes e ressuprimento,
necessidades de estoque, programação de atividades dosdepósitos, documentação de transporte e fatura. LH – deveseguir os mesmos padrões, porém pode haver dificuldadestecnológicas.Previsões: LE – projeção de valores ou quantidades que
provavelmente serão produzidas, vendidas ou expedidas,
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elaboradasporitens,clientesougruposdeitenseclientes.LH–dificuldadesdeprevisãooumesmodiagnósticodedemanda.Estratégia de estoque: LE – nível de estoque acarreta várias
atividadeslogísticas.Estoquebaixopodeprejudicaromarketingou aprodução, estoque alto acarreta aumentode custos.LH –suprimentossolicitadosouadquiridos,ouaindadoados,quandoem excesso prejudicam a logística e quando escassos nãoatendemadequadamenteasvítimas.Gerenciamento de estoque: LE – considerações de natureza
estratégica requer o desenvolvimento de um processoenvolvendováriosprodutosemmaisdeumlocal.LH–sistemasde controle e monitoramento dos suprimentos na cadeia deassistência.Infra‐estrutura de transporte: LE – variedade de alternativas
desde a contratação de um serviço eventual, ter seu própriotransporte ou fechar vários contratos com diferentestransportadores especializados. LH – envolve duascaracterísticas importantes: as características do que serátransportado e as possibilidades do tipo de transportedisponível,custoseaindacondiçõesdeacesso.Gerenciamento de transporte: LE – custo e valor do serviço,
fretes e taxas especiais, responsabilidades, atividadespertinentes, avaliaçãodas transportadoras edocumentaçõesdetransporte.LH–podehavercontrataçãodetransportecomercialou disponibilização de transporte por organismosgovernamentaisounão‐governamentais.AsresponsabilidadesedocumentaçãoétalqualaLE.Gerenciamento de depósitos: LE – engloba sistemas de
processamento, centros de distribuição, terminais deconsolidação e instalações break bulk e cross‐dock. LH –processamentos ocorrem conforme a disponibilidade da infra‐estrutura local do centro de distribuição até aos postos deatendimentoàsvítimas.
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Movimentação demateriais:LE –omanuseiodeprodutos é achave da produtividade de um depósito, envolve grandequantidadedemão‐de‐obra,eaindaépoucoinformatizado.LH–necessitaseradministradoporapenasumapessoaeérealizadobasicamentecommão‐de‐obravoluntária.Embalagem: LE – diz respeito à proteção contra avarias,
manuseiodemateriaisetransmissãodeinformação,alémdesuautilização como dispositivo de unitização de cargas. LH – osmesmospadrõesrequeridospelaLEsãoobservados,destacandomaioratençãoasinformaçõescontidasnaembalagem.
Algumas outras características da logística empresarialconfrontadas com a logística humanitária se encontram noQuadro2.
Temas LogísticaEmpresarial LogísticaHumanitáriaDemanda Estável, locais e
quantidadespré‐fixadas.Sóestimadaapósaocorrência.
Leadtime Determinado pelasnecessidades dofornecedor aoconsumidor.
Praticamente zero entre aocorrência da demanda e anecessidadedamesma.
Centros dedistribuição
Definidas em termos denúmeroelocalização.
Desafiadora pela necessidadedesconhecidadademanda.
Controle deestoques
Métodos definidos porlead time, demanda eníveisdeserviço.
Desafiador pela grande variaçãoda demanda e localização damesma.
Sistemas deinformação
Bem definidos e de altatecnologia.
Poucoconfiáveis, incompletasouinexistentes.
Objetivos Qualidade ao menorcusto para satisfazer ocliente.
Minimizar perdas de vidas ealiviarsofrimento.
Foco Produtoseserviços. Pessoasesuprimentos.Quadro 2. Características da Logística Empresarial versus LogísticaHumanitáriaFonte:AdaptadodeNogueira,GonçalveseNovaes(2007)
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Alvarenga eNovaes (2000) atentam para a importância daformação de uma rede logística, ou seja, uma representaçãofísico‐espacial,dospontosdeorigemedestino,umconjuntodenósdosaspectosmaisrelevantesesuasligações,possibilitandoavisualizaçãodosfluxosnecessários.Alogísticatrabalhadeformasistêmicabuscandosoluçõesalternativasquecubramasdiversaspossibilidadesinerentesasdiscussõesdaorigemaodestino.
Quando ocorre um desastre não há tempo hábil para semontar toda a rede logística, assim é preciso dispor de umtrabalho prévio de análise das áreas de risco, população aliinstaladaetodaainfra‐estruturaaoredorquepossaatenderaosatributos exigidos para a esquematização da rede. Uma redelogística previamente delineada auxilia e agiliza a tomada dedecisão por parte dos responsáveis,minimizando o tempo derespostaaoevento.ConsideraçõesFinaisA Logística põe a serviço da sociedade conhecimentos e
técnicas que podem agilizar os processos de socorro eatendimento as vítimas de desastres. Procedimentos comogerenciamento de depósitos, transporte e informação, sãoaplicáveis as situações emergenciais adaptando‐os é claro asespecificidades da cadeia de assistência e a urgência que elaexige.
De posse de instrumentos como mapas de áreas de risco,estimativas de população local, de disponibilidade de infra‐estrutura regional e fontes prováveis de recursos é possívelproceder à planificação de uma rede logística queminimize otempoderespostaaoevento,garantindomelhoratendimentoaspossíveisvítimasdeformaeficienteeeficaz.
Assumindooatualsistemaurbanocomofrutodosprocessosde modernização impostos pelos avanços científicos e
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tecnológicos, que desconsidera e expôs a própria sociedade avulnerabilidade,não restandooutro caminho anão ser “correratrás do prejuízo”, ou seja, oferecer a sociedade o suportenecessário para sua segurança e bem estar, através doequacionamento de problemas infra‐estruturais complanejamentoparaemergênciasquegarantaumaboacapacidadederespostaeosmenoresdanospossíveis.
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221
Consideraçõessobredivulgaçãocientíficaparacriançaseadolescentes
RaquelJulianaPradoLeitedeSousa
Coisadecriança:assuntosérioDurante todo o dia, temas de Ciência e Tecnologia (C&T)
rodeiam as crianças e os adolescentes em programas de tevê,livros, cartazes, jornais, embalagens de produtos, brinquedos,propagandas, aparelhos eletrônicos. Assim, não é apenas nasatividades das apostilas de ciências que os jovens se deparamcom questões de C&T; a educação científica desse públicoacontecetambémforadaescola,emumaesferainformalque,deacordo com Massarani (2008), não tem sido suficientementeexplorada, de modo a contribuir com a formação de umaverdadeiraculturacientífica.
A divulgação da ciência feita através da mídia chega aopúblico infanto‐juvenil não somente através de conteúdosproduzidos para adultos, mas também por intermédio deprogramasepublicaçõesdestinadasexclusivamenteaessafaixaetária,oqueinfluenciadiretamentenaeducaçãocientíficadeumpúblicoquejáécidadãonopresente.
De acordo com Auler e Delizoicov (2001), a AlfabetizaçãoCientíficaeTecnológica(ACT)temsevalidotantoparaampliaraparticipaçãosocialdemocráticanasdiscussõessobreC&T–emuma perspectiva ampliada – como para legitimar o fazercientíficoperanteasociedade,a favorda tecnocracia–emumaperspectivareducionista.
SegundoMassarini (2005), o conteúdo científico divulgadoparacriançaseadolescentesédebaixaqualidade,nãoapresentaclarezaenãocontextualizaosentornosdaciência;assim,avisão
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deumaciêncianeutra,postuladoradeverdadesenãoideológicapodeestarsendo transmitidaaosnossos jovens,emdetrimentoda problematização da ciência e da construção de umconhecimentosocialmenterelevanteparaessepúblico.
Atravésdeumaanáliseexploratória inicial,opresenteartigotraça considerações a respeito de estudos publicados no Brasilsobre a temática divulgação científica para crianças eadolescentes,a fimdediscutira formacomo temsido levadaaciênciaparaopúblicoinfanto‐juvenilatravésdamídiaeverificarseos temas científicos são tratados sobaperspectivaampliadaoureducionista,àluzdoestudodeAulereDelizoicov(2001).
Ciêncianamídia:embuscadeapoio?A perspectiva reducionista de educação científica se
assemelhaaomodelodo‘déficitcognitivo’,emqueoeducandoétido como não conhecedor da ciência, sendo necessáriotransmitir a ele conceitos técnicos que ignoram o mito deneutralidade da ciência (mito original), não favorecem umapostura crítica e ampliam o apoio ao universo da ciência(AULER;DELIZOICOV,2001).
Jáaperspectivaampliadapartedeummodeloprogressistadeeducação, baseado em um dialogismo que se aproxima dométodo freireano,devidoàproblematizaçãoeàcriticidadequebuscam aproximar aC&T das questões socialmente relevantes(AULER;DELIZOICOV,2001).
Entretanto, aproximar a educação científica de questõessociaisnãodeveserestringiradiscutirasimplicaçõessociaisdaciência.Énecessáriaumaabordagemmaisradicalquesejacapazde promover “[...] uma educação política que busca atransformação do modelo racional de ciência e tecnologiaexcludenteparaummodelovoltadopara a justiça e igualdadesocial.” (SANTOS, 2008, p. 111), em que os mitos científicos,
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comoodeneutralidadeesuperioridade,porexemplo,poderãoserultrapassadosparadar lugaraopensamentocríticoquesejacapaz de questionar as interações entre ciência, tecnologia esociedade.
Partindodopressupostoqueaeducaçãocientíficanãoocorreapenas no ensino formal, podemos pensar a mídia comoeducadorainformaleestenderasperspectivasdeACTreduzidae ampliadapara aspublicaçõesmidiáticas, tanto as que visamintencionalmente a divulgar ciência para o público infanto‐juvenil,comoasofazemdeformanãopropositada.
Em investigação promovida pela Fundação deDesenvolvimentodaPesquisaeAgênciadeNotíciasdosDireitosda Infância (2009), foianalisadaacoberturadespendidapor50jornaisdiáriosbrasileirosdecirculaçãonacionalduranteosanosde2007e2008,sendoestudadaumaamostragemde2.599textos,selecionados pela metodologia de ‘mês composto’, a fim deaveriguaroagendamentodamídiaemrelaçãoaassuntosligadosà Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I). Verificou‐se que ainclusãodetemascientíficossedeu,emsuamaioria,atravésdarepercussãodepesquisascientíficas(31,0%em2007e32,0%em2008),edarepercussãodeeventoscientíficos (10,8%em2007e12,8%em2008),oquecorroboracoma ideiadequeaciênciaédivulgadaparaampliaroapoio socialà comunidade científica,talqualnaperspectivareduzidadeACT.
Dototaldetextosanalisados,40%mencionaramafaixa‐etáriado público‐alvo, sendo que, destes, 16% se voltaram paracrianças e adolescentes (FUNDAÇÃO...;AGÊNCIA..., 2009).Oreferidoestudonãoanalisoupublicaçõesdestinadasaopúblicoinfanto‐juvenil, entretanto, deve‐se atentar para o fato que osjovens leem tais publicações, bem como seus professores efamiliares.Além disso, aAgência deNotícias dosDireitos daInfância (ANDI) parte do pressuposto que a agenda damídiadefine a agendadapopulação edos tomadoresdedecisão,ou
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seja, estabelece quais assuntos são mais importantes,influenciandoastomadasdedecisão,queafetamtodasasfaixasetárias.
DeacordocomCandotti(2002,p.17)[...]adivulgaçãonãoéapenaspáginade literatura,naqualasimagens encontram as palavras (quando as encontram),masexercício de reflexão sobre os impactos sociais e culturais denossasdescobertas.
Portanto,estudaroquêecomosedivulgaaciênciaemnossa
sociedade,maisdoqueverificarqualimportânciatemsedadoàcomunidade científica, é refletir sobre os caminhos emodelosquesãotraçadostodos:cientistasenãocientistas.
Animações:homenscientistasemagiaNa televisão, algumas animações infantis (desenhos
animados)brincamcomouniversodaciênciaecoma imagemdo cientista. Em O Laboratório de Dexter (Dexterʹs Laboratory –CartoonNetwork),opersonagemquedánomeàanimaçãoéum“[...] menino cientista, convencido, mal‐humorado econstantemente incomodado por Dee Dee, sua irmã maior,‘ignorante’dosabercientífico.”(SIQUEIRA,2008,p.46).Emseulaboratóriosecreto,Dexterutilizadealtatecnologiaembenefíciopróprio, já na escola o garoto é visto como qualquer outracriança,merecendoodescréditodealgumaspessoas(SIQUEIRA,2005,2008).
EmAsAventuras de JimmiNêutron, (TheAdventures of JimmyNeutron: Boy Genius – Nickelodeon), o pequeno e simpáticocientista Jimmi sedestacade seus colegas e familiarespor suagenialidade;paraele,aescolaeosprofessoressãoantiquadosesuas invenções altamente tecnológicas sãousadas embenefíciopróprio.(SIQUEIRA,2005,2008).
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Aciência,aqui,comoemDexter,separecemuitocomamagiaem outros programas e outras narrativas. É um escape queprivilegiaos fins eaaplicação imediata,por isso,as soluçõesnão se dão em processo: são imediatas, como um toque demágica.(SIQUEIRA,2008,p.46‐47).
Em ambos os desenhos, o cientista é colocado como uma
pessoa diferente das demais, superior, capaz de coisasimpossíveisparaosdemaispersonagens,dominadoresdeumaaltatecnologiaquasemágicaeparecemestaracimadobemedomal:reforçamomitodasuperioridadedaciência.
EmAsMeninasSuperpoderosas (ThePowerpuffGirls –CartoonNetwork), Docinho, Lindinha e Florzinha são criações doProfessor Utonium, cientista que é um misto de chefe e pai(SIQUEIRA, 2005). As meninas foram criadas em laboratóriopara possuírem superpoderes e combater omal, personificadonoMacacoLoco(tambémécriaçãodoProfessor),afimdeajudaro prefeito e a populaçãoda cidadedeTownsville.Odesenho,apesarde terprotagonistasdogênero feminino, reforçaa idéiadaciênciamasculina:Professoréoinventorquetudoconsegueeasmeninas,merascriaçõesdele.AsaventurasdeHenry(Henry´sWould–DiscoveryKids)éuma
animação de bonecos cujo personagem principal (Henry) ésobrinho de um cientista,Netuno, que, com o auxílio de umrobô, explica o funcionamento de coisas do cotidiano(SIQUEIRA, 2005). Aqui, pode‐se perceber uma concepçãoreduzida deACT, uma vez que o cientista, detentor do saber,transmite unidirecionalmente conhecimentos técnicos a seusobrinhoe,porconseguinte,aotelespectador.
EmODivertidoMundodePeep(PeepandtheBigWideWorld–DiscoveryKids),nãoháafiguradeumcientista:Peep,averecém‐nascida,emaisdoisamigosquestionamomundoàvoltadeles.O universo da escola não é retratado, aparecem situações docotidiano, em que osprocessos sãodesvelados – como semear
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umasem*ntedegirassol,regá‐laeesperarquebroteecresça,porexemplo(SIQUEIRA,2005,2008).
EmTimothyvaiàescola(TimothyGoestoSchool–Nelvana),cujospersonagens são animais, também não aparece a figura docientista,oambienteescolarévistocomoespaçodesocializaçãodoconhecimentoeaciêncianãotemdestaquedeoutrasformasdesaber(SIQUEIRA,2008).
Nas duas últimas animações, a figura do cientista não écitada,aciênciaémaisvistacomoumprocessoeosaberpareceestarmaisdistribuídoentreospersonagens.
De acordo com Siqueira (2005), as animações veiculadas noBrasil,tendoaintençãodeeducarounão,reforçamumaimagemestereotipadadecientista.
Omodelode cientista apresentado é aqueledos laboratórios,das experiências, tubos de ensaio, pipetas e equipamentoseletrônicos. Nunca aparece um sociólogo, antropólogo,psicólogooucientistapolítico.Nouniversododesenhoedasanimações, esses não parecem ser reconhecidos comoprofissionaisdaciência.(SIQUEIRA,2005,p.31).
Nas animações analisadas por Siqueira (2005, 2008), o
cientista é representado como estudioso da área de exatas, degêneromasculino,eapareceapoiadoporaparatos tecnológicosmágicos,comexceçãodeODivertidoMundodePeepeTimothyVaià Escola (em que não aparecem cientistas. Os resultados eaplicações imediatas são sempre o objetivo da ciência, nãorevelandoosprocessoselimitaçõesdotrabalhocientífico.
Nopapel...A revista Ciência Hoje das Crianças (CHC), publicação da
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), épublicada desde 1986. Versão infantil da revista CiênciaHoje
227
(CH), é adotada peloMEC e distribuída para 107mil escolascomo material de apoio paradidático (INSTITUTO CIÊNCIAHOJE, [200?]), além de permitir assinaturas particulares. Seustextos são escritos, a convite ou espontaneamente, porespecialistas, e passam por uma edição, para adequação dalinguagemaopúblicoinfantil(MASSARANI,2005).
Zamboni (2001) realizou um estudo na área deAnálise doDiscursoemquecomparoudois textosdocientistaCléber J.R.Alho, um divulgado na revista CHC e outro na revista CH,ambossobreomesmoassunto:atartarugadaespéciePodocnemisexpansa.Aautoraobservouaorganização textual,a sintaxeeovocabulário, verificando que na CHC, a argumentação cedeespaçoànarração,asfrasessãomaiscurtaseousoconstantedelinguagem conotativa, por intermédio de comparações eanalogias.
Amatériaanalisada(OMistériodasTartarugasRoubadas,CHC,n. 4, 1992), longe de descrever características do animalestudado, mostra parte do processo do cientista no estudo erevelaumproblemasocialqueinterferediretamentenapesquisaenoecossistema:oroubodosovosparavenda,indicandoqueoautormostraumavisãomaisampliadadapesquisa.
Massarani (2005) realizou entrevistas com 21 criançasassinantes da revistaCHC, a fim de verificar suas práticas deleitura. As entrevistas indicaram que as crianças costumamfolheararevista,mantendoumarelaçãocorporalcomelaatravésdoscinco sentidos“[...]acariciar;abraçar;percorreras imagenscomosolhos,comosdedos;indicartraçospreferidos;levarparaaescola;mostrarparaumamigo,lerparaoutro.(MASSARANI,2005,p.52).Sódepoiséfeitaaleitura,escolhendooquevãoler:oupelaseçãopreferidaoupeloassunto.
Aautoraconstatouqueasassinantesda revistapertencemaum ambiente socialque estimula a leitura eo conhecimento, etambém têm acesso a materiais culturais orais (rádio, tevê,
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cinema).Assim,emumprimeironíveldeleitura(parafrásica),acriançaprocuraoquedeveserosentidoexpressonotextopeloautor; e emum segundonívelde leitura (polissêmica),o leitoratribui outro sentido, conforme outras leituras feitas(MASSARANI,2005).Issoatentaparaofatoqueaconstruçãodoconhecimentocientíficonãosedáapenasporintermédiodeumúnicoconteúdo,umúnicotexto,masatravésdeumaconstruçãoconstantequenascedetodasasleiturasdacriança:sualeiturademundo.“NapropostadeeducaçãolibertadoradePauloFreire,aconscientização do indivíduo ocorre por meio do diálogomediadopelassuascondiçõesdeexistência.” (SANTOS,p.119),diólogo esse fundamental para a formação de uma plenaAlfabetizaçãoCientíficaeTecnológica.
Em análisedasmatériasde capade 31 ediçõesda Folhinha,suplemento infantil do jornal Folha de São Paulo, Jonh (2005)verificou que o consumo é o elemento central do discurso:“este consumo incentivado na Folhinha, nas 31 ediçõesanalisadas, está associado a outros discursos tais como otecnológico,ocientíficoouodosucesso.”(JOHN,2005,online).Emumamatériasobrecoelhos,categorizadacomopertencenteàtemáticadeCiência eMeioAmbiente,o animal foi tratado emseu valordemercado: serve como alimento, fornece pele paraadorno e é utilizado em laboratórios de teste para cosméticos(JOHN, 2005).O estudo traz indicativosdeque a ciênciapodeestar sendo representada nesse suplemento como um meiodestinadoaumfim:oconsumo.ConsideraçõesfinaisAsidéiaslevantadasnesteestudonãosãoconclusivas,tratam‐
se de considerações iniciais sobre o tema, baseadas em outrasconsiderações traçadas por estudiosos da área.A presença deuma perspectiva reducionista da ciência ainda émarcante na
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mídia,masnão é aúnica, e essa visão tem sido superadaporiniciativasnatevêenojornalismo.
Divulgar ciência para crianças e adolescentes,mais do quemostraraelasresultadosdelaboratórioetransferirinformações,à imagem de uma educação bancária, é fazê‐las resignificar omundo que estão descobrindo em uma fase tão intensa deaprendizado. Portanto, chamar a atenção de um jovemtelespectador e leitor, mais do que convencê‐lo a consumirdeterminado produto, seguir assistindo a programação dedeterminadarededetevêouacontinuarcomprandoasediçõesposterioresdeum jornalourevistaé instigá‐lopessoalmenteaoconhecimento.
Ruiz (2004) atenta para a necessidade desafiar os jovens,evitando que a divulgação se resuma a trazer definições edescriçõesjáprontas,masquecentremainformaçãocientíficanoprocesso:
[...] apelar à curiosidade de nossos leitores, começando porquestionar se certas idéias surpreendentes ou insólitaspoderiamserlevadasàprática[...].Outrapossibilidadeétomarum corpo de conhecimento bem estabelecido e responder àpergunta sobre como os cientistas obtiveram seus resultados[...].Melhorainda,podemosescolherumproblemacientíficoeconvidar os leitores a pensar sobre algumas maneiras desolucioná‐lo[...].(RUIZ,2004,p.15).
Transpor a ideia de resultado para processo, da aplicação
imediataparaainvestigação;fazendoqueojovempercebaqueoresultadoeaaplicaçãosãosim importantesparaaciência,massão apenas parte de uma prática que implica também emambiguidades, limitações e erros. O objetivo não é fazer decriançaseadolescentescientistas,masajudá‐losapercebequeaciênciaéumadasformasdeinvestigaçãodomundo.
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Divulgarciêncianãoéfazerpropagandanemdecientistasoude produtos, nem instrumentar os jovens para que possamutilizar determinadas tecnologias, mas para que possamparticipar como cidadãos atravésdeum aprendizado que lhessejarealmentesignificativoequeospermitaverqueofuturonãoestá preestabelecido, determinado pela ciência, mas que seráumaconstruçãobaseadanaposiçãodecadaserhumano.
Superar essemodelo não será fácil, principalmente porquemostrar os mitos por detrás da ciência é questioná‐la, o queimplica em duvidar de saberes e métodos já há muitopreestabelecidoscomoverdadeiros,oquepoderámudaroapoioe a admiração despendidas pela sociedade à comunidadecientífica.ReferênciasALBAGLI,Sarita.Divulgaçãocientífica:informaçãocientíficaparaacidadania?Ci.Inf.,Brasília,v.25,n.3,p.396‐404,set./dez.1996.
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Ostesaurosmultilínguespelasperspectivasdaciência,tecnologiaesociedade:possibilidadesdeconstruçãoeuso
RicardoBiscalchin
VeraReginaCasariBoccatoIntrodução
A explosão da Ciência e da Tecnologia (C&T) ocorridadurante a revolução industrial e a revolução científica, eamplificadapelasduasgrandesguerrasmundiais,conduziramàum grande desenvolvimento de “bens” científico‐tecnológicosque resultaram em mudanças significativas na sociedade.Cotidianamentenosvemosdependenteseatéobrigadosafazeruso dessas tecnologias científicas que se incorporaram nasociedade, demodo amodificarem nossomodo de vida e decomunicação, nos levando hoje a questionarmos como erapossível a sobrevivência quando tais tecnologias ainda nãoexistiam,ecomoseriaessasobrevivêncianosdiasatuais.
Umadessas tecnologiasque se introduziram fortementenasociedade, modificando o modo de interação e comunicaçãoentre os indivíduos, foi a internet.A internet revolucionou osmeiosdecomunicaçãosetornandoumveículodeinformaçãodeusocotidianodegrandepartedapopulaçãomundial.Ainternet(WorldWideWeb)éuma redemundialdedadosondemilharesde computadores se encontram conectados em rede edistribuídos nosmais distintos pontos do globo, permitindo acomunicação instantânea entre eles, ultrapassando fronteirasfísicas e temporais,possibilitando,dessemodo, a comunicaçãoentre indivíduos de diferentes países, em diferentes culturas eidiomasdeuso.
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Há pouco tempo atrás não imaginaríamos que teríamos adimensão“CiênciaeTecnologia”tãodesenvolvidas,permitindoainteraçãoeacomunicaçãopormeiodedispositivosmóveisquenão se encontram limitados aum espaço físico.Hoje, alémdainternet, temososaparelhoscelulares,ospagers,osdispositivosdeGPS(GlobalPositioningSystem)eváriosoutrosdispositivosdecomunicação, que nos permitem a interação instantânea comindivíduos dediferentes pontosdo planeta e, particularmente,nocasodoGPS,acomunicaçãoea interação instantâneacomosatélite.
Mediante essa contribuição que a Ciência e a Tecnologiatrouxeram para a Sociedade, torna‐se de suma importânciaavaliaroimpactoqueatecnologiacientíficacausouàsociedade,isto é, quais são os seus benefícios e as suas ameaças. Énecessário pensar e refletir sobre a C&T produzidas edisseminadas àpopulação, equalo realbenefíciooumalefíciogerado à sociedade. Diante desses questionamentos surge omovimento de Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS), que deacordocomLeiteeFerraz(2011,p.40)
Nos anos 1960 e 1970, o questionamento dos reais benefícios emalefíciosdaC&TembasouosurgimentodoMovimentoCTS,oqual,com pesquisas sobre a dimensão social da C&T, inclui umadiversidade de campos de estudos que compartilham a crítica àneutralidadedaC&Teapromoçãodaparticipaçãopúblicanatomadadedecisõescomomeiosdeinstrumentalizaçãodacidadania.
Notamos que, a partir da década de 60, houve um
crescimentodapreocupaçãosobreosbenefíciosemalefíciosdaC&Tnasociedade.AC&Tdeixamdeservistascomosalvadorasedetentorasapenasdebenefícios,epassamaserquestionadas,quanto a sua real potencialidade em ser benéfica emaléfica àsociedadecomoumtodo.Asociedadeeumgrupodecientistaspassam, então, a se preocupar com os impactos que essas
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tecnologias estão trazendo à sociedade e de que modoaprimoram ou dificultam a vida dos indivíduos. O impactodessastransformaçõessociaisimpostaspelaCiênciaeTecnologiaafeta não só o campo social, mas também o político e oeconômico.Reforçandoanecessidadedeumolharcríticosobreodesenvolvimento científico‐tecnológico recorremos aospostulados teóricos de Pinheiro, Silveira e Bazzo (2007, p. 72)expondoque
[...] pode ser perigoso confiar excessivamente na ciência e natecnologia,poisissosupõeumdistanciamentodeambasemrelaçãoàsquestõescomasquaisseenvolvem.Asfinalidadeseinteressessociais,políticos,militareseeconômicosqueresultamnoimpulsodosusosdenovas tecnologias implicam enormes riscos, porquanto odesenvolvimento científico‐tecnológico e seus produtos não sãoindependentesdeseusinteresses.
Muitossegmentoscomoosalimentostransgênicoseousode
energia nuclear são constantemente debatidos por estudiososcomo Pinheiro, Silveira e Bazzo (2007) e também pela mídiatelevisiva,entreoutras,que seocupam, também,dediscutirosaspectos políticos e os interesses de grupos dominantes queimpõem as tecnologias. Segundo os mesmos autores(PINHEIRO, SILVEIRA e BAZZO, 2007, p.72) as ações e astecnologiasqueenvolvem taissegmentosacabam“persuadindoas classesmenos favorecidas, impõem seus interesses, fazendocomqueasnecessidadesdagrandemaioriacarentedebenefíciosnãosejamamplamentesatisfeitas.”
Assim, faz‐se necessário que o cidadão conheça ecompreenda as tecnologias desenvolvidas que virão a serimplantadas na sociedade, devendo ele possuir os subsídiosteóricos e os conhecimentos práticos suficientes sobredeterminadatecnologiaparaque,diantedisso,possafazeruma“leitura”,umaanálisedessatecnologiaedeterminarsobreasuaadoçãoounãoemsuavida.Dessamaneira,devemosatuarnão
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apenascomo receptoresdessasmudanças tecnológicas,ou seja,como seres pacíficos, mas também como atores sociais,participantes direta e indiretamente dessas inovaçõestecnológicas.
Sobreisso,tambémPinheiro,SilveiraeBazzo(2007,p.72‐73)relatamque
Precisamosconstantementeconsiderarquesomosatoressociais.Unsdiretamenteafetadospelaspossíveisconseqüênciasdaimplantaçãodedeterminada tecnologiaequenãopodemevitarseu impacto;outros,osprópriosconsumidoresdeprodutostecnológicos,coletivoquepodeprotestar pela regulação e pelo uso das tecnologias; outros mais,públicointeressado,pessoasconscientesquevêemnastecnologiasumataque a seus princípios ideológicos, como os ecologistas e váriasONGs;e,também,estudiososdeváriossegmentoscomcondiçõesdeavaliarosriscosdaáreadeconhecimentoquedominam.
Nessa perspectiva, não devemos ser passivos diante dessa
avalanche tecnológica, antes, devemos medir, avaliar asvantagens e desvantagens das inovações tecnológicas que nossão apresentadas diariamente e escolher quais devem ou nãointegraronossocotidiano.
Todavia, para que isso ocorra, precisamos que os cidadãostenham acesso à informação sobre essas tecnologias e ciências,para que lhes sejapossível avaliar a tecnologia não apenasdamaneira como ela seráutilizada,mas tambémdo impacto queelatrazepodeprovocar.Paraisso,énecessárioqueasunidadesde informaçãoofertem,aoscidadãos, informaçõesprecisasparaqueelespossamrealizartalavaliação.
As unidades de informação são organizações que coletam,tratamedisseminamoconhecimentocientíficoapartirdeteoriase metodologias que permitem aos cidadãos entenderem astecnologias que o cercam, podendo elas em alguns casos,contribuírem tanto para o entendimento, quanto para aproduçãodaciênciaedatecnologia.
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Diante do exposto e no contexto deste estudo, dar‐se‐áenfoque específico para a biblioteca universitária, identificadacomo unidades de informação científica especializada. Sobreisso,BiscalchineBoccato(2010,p.4)relatamqueela
[...]disponibilizaoconhecimentojáconstruídopormeiodeserviçoseprodutos oferecidos aos docentes, discentes de graduação, pós‐graduação e demais categorias de usuários, possibilitando odesenvolvimento de novos conhecimentos e sua divulgação para asociedade.
A biblioteca universitária vista também como uma agência
dosaber,propiciaadisseminaçãodoconhecimentoaessegrupoda sociedade no desenvolvimento, a partir da recuperaçãoprecisada informação colaborativana construçãode inovaçõescientífico‐tecnológicas. Ela, portanto não só armazena oconhecimento produzido em C&T,mas também dissemina talconhecimentopara o entendimentodestaC&T jáproduzida e,consequentemente, no desenvolvimento de novas C&Ts. Essapreocupação com a disseminação da Ciência e da Tecnologiaparaasociedadeé focodeestudodaáreadeCTS,produzindopesquisasdeperspectivascríticassobreaC&T,eavaliandoqualoseuimpactonasociedade.
O campoCTS éum campode caráter interdisciplinar enoBrasilabrangediversas temáticas,a saber:“educação científica;estudos CTS; comunicação científica; mudança tecnológica edesenvolvimento sustentável;política cientifica e tecnológica; egestãodainovação”(LEITE;FERRAZ,2011,p.40).
Notamosassim,umapreocupaçãoemrealizarumainteraçãoentre a ciência, a tecnologia e a sociedadedemodo a fazeremcom que os cidadãos, caracterizados pelos cientistas,pesquisadores, docentes, discentes, leigos, enfim a sociedadecomo um todo, possam produzir, de modo integrado, oconhecimentoemCTS.
238
Para que o usuário desse sistema de informação consigarecuperar/localizara informaçãoquealmeja,torna‐senecessárioarealizaçãodeestratégiasdebusca,queparaLopes(2002,p.61)“[...]pode[m] serdefinida[s] comouma técnicaou conjuntoderegras para tornar possível o encontro entre uma perguntaformuladaeainformaçãoarmazenadaemumabasededados”.
Entretanto, uma boa estratégia de busca por si só nãosignifica eficiência nos resultados obtidos, pois para que ainformação seja acessível de maneira satisfatória aousuário/cidadãoénecessáriouma linguagemdocumentáriaquecontemple os termos dos assuntos dos documentos a seremrepresentadosequesejadisponívelemsistemasautomatizadosde informaçãoutilizáveisemdiversas localidadesgeográficaseemdiferentesidiomas.
Diante do exposto, este estudo tem por objetivo investigarsobreaconstruçãodetesaurosmultilíngues,comdestaqueparaoprocessodetraduçãodetermos,frenteadimensãoculturalqueas áreas científicas especializadasdevempossuirdiantedeumrepertórioterminológicoconsolidado,organizadoedisseminadoentre diferentes comunidades científica e civil, transpondobarreirasgeográficas,culturaiselinguísticasepelasperspectivasdaCiência,TecnologiaeSociedade.
Ostesauroscomoinstrumentoscolaborativosnarepresentaçãopara a recuperação da informação científica, tecnológica esocial
Os sistemas de recuperação da informação de bibliotecas
universitárias, exemplificados pelas bases de dados, catálogoson‐line, repositórios, entre outras fontes de informação,requerem diferentes e complexos processos, procedimentos deinstrumentosde tratamentoda informaçãoparaqueestapossaseracessíveleútilaousuárioespecialista.
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O tratamento da informação envolve dois níveis deorganizaçãoerepresentaçãodoconhecimento:1)arepresentaçãodescritiva,pautadanosuportedocumental(tratamentofísicodainformação); 2) representação temática, centrada no conteúdodocumentário, a partir da condensação e representação doassunto intrínseco ou extrínseco tratado em um determinadodocumento(GUIMARÃES,2003).
Noqueserefereaotratamentotemáticodainformação,comvistas a busca por assunto e recuperação da informaçãopertinente aos anseios de pesquisa dos usuários em CTS, alinguagem documentária atua como instrumento derepresentaçãotemáticaeveículodecomunicação,promovendoaconexão entre a informação, o sistema de recuperação dainformaçãoeousuáriodessainformação.
Sua função, portanto, é disponibilizar a informaçãoviabilizando a sua recuperação pelo usuário ‐ cidadão que irábuscarinformaçõesparaaconstruçãodenovastecnologiasparaa sociedade, ou ainda o cidadão que pretende buscarinformaçõescientíficas (ounão)paraentenderas tecnologiasasquais ele já possui um contato, ou aquelas que ele terá umpossível contato. Boccato e Fujita (2006, p. 18) definem alinguagemdocumentáriacomo
[...] sendo o instrumento de comunicação entre a informação, osistemadeinformaçãoeousuário[...].[Ela]deveasseguraroacessoaessa informação, possibilitando sua adequada recuperação e,conseqüentemente, a criação desse conhecimento científico, parapromoverobem‐estardasociedade.
A linguagem documentária possibilita a disseminação do
conhecimento,auxiliandonoensinoCTSparaasociedade,vistoqueelaatuacomoum instrumentoque fazamediaçãoentreousuárioeainformaçãocientífico‐tecnológica.
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No contexto de uma biblioteca universitária, a linguagemdocumentáriaéutilizadano catálogoon‐linepara recuperarosregistros bibliográficos por assunto que compõem o acervo.Ocatálogo pode ser caracterizado como “o “espelho” do acervo,devendorefletiraousuáriotudooqueabibliotecapossuisobredeterminado assunto, apartirda busca, seleção, recuperação euso da informação” (BISCALCHIN e BOCCATO, 2010, p.4).Nessesentido,ocatálogoofertaaousuário/pesquisador/cidadãoo conteúdo informacional dos documentos dessa unidade deinformação,possibilitandoasocializaçãodaciênciapormeiodadisseminaçãoeacessoaoconhecimento.
As linguagens documentárias são constituídas de termosprovenientes da linguagem de especialidade e da linguagemnatural (do discurso comum, linguagem de busca do usuário)relacionadosentresi.
Nesse contexto,Guinchat eMenou (1994,p. 136) apontam,também, que os termos da linguagem natural “[...] sãorelacionados ao descritor correspondente por meio de umaremissiva”.Essasremissivas“[...]nãopodemserutilizadasparadescreveras informações [e]sãochamadasdenão‐descritores.”Tais relações são identificadas como hierárquicas, deequivalência ou associativas. “Elas permitem reagrupar asnoções sobre um único termo, aumentar ou, ao contrário,precisar uma pesquisa.” São exemplos de linguagensdocumentáriasaslistasdecabeçalhosdeassunto,ostesauros,asontologias,entreoutras.
Especificamente sobre os tesauros, eles são compostos portermosdescritoresdeáreascientíficasespecializadasapartirdasrelações sintático‐semânticasquemantêmentreos conceitosdeordens hierárquicas, partitivas, associativas e de equivalência,permitindo a representação para a recuperação precisa dainformaçãodocumentária.
ParaBoccato,RamalhoeFujita(2008,p.201)ostesaurossão
241
linguagens de estruturas combinatórias e pós‐coordenadas,constituídas de termos ‐ unidades linguísticas provenientes dalinguagemde especialidade eda linguagemnatural ‐,denominadosdedescritores,providosderelaçõessintático‐semânticas,referentesadomínios científicos especializados, possibilitando a representaçãotemáticadoconteúdodeumdocumento,bemcomoarecuperaçãodainformação.
Segundo Currás (2005) os tesauros podem ser gerais e
especializados,multidisciplinaresemonodisciplinares.Quantoatipologia são caracterizados como macrotesauros emicrotesauros e, sob a classificação idiomática, elespodem sermonolíngues,bilíngues,trilínguesoumultilíngues(maisdetrêslínguas).
Em vista disso, notamos o papel social que os tesaurospossuem e sua importância na disseminação e interação entreCTS, visto que eles atuam diretamente no tratamento e natransferênciaeusodainformaçãoedoconhecimento.
Alémdisso, na contemporaneidade em que vivemos numasociedadeglobalizadaeinterligadapelaRedeMundialdeDados(Internet),oacessoeabuscada informação faz‐seemdiversaslocalidades geográficas, por usuários locais e remotosprovenientes de vários países, falantes de diferentes línguas epossuidoresdedistintasculturas.Nessaperspectiva,ostesaurosmultilíngues têm importância significativa por ampliar aspossibilidades de recuperação dos conteúdos dos documentosindexados nos mais variados sistemas de recuperação dainformaçãoemtodomundo,apartirdousodeuma linguagemdocumentáriadescritaemmaisdeumalíngua,resultandonumavisibilidademaiordaprodução científica e, consequentemente,nageraçãodenovosconhecimentosemCTS.
242
A construção de tesauros multilíngues no contexto dadimensão cultural epelaperspectivada ciência, tecnologia esociedade
Aslinguagensdocumentárias“pode[m]serproduzida[s]em
uma única língua natural; em uma língua natural comequivalentes em uma ou em várias línguas com dicionário deacesso para outras línguas; em duas ou em várias línguasnaturais, como no caso das linguagens multilíngues.”(GUINCHAT;MENOU,1994,p.139‐140)
Nessa perspectiva, as linguagens documentáriasmultilínguespodemserelaboradasapartirdaadaptaçãodeumalinguagemfonte,elaboradaemuma língua,paraoutras línguasou simultaneamente em outras línguas, sendo esta segundaopçãoamaisindicadaporGuinchateMenou(1994,p.147).
Recorrendo‐seasdiretrizesestabelecidaspelaIFLA(2009,p.1),os tesaurosmultilínguespodemserdesenvolvidospormeiode três abordagens: 1) construção de um novo dicionário desinônimos de baixo para cima, podendo, começar com umalíngua e adicionaroutro idiomaou línguas,ou ainda, começarcommais de um idioma simultaneamente; 2) realizando‐se acombinaçãodetesaurosexistentes,pormeiodafusãodedoisoumais tesauros existentes, resultando em um novo tesauro(multilingue) a ser utilizado na indexação e recuperação, ou,ligando tesauros existentes e listas de cabeçalhos de assunto,utilizando‐os tanto na indexação como na recuperação; 3)traduzindo‐se um dicionário de sinônimos em uma ou maisoutraslínguas.(Traduçãonossa).
Independentementedaabordagemadotada,aconstruçãodetesauros multilíngues requer muitos estudos, descobertas einovaçõesmetodológicaseconhecimentodediferenteslínguaseculturas na compatibilidade terminológica necessária para oalcancedetalproposta.
243
Pinho(2006.p.99)relataqueumtesauromultilíngue
[...]deveproporcionarrespeitoàslínguasenvolvidas,mesmoporqueseudesenvolvimento resideemumadimensão culturalepolítica.Otratamento ético no desenvolvimento de um tesauro multilíngüeenvolvearesoluçãodeproblemasdenaturezasemântica,lingüísticaeadministrativa, enão apenasna localizaçãodeum termo adequadoemoutralíngua.
Cabe, portanto, nesse momento, o resgate do conceito de
CTS, em que prioriza o respeito à sociedade e sua cultura,necessitando, desta forma, o bibliotecário participante desseprocessodeconstrução, teraconsciênciasobreessesquesitosepossuir, também uma educação emCTS para ser um cidadãoapto a avaliar os benefícios e danos que ele poderá,involuntariamente, causar a uma sociedade privilegiando, porexemplo,umaculturaemdetrimentodaoutra.
DeacordocomanormatécnicaANSI/NISOZ39.19:2005, asquestões de contexto e especificidade culturais desempenhamum papel importante na seleção dos termos e na criação devários tipos de relacionamentosmultilingues em vocabulárioscontrolados.
No que se refere a garantia cultural,Begthol (2002,p. 511)relataqueela“significaquequalquer tipode representaçãodeconhecimento e/ou sistema de organização pode sermaximamente adequado e útil para os indivíduos em algumacultura só se forbaseadonas suposições,valoresepreposiçõesdessamesmacultura”.
Observamos ser importante que todas as línguasrepresentadasportermosformadoresdeumtesauromultilínguerecebamomesmoníveldetratamentoeespecificidade,demodoa possibilitarem a busca por assunto e retornarem resultadosinformacionais igualmente satisfatórios, correspondentes ascaracterísticassócio‐histórico‐culturaisdessesdistintosusuários.
244
Torna‐se,assim,fundamentaledesafiadoracompatibilizaçãoentretermosdediferenteslínguasnomomentodaconstruçãodeum tesauromultilínguedemaneiraque todos eles recebamumtratamentoeumavaloraçãoequivalentes,independentementedacomplexidade que cada vocabulário das línguas em estudopossuem. Otesauromultilínguedevepromoverarevocaçãoeaprecisãodo sistema com ousode tal linguagem eno idioma aescolha do usuário, de modo a estabelecer um padrão deespecialidade e especificidade da linguagem, além da equidadeentreostermosadvindosdasdistintaslínguas.
SobosolharesdaTerminologia,a tradução terminológicaépautada em estudos significativos. Diante disso, Krieger eFinatto (2004) expõem que “Os tradutores se preocupam emestruturarostextosdalínguadetrabalho[alvo]comosdalínguaoriginal [fonte], se preocupando com o alcance da precisãosemântico‐conceitualparaumtrabalhoeficiente”.
No processo de tradução de um tesauro, seus termosnecessitamalcançarumaprecisãosemântico‐conceitualparaqueatendam as especificidadesda língua alvo em relação a línguafonte. Essa tradução de linguagens documentárias possui umimportante papel social visto que de acordo com Krieger eFinatto(2004,p.68)
A referência elaborados em mais de um idioma consiste em umtrabalhoquecumpreumpapelsocialmaior,poisaproximamundos,facilitandoacomunicaçãoearecuperaçãodainformaçãonocampodoconhecimentoespecializado.
Revisitando os trabalhos deHudon (1997), a autora relata
que os tesauros multilingues aparecem como instrumentospotencialmentepoderosospara transferênciade informaçãoemdistintas línguas, sendo amplamenteutilizadas em sistemasdeinformaçãomantidospelaComunidadedaUniãoEuropéia,eempaíses oficialmente bilíngues, como oCanadá. Estas diferentes
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linguagensnãoprecisam,necessariamente, serem componentesde ummesmo sistema; elas podem integrar sistemas diversosquepermitemumainteraçãoentresi,sendoestainteraçãoentrediferentes linguagens em diferentes sistemas nomeada deinteroperabilidade.
Para Boteram, Gödert eHubrich (2010) a interoperabilidaderequer a compatibilidade entre os níveis técnico, estrutural,linguístico e conceitual característicos das funcionalidades daslinguagens documentárias. Todavia, a equivalência linguística ‐terminológica entre os termos na formação de um tesauromultilíngue conduz, não apenas a realizaçãoda traduçãodeumtermodalínguafonteparaalínguaalvo,massimdeve‐severificaroconceitoquecada termoexpressaeacompatibilidadeexistenteentreeles.Asfichasterminológicassãoutilizadasnaorganizaçãoderepertórios terminológicos visando a construção de produtosterminográficos (dicionários, glossários, etc.). São, também,instrumentos colaborativos na coleta, síntese e organização determos,nadefiniçãodeconceitoseauxiliaresnoestabelecimentoderelaçõessemânticasqueconstituirãoorepertórioterminológicodelinguagensdocumentárias,taiscomoostesauros.
Alínguafonteécaracterizadacomoalíngua“mãe”,istoé,aque servirá como ponto de partida para a tradução eestruturação dos termos/conceitos, podendo ser consideradacomo a base para as demais línguas na constituição de umtesauro traduzido/multilíngue. As línguas alvo, ou seja, aslínguas “filhas” têm como referência os termos da línguafonte/língua“mãe”,sendoqueesseprocessopodeserrealizadoapartirdeestruturassemânticasidênticaseestruturassemânticassimétricasnão‐idênticaseassimétricas.
Recorrendo‐se aos estudos deHudon (1997), vimos que asestruturassemânticasidênticasesimétricassãoaquelasondecadadescritordeve terumeapenasumequivalentena línguaalvo,oque acabapor eliminar equivalênciasverdadeiras e também em
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criar equivalências não existentes devido a essa necessáriasimetria,alémdaproduçãodehierarquias incorretasou ilógicasdevidoasdiferençasconceituaisexistentesentreaslínguas.
As estruturas semânticas não‐idênticas e assimétricas sãoentendidascomoaquelasondeosconceitosqueexistememumacultura são representados em sua linguagem, mas se essesconceitos não existem em outra língua, é improvável que asrepresentaçõesequivalentesverbaisestarãodisponíveis.Quandodois termos principais ou termos gerais são inexatos ouparcialmenteequivalenteslinguísticos,elespodemterumavisãodiferente de extensão e, consequentemente, diferentes termossubordinados. Assim ao contrário da estrutura simétrica, nasestruturas assimétricas não existe a necessidade de estabelecerum termo equivalente para cada descritor, respeitando asdiferençaslinguisticasecriandorelaçõesnãoidênticas.
Pautado por Hudon (1997), elegemos alguns termos quecompõem o repertório terminológico da área de CTS,focalizando as estruturas semânticas idênticas e simétricas decorrespondências linguísticas entre termos multilíngues,exemplificadasdaseguinteforma:
LínguaFonte(Português)
LínguaAlvo1(Inglês)
LínguaAlvo2(Espanhol)
LínguaAlvo3(Francês)
Ciência,TecnologiaeSociedade
Science,TechnologyandSociety
Ciencia,TecnologíaySociedad
Science,TechnologieetSociété
Gestãotecnológica
TechnologyManagement
GestióndelaTecnología
Gestiondelatechnologie
Sustentabilidade Sustainability Sostenibilidad LadurabilitéProspecçãotecnológica
Technologicalforecasting
Previsióntecnológica
Prévisiontechnologique
Organizaçãodoconhecimento
KnowledgeOrganization
OrganizacióndelConocimiento
Organisationdesconnaissances
Fonte:Elaboraçãonossa.QUADRO1:Tesaurodeestruturassemânticasidênticasesimétricas.
247
DamesmamaneiraesobospressupostosteóricosdeHudon(1997) e Boccato e Fujita (2006) as Ciências da Saúde nospermitem demonstrar estruturas semânticas não‐idênticas eassimétricasemrepertóriosterminológicosmultilínguesnaáreadeFonoaudiologia,asaber:
LínguaFonte(Português)
LínguaAlvo1(Inglês)
LínguaAlvo2(Espanhol)
LínguaAlvo3(Francês)
Fonoaudiologia Nãohátermocorrespondente
Logopedia
Não há termocorrespondente
Linguagem Language Lenguaje Language
Voz Voice Voz Voix
MotricidadeOral Nãohátermocorrespondente
MotricidadOral
Não há termocorrespondente
Audiologia Audiology Audiología AudiologieFonte:Elaboraçãonossa.QUADRO2:Tesaurodeestruturassemânticasnão‐idênticaseassimétricas.
ApartirdosQuadros1e2podemosobservarquenarelaçãosimétricaostermossemprepossuemumequivalentenaslínguasalvo, formando uma relação idêntica entre elas, conformeilustrado no quadro 1. No quadro 2, vimos a estruturaassimétrica, em que os termos, não necessariamente, possuemdescritoresequivalentesemtodasaslínguasalvo,emquesecitaocasodaFonoaudiologiaquepossuiumdescritoremespanholenenhum equivalente em inglês e em francês, o que resulta emrelaçõesnão‐idênticaseassimétricasentreostermos.
Consideraçõesfinais
A Ciência, a Tecnologia e a Sociedade se encontram
relacionadas intimamente, e desse modo, constantemente aevolução científica e tecnológica impactam e refletem
248
diretamentenasociedade,oquenãosignificaqueas inovaçõescientíficas por evoluírem levam, naturalmente à evolução dasociedade.Muitasvezes,elaslevamasociedadeaumretrocessoenãoamelhorias,aumentandoaindamaisasdesigualdades,osimpactosambientaiseoutrosproblemascientífico–tecnológico‐sociais.
No contexto da sociedade da informação ao qual estamosinseridos e diante da produção científico‐tecnológica e,consequentemente, da grande quantidade de informação a sertratada e representada para acesso e uso na geração de novosconhecimentos, este artigo propôs discutir possibilidades deconstrução de tesaurosmultilíngues, no contexto da dimensãoculturaldeáreascientíficasespecializadasepelaperspectivadaCTS, objetivando a disseminação de informação para asociedade, a partir do uso de sistemas automatizados embibliotecasuniversitárias.
Para tanto, foi possível conhecer, também as interaçõesexistentesentreaC&Teas interações/impactosqueocorremnasociedade, ofertando ao cidadão um conjunto de informaçõesque lhe dêem subsídios para realizar uma análise sobre astecnologias impostas à sua vida, podendo, por meio doconhecimento adquirido, aceitar ou não as mudançasocasionadaspelaC&T.
Todavia, não pretendemos resolver problemas e proporsoluções,mas instigar para a realização de outros estudos deconstrução de tesauros multilíngues pela vertente da CTS,valorizandoeconsolidandoessaimportanteáreainterdisciplinarapartirdaformaçãodeumrepertórioterminológicoconsistentee consolidado pela comunidade científica e civil aplicável emsistemas automatizados de informação em vários países porusuárioslocaiseremotos.
A tradução do vocabulário de uma língua fonte paradiferentes línguas alvodeve considerar omeio sócio‐histórico‐
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culturalqueo tesauro,emformação,está inserido,bemcomoocontexto semântico‐conceitualde cada termo emanálise, tendoem vista a representação para recuperação relevante dainformação,deacordoerespeitandoasvariaçõeslinguísticasquecadalínguapossui.
O tesauro multilíngue promove a interlocução entrediferentes sistemas de informação e usuários – cidadãos,eliminandobarreiraslinguísticas,possibilitandoaelaboraçãodeestratégiasdebuscaparaarecuperaçãoporassuntoemCTSnaproduçãodeconhecimentoscontribuintesnamelhoriadobem‐estardasociedade.
A estrutura assimétrica e não‐idêntica utilizada naconstrução de tesauros multilíngües demonstrou ser a maisadequada, visto que ela considera as diferenças linguísticas‐culturais e conceituais existentes, respectivamente, entre ospovos e os termos.Essadimensão teórico‐metodológica vai aoencontro dos preceitos teóricos da CTS em preservar aidentidade cultural da sociedade e dos cidadãos, estes vistoscomoatoressociaispossuidoresdeplenascondiçõesemavaliar,com seu conhecimento demundo e com os subsídios teóricosrecuperados e utilizados, os impactos que a Ciência e aTecnologiavemacarretandonaSociedade.Referências
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253
UmpoucosobreofundodocumentaldosociólogobrasileiroFlorestanFernandes
VeraLuciaCóscia
LuziaSigoliFernandesCosta
Introdução
Diz o ditado popular “Promessa é dívida!”. Assim sendo,vimos cumprir a promessa de escrever um pouco sobre ohistórico e a estrutura do Fundo documental FlorestanFernandes,umdosmaisimportantesintelectuaisbrasileiros.Em2009,quandoescrevemos,sobre temasemelhante,umprimeiroartigointitulado“UmpoucodasColeçõesEspeciaisdaBibliotecaComunitáriadaUFSCar”1.Desdeentão tomamosocaminhodapesquisa2tendocomobaseaexperiênciavividaeaprendidaemmaisde trezeanosdededicação juntoaesse fundo.EsteartigoresultaderelatodeparteintegrantedaDissertaçãodeMestradoque nos propomos a desenvolver uma vez que o corpus deimagensaseranalisadopertenceaessefundo.Parafacilitarumamelhorcompreensãodessefundodocumentalapresentamosumbrevehistóricodatrajetóriadessefundo.Histórico
Incorporadoem1996pelaBibliotecaComunitáriadaUFSCare instalado junto às Coleções Especiais, no quinto piso, aBibliotecaparticulardoProf.Dr.FlorestanFernandesrepresentaum dos acervos mais completos nas áreas de Sociologia,
1 Publicado na Versão Beta, v.8, nº 53 – especial 2009 – I, p. 77-88. 2 Tornando-me aluna de Mestrado do mesmo Programa, na linha de Pesquisa 2 – Gestão Tecnológica e Sociedade Sustentável, sob a orientação da Profa. Dra. Luzia Sigoli Costa Fernandes.
254
Educação e Política. Esse acervo chegou extremamenteorganizado.Florestananotou,citou, indexoueenumerou todasassuas leituras, formandoumconjuntodocumental compacto,conservado,integroetodoreferenciado,nasáreascitadas.
Compostapormaisde12.000itens,aBibliotecadeFlorestané complementada pelo seu arquivo pessoal, tecnicamentedenominado de “Fundo Florestan Fernandes” e um pequenoMuseu,quetambémfoiincorporadopelaBibliotecaComunitáriadaUFSCar,em1996.Metodologia
Para que pudesse ser definido um Plano de Classificaçãosegundo a Arquivologia Moderna, houve a necessidade dauniversidade investiremcapacitação técnica emcursos juntoàUSP ‐UniversidadedeSãoPaulo,em seu InstitutodeEstudosBrasileiros – IEB, especialmente no Curso “Organização deArquivos”em2000,entreoutros.Essescursosforneceramabaseteórica emetodológicaparauma estruturadoFundoFlorestanFernandes.
A partir de então, passamos a buscar o conhecimentonecessáriosobreavidadosujeitooudetentordoFundo,ouseja,sobreopróprioFlorestanFernandes.Issosedeuporintermédiodeestudosdasmatériaspublicadassobreele,taiscomodossiês,entrevistas,númerosespeciaisderevistas,sites,etc.Baseadosnaliteratura existente, definimos a trajetória de Florestan, dosmomentosmarcantes de suavidaea sua respectivaproduçãointelectual. A partir desses estudos foi possível delinear umaestruturacapazdeacolheradiversidadedocumentaldoFundoFlorestanFernandes.
255
AestruturadoFundoFlorestanFernandes
ParadescreveravidadeFlorestanemtodasassuasfacetasedimensões desenvolvemos estudos aprofundados sobre a vidado detentor, visando a inserção de todos os documentospessoais,dos testemunhosde suavida,desde seunascimentoaté suamorte, como também os documentos do período pós‐morte.
Nesse caso, serviu de referência a estruturamontada paraoutros fundosdocumentais, cujosdetentorespossuíam funçõessemelhantesasdeFlorestanFernandes,comonoscasosdofundoquepertenceramaCarlosLacerda(UnB)eaSérgioBuarquedeHollanda(UNICAMP).
Nessa perspectiva, foram definidas seis séries e sub‐séries,apresentadas no Quadro 1, a seguir, com suas respectivasnotaçõesedenominaçõesconvencionadas:Quadro1 ‐Sériesesub‐séries,comsuasrespectivasnotaçõesedenominaçõesconvencionadas. Série Notação Denominação01 VP VidaPessoal02 VA VidaAcadêmica03 PO VidaPolítica04 PI ProduçãoIntelectual05 PIT ProduçãoIntelectualdeTerceiros06 HP HomenagensPóstumas
a)Oscódigosutilizados:
Para facilitar a organização e localização física dosdocumentos, que compõem todas as unidades documentais asmesmascontamcomdoiscódigos.Essescódigosforamdefinidos
256
como numérico composto pela Série, Sub‐série e NúmerosequencialparaaclassificaçãodentrodoPlanodeClassificaçãoecomo Código alfa‐numérico composto pelo número da sala,equipamentoonde seencontraarquivado, ladodearmazenagemdesseequipamentoecaixaoupastaondeseencontrafisicamente,conformeapresentadonafigura1,aseguir.
Figura1‐ExemplodoCódigodeClassificação
01.01.011011Unidadedocumental01Sub‐sérieIdentificação01SérieVidaPessoal
Figura2‐ExemplodeCódigodeLocalização
09.AD.01.001Caixa001Lado01ADArquivoDeslizante09Sala
b)Normalização:
AArquivologia,emsi,exigeousodepadrõesenormaspara
sefazeradescriçãodocumental,afimdepossibilitaroufacilitaro intercâmbio informacionalentreas instituiçõese seus fundosdocumentais.Para tal,aplicamosanorma internacionalISAAR‐CPFqueéespecíficaparaarquivosprivados.
A Arquivologia Nacional, representada pelo ConselhoNacionaldeArquivos(CONARQ)instituiaNormaBrasileiradeDescrição (NOBRADE) como instrumento para a descrição
257
arquivística,noBrasil.NocasodofundoFlorestanFernandesfoiadotada a NOBRADE como um complemento nacional daISAAR‐CPF. Dentre os campos descritivos, cito alguns,apresentadosnoQuadro2,paraseterumamelhorvisualização,dessescampos.
Quadro2–CamposdescritivosOrdem Campo Explicaçãodocampo01 Gênero Iconográfico,Textual,etc.02 Suporte Papel,03 Variantedeautor Quando o autor tem mais de uma
denominação ou usa abreviações,apelidos,etc.
04 Remetente 05 Instituiçãodoremetente Quandoodocumentoétimbradoouhá
citação da instituição de onde seescreveu.
06 Condiçãodeacesso Definida na inserção do documento,podendo ser “livre, sob consulta,restrito,inacessível,etc.”
07 Conjuntodocumental,etc.
Dossiê; fichasmanuscritas; fotografias,etc.
Fonte:NOBRADEeISAAR‐CPFModelodeplanilhaparainserçãodedados
Aplanilhacompleta,deentradadedados,estabelececamposmuito diversos, desde a identificação do documento, até ascondiçõesde conservação epreservação.Trata‐sedeumabasemuito detalhada, preocupada com os mais variados aspectosdocumentais. A seguir, apresento oModelo de planilha parainclusão usada na UFSCar – Biblioteca Comunitária – FundoFlorestan Fernandes (para uso e acesso interno), conformedemonstraaFigura3aseguir:
258
Figura3‐ModelodeplanilhaparainclusãousadanaUFSCar
259
Tratamentotécnico
Todososdocumentosreceberamum tratamentofísicoantesda sua inserção no Fundo. Esse tratamento foi baseado nasorientaçõesdoProjetoConservaçãoPreventivaemBibliotecaseArquivosdoArquivoNacional(CPBA).
Foram adotadas práticas para preservar os originais,prolongando a vida útil dos mesmos. Para esse fim, osdocumentos passaram unitariamente pelos procedimentossintetizadosnoQuadro3aseguir:
Quadro3–CamposdescritivosProcedimento ExplicaçãodoprocedimentoHigienização Limpezaaseco,mecânica,comtrincha/flanela/pó
deborracha;remoçãodegramposmetálicos,fitasadesivas,etc.
Planificação Alisamentoedesvincagemcomespátuladeosso,espátulatérmica,ferroelétrico,etc.
Reparos Comadesivoaquente,papeljaponês,adesivoCMCeoutros.
Técnico ClassificaçãoeTombo(gerandolistaimpressa)Digitalização UsandoScannersKodakInserçãonabase PHLadaptadoAcondicionamento Comojaquetasdepoliéster,especialmente
desenvolvidasparafichasedocumentosemformatoA4epastaspoliondasparaformatosforadepadrão.
Condiçõesdeacesso
As informações sobre as condições de acesso são,
basicamente, expressas pelas palavras “Livre”, “Sob consulta”,“Restrito”,“Inacessível”.
260
Estabelecidas, segundo esses critérios, no momento dainserçãododocumentonabase,visandoapreservaçãodonomedodetentoredesuafamília.
Acessoaodocumentofísicoeregrasinternas
Oacessofísicoaosdocumentospeloaopúblicoexternopode
sedarpordiferentesmaneiras,conformeexplicitadasnoQuadro4aseguir:
Quadro4–TipoecondiçõesdeacessoaosdocumentosTipodeacesso ExplicaçãodoacessoAcessoàconsultavirtual
Somenteacessovirtual,jáquenãoépermitidoomanuseiododocumento.
Solicitaçãodecópias Permitidaasolicitaçãoaté10(dez)documentos.Anuênciadasnormas AssinaturadeTermodeResponsabilidadepelo
usodomaterialFormadeentrega FornecimentodeCDcomasimagenssolicitadasSegurança
a)Marcad’água
AMarcad’águacomperfildoProf.Dr.FlorestanFernandeséumadasmedidasdesegurança,poispossibilitaaidentificaçãode que o documento pertence ao Fundo, conforme pode servisualizadonaFigura4.
Figura4–Marcad’águacomperfildoProf.Dr.FlorestanFernandes
261
b)CitaçãoobrigatóriaPormedidadecréditosereconhecimentodacoleçãosão
fornecidas instruções quanto à forma de citação que deve serfeitaquandodousodeitensdocumentaispertencentesaoFundoFlorestanFernandesassimdeterminado:UFSCar–BibliotecaComunitária–FundoFlorestanFernandesc)TêrmodeCompromisso Comointuitoderegistrararesponsabilidadeparausodosdocumentos,opesquisadorassinaumTêrmodeCompromissoondeconstaonúmerododocumentosolicitadojuntoaoFundo,local,dataesuautilizaçãoparafinsdepesquisaouacadêmicos.PremiaçõeseReconhecimentos
OFundoFlorestanFernandestemsidoobjetodepremiações,
recomendaçõesedemuitaspublicações,conformelistadosaseguir:
• NominaçãodoFFFnoProgramaMemóriadoMundo
(MOW)pelaUNESCO/ArquivoNacional–Seçãoem17.12.2009noMuseuNaval–RJ;
• Ediçãodo fascículo intituladoCientistasBrasileirospelaEditoraCasaAmarelanasegundaquinzenadeoutubro–RevistaCarosAmigos;
• Disponibilização do site do Fundo Florestan FernandesnaInternetem12.03.2009;
• Ediçãodo livro intitulado “FlorestanFernandes leituras& legados” pela Global Editora com lançamento em12.03.2009.
• DoaçãopeloProf.Dr.AntonioCandidodeMelloeSouza
262
da correspondência ativa de Florestan Fernandes (11cartas)em08deoutubrode2009.
• CapaetemadoperiódicointernacionalLatinAmericanPerspectives, com o subtítulo Intellectual social theoryandpoliticalpracticeinBrazil,maiode2011.
Consideraçõesfinais
Contando com a inserção de mais de doze mil fichas depesquisa, manuscritas, entre outros, o Fundo FlorestanFernandes conta hoje com aproximadamente 7.000 registros,multiplicandopelosseusdesdobramentosecompondodezenasdemilhares de folhas inseridas.Dentre osmateriais inseridos,podemos destacar os mais variados suportes e suas funçõespodemsercitadasasfitascassetetranscritasereproduzidasemáudio digital; fotografias analisadas e descritas; cadernos ecadernetasdepesquisa; trabalhosdeaproveitamentodealunosdeFlorestan,comoOctávio Ianni,FernandoHenriqueCardoso,entre outros; objetos tridimensionais que compõem o MuseuFlorestan Fernandes e outros que se encontram no ArquivoDeslizante; fichas manuscritas de pesquisa citadas acima;correspondência, cartões postais e belíssimos cartões deNatal;documentospessoaisehonrariasrecebidasporFlorestan;planosdeaula;dossiês(conjuntodedocumentossobreummesmotema)entreoutros.
Paranós,relatarmosaspráticasadotadaspara tratamentoedisponibilizaçãodessefundodocumentalconstituíaumcapítuloaserconcluídononossodia‐a‐dia.Deixarregistradoepublicadodados tão simples,masaomesmo tempo tão importantesparapesquisadores,estudanteseinteressadosemgeralnavidaeobradeFlorestandeixam‐nos a impressãodeuma tarefa cumprida.Todooprocesso,desdeoconhecimentodavidadeFlorestanatéo estabelecimento das séries e sub‐séries, da codificação até o
263
acondicionamentodosdocumentosnosfortaleceu,fazendocomquenossentíssemossegurosemrelaçãoàspráticasadotadas.Oque nos torna mais orgulhosos é concluir que o Plano deClassificaçãoestabelecidofuncionaequeosoriginaisestão,comcerteza,assegurados,conservados,preservadoseacessíveis.ReferênciasARQUIVONACIONAL.DicionárioBrasileirodeTerminologiaArquivística.RiodeJaneiro:ArquivoNacional,2005.p.97.(Publicaçõestécnicas,51).ARQUIVONACIONAL.NOBRADE:NormaBrasileiradeDescriçãoArquivística.RiodeJaneiro:ArquivoNacional,2006.124p.ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ENCADERNAÇÃO E RESTAURO.Conservaçãopreventivaembibliotecasearquivos.SãoPaulo:ABER,s.d.Apostila.ASSOCIAÇÃOBRASILEIRADEENCADERNAÇÃOERESTAURO.Cursodehigienizaçãodeacervos.SãoPaulo:ABER,2007.Apostila.ASSOCIAÇÃOBRASILEIRADEENCADERNAÇÃOERESTAURO.Cursodehigienização de livros com ênfase em acervomolhado.SãoCarlos:SIBI‐USP,2008.Anotações.BECK, I. (coord.) Caderno técnico: armazenagem e manuseio. Rio de Janeiro:ProjetoConservaçãoPreventivaemBibliotecaseArquivos:ArquivoNacional,1997.48p.il.BRITISHLIBRARYPreservaçãodedocumentos:métodos epráticasde salvaguarda.Trad.DeZenyDuartedeM.M.Santos.Salvador:EDUFBA,2000.CAMARGO, Ana Maria de Almeida, coord.; Bellotto, H.L. Dicionário determinologiaarquivística.SãoPaulo:ARQ/SecretariadeEstadodaCultura,1996.p.18.Conselho Internacional de Arquivos. ISAAR (CPF): norma internacional deregistrodeautoridadearquivísticaparaentidadescoletivas,pessoasefamílias.Vitor Manoel Marques da Fonseca (Trad.). 2 ed. Rio de Janeiro: ArquivoNacional,2004.99p.‐‐(PublicaçõesTécnicas;n.50)ISBN85‐7009‐071‐4.CÓSCIA, V.L. Um pouco das Coleções Especiais da Biblioteca ComunitáriaComunitáriadaUFSCar.VersãoBeta,SãoCarlos,v.8,nº53,p.77‐88,2009.CUNHA,MuriloBastosda;CAVALCANTI,CordéliaRobalinhodeOliveira.DicionáriodeBiblioteconomiaeArquivologia.Brasília:BriquetdeLemos,2008.p.177.
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FERNANDES, Florestan. Florestan Fernandes: leituras e legados. São Paulo:Global,2010.374p.LACOMBE,Michael.Umtesourodosaberaoalcancedetodos.KappaMagazine,SãoCarlos,nº4,p.30–31,Jul.2010.MENGARDO, Bárbara. Florestan Fernandes. Caros amigos: grandes cientistasbrasileiros,SãoPaulo,nº2,p.35–48,Nov.2009.SEREZA,H.C.Florestan:ainteligênciamilitante.SãoPaulo:Boitempo,2005.SILVAFILHO,J.T.Cursodepreservaçãoeidentificaçãodeacervos.RiodeJaneiro:UFRJ/SIBI,1994.Apostila.SPINELLIJÚNIOR,J.Aconservaçãodeacervosbibliográficos&documentais.RiodeJaneiro: Fundação BibliotecaNacional,Departamento de Processos Técnicos,1997.90p.UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS – Centro de Educação eCiências Humanas Curso de técnicas de higienização, conservação epreservaçãodefontesprimárias.SãoCarlos:UFSCar,1999.Anotaçõesdeaula.Sites:www.bco.ufscar/colesp
http://www.bco.ufscar.br/a‐bco/programas‐especiais/colecoes‐especiaisARQUIVONACIONAL.Nominação aoRegistroNacional doComitêNacional doBrasil do Programa Memória do Mundo da UNESCO, 2009: Fundo FlorestanFernandes,daBibliotecaComunitáriadaUniversidadeFederaldeSãoCarlos.Disponível em: <http://www.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=461&sid=91>.Acessoem:13jun.2011.
SOBREOSAUTORESAllanTadeuPugliese émestrandopeloprogramadepósgraduaçãoemCiência,TecnologiaeSociedadePelaUFSCar ‐PPGCTS/UFSCareMembro do Grupo de Estudos dos Gêneros do Discurso –GEGe/UFSCar–[emailprotected]ValdemirMiotelloéProfessorDoutordoprogramadepósgraduaçãoemCiência,TecnologiaeSociedadePelaUFSCar ‐PPGCTS/UFSCareLíderdoGrupodeEstudosdosGênerosdoDiscurso–GEGe/UFSCar‐[emailprotected]CláudiaDanieledeSouzaéGraduadaemBiblioteconomiaeCiênciada Informação (BCI)naUniversidadeFederaldeSãoCarlos (UFSCar)em 2010. Mestranda no Programa de Pós Graduação em Ciência,TecnologiaeSociedade(PPGCTS).BolsistadaFundaçãodeAmparoáPesquisa(FAPESP).Processon.2010/13128‐7.[emailprotected]Leandro InnocentiniLopesde Faria éEngenheirodeMateriaispelaUFSCar(1994),MestreemEngenhariadeMateriaispelaUFSCar(1997),Doutor em Ciência e Engenharia deMateriais pela UFSCar/PPCEM(2001)edoutoremSciencesdeLʹinformationEtCommunicationpelaUNIVERSITEDʹAIX‐MARSEILLEIII,França(2001)[emailprotected]DeniseRodriguesVichiattoBacharelemEngenhariadeProduçãopelasFaculdades IntegradasdeSãoCarlos–FADISC–MestrandaemCiência,TecnologiaeSociedadepela Universidade Federal de São Carlos. Contato:[emailprotected]RobertoFerrariJuniorBacharel e mestre em ciência da computação (UFSCar 1988, 1992),doutor em física computacional (USP, 1996). Professor e chefe do
Departamento de Computação na UFSCar. Linha de pesquisa:empreendedorismotecnológicoGabrielaG.Mezzacappa;MestrandadoProgramadePós‐Graduação emCiência,Tecnologia eSociedade–UFSCar.[emailprotected].FormadaempsicologiapelaUniversidadeFederaldeSãoCarlos,possuiquatroanosdeexperiênciacom o coletivo de consumidores ConsumoSol.Atuou também comocoordenadora executiva de projeto da Incubadora Regional deCooperativas Populares da UFSCar (INCOOP/UFSCar). Desenvolveprojeto demestrado na área de tecnologia social e educação para oconsumoético,solidárioeresponsável,comênfasenopúblicoinfantil.MariaZaninProfessora doutora do Programa de Pós‐Graduação em Ciência,TecnologiaeSociedade–UFSCar;coordenadoradaINCOOP/UFSCar.GustavoGrandiniBastosMestrandodoProgramadePós‐Graduação emCiência,Tecnologia eSociedade pela Universidade Federal de São Carlos. Bacharel emBiblioteconomia,CiênciasdaInformaçãoedaDocumentação.IntegraoLaboratório Discursivo E‐l@dis – FAPESP 2010‐510290. E‐mail:[emailprotected]LucíliaMariaSousaRomãoLivre‐docenteemCiênciadaInformação,ProfessoradaGraduaçãoemCiências da Informação da Documentação e do Programa da Pós‐GraduaçãoemPsicologia,ambosdaFaculdadedeFilosofia,CiênciaseLetras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Professoracolaboradora do Programa de Mestrado em Ciência, Tecnologia eSociedadedaUniversidadeFederaldeSãoCarlos.Bolsista2doCNPq.CoordenadoradoGrupodePesquisaDiscursoememória:movimentosdosujeito(CNPQ)edoE‐L@DIS,LaboratórioDiscursivo‐sujeito,redeeletrônica e sentidos em movimentos (FAPESP). E‐mail:[emailprotected]
HeltonLuizGonçalvesDamas.Mestrando em Ciência, Tecnologia e Sociedade pela UniversidadeFederal de São Carlos. Bacharel em Turismo pela UniversidadeEstadualPaulista–CampusdeRosana.MariaTeresaMiceliKerbauyProfessora Doutora em Ciências Sociais. Pesquisadora do CNPq.ColaboradoradoProgramadePós‐graduaçãoemCiência,TecnologiaeSociedadedaUniversidadeFederaldeSãoCarlos.LíviaCoelhodeMelloPossui graduação em Biblioteconomia eCiência da Informação pelaUniversidade Federal de São Carlos (2010). Atualmente é aluna doprograma de pós‐graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade(PPGCTS), do Departamento de Ciência da Informação (DCI) daUniversidadeFederaldeSãoCarlos.E‐mail:[emailprotected]CamilaCarneiroDiasRigolinProfessorAdjunto doDepartamento deCiência da Informação e doPrograma de Pós‐Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade(PPGCTS)daUniversidadeFederaldeSãoCarlos(UFSCAR).DoutoraemPolíticaCientíficaeTecnológica(UNICAMP,2009),comestágiodedoutorado‐sanduíche no Departamento de Antropologia, IndianaUniversity,EUA (2007‐2008).MestreemAdministração (UFBA,2000),BacharelemAdministração(UFBA,1997).E‐mail:[emailprotected]LuizHenriqueChenchimestrandopeloProgramadePós‐graduaçãoemCiência,TecnologiaeSociedade(PPGCTS)daUniversidadeFederaldeSãoCarlos‐UFSCar(2011); especialista emFarmáciaClínica eAtençãoFarmacêuticapeloCentro Universitário de Rio Preto – UNIRP (2009); graduado emFarmácia‐bioquímica (2006) pela mesma instituição; também possuigraduaçãoemCiênciasbiológicas (bacharelado ‐2005 e licenciatura ‐2003)pelaUniversidadeEstadualPaulista (UNESP–São JosédoRio
Preto/SP). É farmacêutico da Divisão de Assistência Farmacêutica(DAF) do município de São Carlos/SP, prestando assistênciafarmacêutica na regional de saúde Santa Felícia. E‐mail:[emailprotected]MariaLúciaTeixeiraMachadograduada em Nutrição pelo INJC‐UFRJ e especialista o em SaúdePública,emníveldeResidênciapelaENSP‐FIOCRUZeemEducaçãona Área da Saúde pelo NUTES‐UFRJ. Possui Mestrado emFundamentosdaEducaçãopeloPPGE‐UFSCareDoutoradoemSaúdeColetiva pela FCM‐UNICAMP. É professora do Departamento deEnfermagem da Universidade Federal de São Carlos, atuando emadministração,ensino,pesquisaeextensãoprincipalmentenaáreadeSaúde Coletiva. Integra o corpo docente dos Programas de Pós‐Graduação ‐ Mestrado em Ciência, Tecnologia e Sociedade e doMestrado Profissional em Gestão da Clínica. E‐mail:[emailprotected]MarcoDonizetePaulinodaSilvaNascidoem13deabrilde1965,nacidadedeAraraquara,sétimofilhode uma família simples. Devotou sua juventude e parte de suamaturidadeàrepresentaçãocênica,atuandoemteatro,cinemaevídeo.As funções exercidas no meio teatral foram de ator, diretor edramaturgo. Formou‐se Bacharel em Biblioteconomia e Ciência daInformaçãopelaUniversidadeFederaldeSãoCarlos,em2011.Cursa,atualmente,mestrado emCiência,Tecnologia e Sociedade namesmauniversidade.MarthaReginaBortolatoCardosoTecnólogaemLogísticaeTransportespelaFaculdadedeTecnologiadeJahu–FATEC‐JAHU,MestrandadoProgramadePós‐Graduação emCiência,Tecnologia e Sociedade –PPGCTS,Universidade FederaldeSãoCarlos–UFSCar.Contato:<[emailprotected]>
WandaAparecidaMachadoHoffmannDiretora doCentro de Educação eCiênciasHumanas, professora daUniversidadeFederaldeSãoCarlos–UFSCar,professoradoprogramade Pós‐Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade –PPGCTS/UFSCar,Pós‐DoutoradoemProspecçãoeMonitoramentodeInformação Tecnológica pela UFSCar/FAPESP, Pós‐Doutorado emTrabalhabilidadeaQuentepelaUFSCar/CNPq,DoutoraemCiênciaeEngenharia dos Materiais pela UFSCar/PPGCEM, Mestre emEngenharia dos Materiais pela UFSCar/PPGCEM, EngenheiraMetalúrgica pela UFOP/Escola de Minas. Contato:<[emailprotected]>RaquelJulianaPradoLeitedeSousaPossui graduação emComunicação Social – Jornalismo pelaUNESP,Biblioteconomia eCiênciada InformaçãopelaUFSCar eLicenciaturaemLínguaPortuguesapelaFIMI, tendoatuadonasáreasderedação,reportagem,ensinodeLínguaPortugesaenormalizaçãodocumentária.Aluna do Programa de Pós‐graduação em Ciência, Tecnologia eSociedadedaUFSCar.BolsistaCAPES/Reuni.[emailprotected]RicardoBiscalchinMestrando em Ciência Tecnologia e Sociedade pela UniversidadeFederal de São Carlos – UFSCar, campus de São Carlos. BolsistaCAPES/REUNI.BacharelemBiblioteconomiaeCiênciadaInformaçãopela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar, campus de SãoCarlos.E‐mail:[emailprotected]VeraReginaCasariBoccatoDoutora em Ciência da Informação pela Universidade EstadualPaulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP, campus de Marília.Docente do Departamento de Ciência da Informação no curso deBiblioteconomia e Ciência da Informação e na Pós‐graduação emCiência, Tecnologia e Sociedade do Centro de Educação e CiênciasHumanas,daUniversidadeFederaldeSãoCarlos(UFSCar).TutoradoGrupoPETBiblioteconomiaeCiênciadaInformaçãodaUFSCar.Líder
do Grupo de Pesquisa “Organização do Conhecimento paraDisseminação da Informação” e Membro dos Grupos de Pesquisa“Informação, Conhecimento e Tecnologia” e Análise Documentária,cadastrados junto aoDiretório dosGrupos de Pesquisa no Brasil doCNPq. Atualmente desenvolve pesquisa financiada pelo CNPqintitulada “Bases científicas e metodologias inovadoras para ainteroperabilidade entre linguagensdocumentárias:umapropostadeinvestigaçãoparaaplicação”.E‐mail:[emailprotected]VeraLuciaCósciaBibliotecária‐documentalista das Coleções Especiais da BibliotecaComunitária da UFSCar. Especialista em Organização de Arquivospelo IEB‐USP. Coordenadora para tratamento e disponibilização doFundo Florestan Fernandes. Mestranda do Programa de Pós‐Graduação emCiênciaTecnologia eSociedadedaUFSCar –Linha 2,soborientaçãodaProfª.Drª.LuziaSigoliFernandesCosta.LuziaSigoliFernandesCostaprofessoradoProgramadePós‐GraduaçãoemCiência,TecnologiaeSociedade da UFSCar. Possui graduação em Biblioteconomia pelaEscola de Biblioteconomia e Documentação de São Carlos (1979),mestrado em Programa de Pós‐Graduação Engenharia de ProduçãopelaUniversidadeFederaldeSãoCarlos(2001)edoutoradoemCiênciada InformaçãopelaUniversidadeEstadualPaulista JúliodeMesquitaFilho(2008). TemexperiêncianaáreadeCiênciada Informação,comênfase em Teoria da Informação. Principais áreas de interesse:‐Patrimônio,sociedadeesustentabilidade.